Prevenção Geral E Especial Direito Penal? - [Solução] 2024: CLT Livre

Prevenção Geral E Especial Direito Penal?

Prevenção Geral E Especial Direito Penal

O que é prevenção geral e prevenção especial?

12 de Novembro de 1997 A pena como resposta ao delito. Algumas considerações a respeito do tema 1 -A FUNÇÃO DO DIREITO PENALl O Direito Penal aparece como um dos meios de controle social existentes. Trata-se de um controle formalizado, destinado a evitar comportamentos que atinjam os bens jurídicos considerados mais importantes para a sociedade.

  1. Atuando em ultima ratio, o Direito Penal vale-se da imposição de sanções em caso de ocorrência de condutas que venham a lesionar ou colocar em perigo esses bens jurídicos mais relevantes.
  2. Assim, obedece esse ramo do Direito a um princípio de mínima intervenção, surgindo somente quanto todos os outros meios de controle social se mostrem insuficientes.

Por sua vez, a pena exsurge como uma das sanções previstas no ordenamento jurídico de um Estado Social e Democrático de Direito, consubstanciada em uma cobertura normativa destinada a, em termos gerais, combater o fenômeno denominado “crime”. A pena é uma medida que pode ser utilizada de distintas formas, dependendo da vontade do próprio Estado, que é quem detém a exclusividade de sua aplicação.

A respeito da função da pena existem diferentes teorias: 1. a) Teorias absolutas ou retributivas Esta primeira teoria se prende à idéia de pena como função de realização de justiça. Segundo esse entendimento, a pena há de ser aplicada como resposta pela prática de um delito, ainda que resulte desnecessária para o bem da sociedade.

Tenta-se, através desta teoria, justificar a função retributiva exigida pela Justiça, levando em conta que o crime não pode ficar sem castigo. Segundo Kant(1), o homem é um “fim em si mesmo”, não sendo lícito instrumentalizá-lo em benefício da sociedade.

  1. Portanto, não seria eticamente admissível basear o castigo estatal do delinqüente em razões de utilidade social.
  2. Desse modo, a pena deve ser justificada através da idéia de que o criminoso a merece, segundo as exigências de justiça, aparecendo a lei penal como verdadeiro “imperativo categórico”, isto é, uma exigência incondicionada de Justiça.

Não há que se levar em conta qualquer caráter utilitário de proteção social. O castigo há de ser aplicado ainda que não tenha utilidade social. O pensamento kantiano encontra-se bem definido através de um exemplo por ele próprio apresentado: uma ilha cuja população decidisse dissolver-se e dispersar-se pelo mundo, e surgisse a questão de que se haveria que se manter o castigo pendente dos delinqüentes.

A resposta é afirmativa, mesmo que a pena resultasse inútil para dita sociedade. É que assim todos compreenderiam o valor de seus atos. Existe ainda uma teoria retributiva mais adequada ao sistema jurídico moderno, tratando-se de um fundamento proposto por Hegel, segundo o qual a pena se justifica pela necessidade de restabelecer a vigência da “vontade geral” representada pela ordem jurídica, que resulta negada pela “vontade especial” do criminoso.

Assim, se a “vontade geral” é negada pela “vontade especial” do delinqüente, se deverá negar essa negação por meio da aplicação da pena. Então, surgirá a afirmação da “vontade geral”. A teoria de Hegel(2) se corporifica da se–guinte forma: a vontade geral é a tese, a negação dessa vontade será a antítese, e a negação dessa negação será a síntese, que se apresentará em forma de punição pela prática de um crime.

Portanto, tal teoria concebe a pena como função de realização de justiça, ainda que seja uma exigência incondicionada de justiça. Importa ainda registrar o fundamento retributivo da pena proposto por Binding(3), segundo o qual a pena deve mostrar ao delinqüente sua impotência diante da lei penal e sua submissão ao “comando geral do Estado”.

Assim, o criminoso tem que atentar para a força do ordenamento normativo penal, que protege através da pena os bens jurídicos de especial importância para a sociedade. As teorias retributivas apresentam ainda como fundamento que a pena guarde proporcionalidade com a gravidade do delito, considerada esta como um limite a ser respeitado pela função punitiva.

Sem dúvida, tal aspecto é positivo, por entender-se impossível castigar mais além da gravidade do delito cometido, restringindo-se eventuais excessos derivados dos fundamentos preventivos da pena. A culpabilidade do delinqüente é assim corretamente entendida como um limite da pena.1. b) Teorias relativas ou de prevenção As teorias preventivas recebem o nome de “teorias relativas”.

Isto se deve a que, enquanto o fundamento retributivo guarda relação com a realização de justiça, que é absoluta, as necessidades de prevenção são relativas e circunstanciais. A idéia de prevenção apresenta duas correntes, uma bem distinta da outra: a “prevenção geral” concebe a pena como forma para evitar que surjam delinqüentes no seio da sociedade.

  • É uma forma de intimidação geral, evitando que as pessoas cometam delitos, pois assim atuando serão submetidas a uma sanção aplicada pelo órgão estatal competente.
  • A prevenção geral tem como fim a tarefa de se criar e manter nos cidadãos, por meio da aplicação da pena, uma atitude obrigatória de respeito pelo Direito.

Trata-se de uma função utilitária, pela qual a pena não é considerada somente como castigo frente a um mal cometido, mas sim como um instrumento dirigido a prevenir delitos futuros. Existe um modelo híbrido em que se fundam as finalidades da prevenção geral: a primeira finalidade é a chamada “prevenção geral positiva”, pela qual se atribui à pena uma função de integração social derivada de um reforço de fidelidade ao Estado, assim como de uma promoção de conformismo por parte dos cidadãos frente ao ordenamento jurídico.

  1. Por conseqüência, concebe-se o Direito Penal como uma afirmação das convicções jurídicas fundamentais, como uma consciência social das normas e como uma atitude de respeito pelo Direito.
  2. Já a “prevenção geral negativa” tem como principal característica a idéia de intimidação, através da qual o Estado exercita uma coação psicológica frente aos cidadãos, por meio das normas penais, que acabam representando uma verdadeira ameaça legal.

De outra parte, a “prevenção especial” tem por finalidade prevenir a ocorrência de delitos que possam ser cometidos por uma pessoa determinada. O objetivo da pena é que a pessoa que seja a ela submetida não volte a delinqüir. À diferença da prevenção geral, que se opera no momento da cominação legal, a prevenção especial surge no momento da execução da pena e tem como ideal a ressocialização do criminoso.

A prevenção especial não se preocupa muito com os fatos, mas sim com seus autores. Por esse entendimento, o Direito Penal não é somente útil para prevenir os delitos, mas também para ressocializar pessoas com desvios de caráter. Nesse sentido, a pena seria um tratamento, uma terapia utilizada de acordo com a política empregada no combate ao delito.

Presentes nesta teoria, de forma clara, os fins de reeducação, readaptação, ressocialização e reinserção dos delinqüentes. Não se pode negar que a prevenção especial atende à função de eliminar e neutralizar o poder de ação do delinqüente, ainda que o faça por determinado tempo.

Frente a isso, é possível, igualmente, subdividir a prevenção especial em dois grupos: a positiva, voltada para a reeducação (readaptação, ressocialização, reinserção) do criminoso, e a negativa, que compreende a eliminação ou neutralização do delinqüente, que não está preparado para a convivência social.

Assim é que os fundamentos contidos nas citadas teorias estabelecem uma idéia global da função da pena: • realização de Justiça (teoria retributiva, absoluta); • proteção da sociedade por meio da ameaça da pena (prevenção geral); • proteção da sociedade evitando a reincidência do delinqüente (prevenção especial).

Malgrado isso, persiste o conflito derivado dessas duas teorias, sem que se saiba qual é a mais adequada aos princípios norteadores do Direito. No Brasil, a função da pena vem sendo tratada de forma eclética, com a aceitação das duas teorias, sem que a questão seja seriamente enfrentada. A prevenção geral surge antes da prática do delito, enquanto a retribuição aparece no momento da aplicação da pena.

Assim, a prevenção especial surgiria ao ser iniciada a execução da pena, tornando patentes os princípios de reinserção e ressocialização do criminoso. Ao reverso, outros países delimitam claramente o início e o final da retribuição, passando-se o mesmo em relação à aplicação dos fins preventivos da pena.

Nesse sentido servem como exemplo os Estados Unidos, em que alguns Estados ainda adotam a pena capital, medida esta que, a par de seu caráter abjeto, denota a mais pura consagração dos princípios retributivos. Não obstante, esse mesmo país contém em seu ordenamento jurídico instrumentos de prevenção, como é o caso da probation.1.

c) Teorias ecléticas ou mistas Este grupo de teorias da pena tenta combinar os elementos legitimadores das teorias absolutas e das teorias relativas em uma só idéia, de caráter unificador, pretendendo alcançar uma síntese dos diversos fundamentos do castigo penal.

  1. Dentro desta idéia, Roxin(4) entende que se deve atribuir à pena diversas funções, segundo o momento de que se trate: o momento da cominação legal, o momento da determinação judicial e o momento da execução da pena.
  2. É esta a chamada “teoria dialética da união”.
  3. No momento da cominação legal (fase de individualização legislativa), a pena deve ter a função de proteger bens jurídicos, aparecendo assim a idéia de prevenção geral intimidatória.

O legislador, ao estabelecer a pena abstrata, não pode considerar circunstâncias relativas ao concreto autor dos futuros delitos. O segundo momento é o da determinação judicial da pena (fase de individualização judicial), baseada na prevenção geral, onde o juiz, ao impor a pena, reafirma a ameaça legal acima mencionada.

  1. Por fim, no momento da execução da pena (fase de execução da pena), deve ser levado em conta o fim ressocializador do infrator, de acordo com os fundamentos da teoria de prevenção especial.
  2. Para as teorias ecléticas ou mistas, a legítima pena deveria ser justa e útil, ao mesmo tempo.
  3. Sob essa ótica, a pena traduz uma retribuição frente à culpabilidade do criminoso (pena justa ou proporcional) mas, ao mesmo tempo, serve à prevenção do delito (pena útil).2 – A PENA FRENTE AO PROBLEMA DA CRIMINALIDADE A criminalidade é, por sua gravidade, um dos principais problemas do mundo contemporâneo, afligindo enormemente as populações dos países em geral, pobres e ricos, de primeiro e de terceiro mundo.

É certo que a criminalidade guarda íntima relação com as demais chagas sociais, como a miséria, o desemprego, o fanatismo ideológico, a falta de estrutura familiar, a falta de perspectivas para os jovens, etc. A questão que se levanta, pois, é se o Direito Penal cumpre de forma satisfatória a função de tutelar os bens jurídicos mais importantes e punir — obedecido o critério de proporcionalidade — aqueles que atentam contra esses bens.

O problema se refere à colocação do Direito Penal como forma de resposta à crescente criminalidade, a qual não pode ser totalmente eliminada, mas sim controlada e minorada. Em primeiro lugar, devemos reconhecer que o Direito Penal persiste sendo o ramo do Direito que afeta diretamente as camadas mais pobres da população.

Os pequenos delitos patrimoniais são, em grande medida, responsáveis por essa situação. Em nosso País persiste em pequena escala a persecução dos chamadas crimes de white collor, cujos autores costumam obter bons resultados frente à Justiça Penal. Isto ocorre por duas razões básicas: possui essa classe de criminosos condições de, em juízo, apresentar uma boa defesa técnica, além de desfrutarem de normas penais e processuais que acabam garantindo sua liberdade.

Frente a esse quadro, permanecem as carceragens abarrotadas de presos pobres, a maior parte sem possuir as mínimas condições de contratar um profissional para produzir uma defesa que possa ser considerada satisfatória, ou mesmo para acompanhar a fase de execução da pena. Por outro lado, é uma tendência do Direito Penal moderno a proteção de bens jurídicos que anteriormente ignorava, como ocorre em relação aos crimes contra o meio ambiente e o consumidor.

É certo que se trata de bens jurídicos importantes e que devem estar sob a tutela penal, não confrontando sua proteção, portanto, com o princípio da mínima intervenção. Apesar disso, a persecução nesse campo é ainda muito tímida, não pela falta de tipos penais a respeito, mas sim pela deficiência das estruturas policial e judicial, sendo estas quase que inteiramente consumidas pela altíssima incidência dos delitos patrimoniais, crimes contra a vida e liberdade sexual, bem como aqueles relacionados ao uso e tráfico de estupefacientes.

  • Outra questão que segue sob uma ótica equivocada é a que concebe o combate ao crime com medidas significativas de repressão e aumento substancial das penas.
  • Está claro que não se combate a criminalidade através de penas altas, que constituem apenas medidas de efeito moral de intimidação, de questionável eficácia.

Na verdade, combate-se o delito com a efetiva aplicação da lei penal e com a busca da diminuição da chamada “cifra negra” (sistema oculto, crimes que são cometidos e não apurados ou não castigados) existente no campo penal. Para tanto, vários fatores são importantes, devendo o Estado contar com um sistema policial eficiente, uma cobertura normativa adequada, bons operadores jurídicos e, ainda, valer-se de uma efetiva cooperação da comunidade.

  • Assim, pois, quanto melhor se manifeste o sistema criminal, menor será a cifra negra.
  • Apesar disso, não se pode esquecer que para o bom funcionamento do sistema a ordem social deve estar bem mantida, com as garantias básicas dos cidadãos sendo respeitadas, principalmente no que se refere aos direitos que cabe ao Estado propiciar (habitação, trabalho, educação, saúde).

Em alguns países, o problema criminal costuma ser tratado como questão essencialmente policial, isto é, o combate ao crime é diretamente relacionado com a efetiva ação dos órgãos policiais, que passam a ser os grandes responsáveis pela repressão e prevenção dos delitos.

Os Estados Unidos são o principal exemplo em relação à assertiva feita acima. Em sua maior cidade, Nova Iorque, a política criminal adotada reflete a idéia de combate ao crime que se desenvolve por todo o país. Ao baixar gradativamente os índices de criminalidade, Nova Iorque despertou a atenção de criminalistas de todo o planeta.

Nessa metrópole, caiu pela metade o número de homicídios nos últimos cinco anos. Da mesma forma, a incidência de outros delitos menos graves baixou de forma significativa. Por trás de animadoras estatísticas, aparece a ação de uma Polícia bem estruturada, presente nas ruas.

A política de “tolerância zero”, criada para combater os pequenos delitos, transmite à sociedade a impressão de que a cidade está bem vigiada. A idéia central dessa “política criminal” reside na crença de que a repressão a pequenos crimes acaba inibindo a prática de delitos graves. Importa registrar que essa visão otimista a respeito do problema da criminalidade não é absoluta, merecendo uma análise mais acurada.

É que existe, sem dúvida, uma distinta interpretação que se pode dar ao problema penal nos Estados Unidos. No transcurso das últimas décadas, os Estados Unidos realizaram uma experiência sem precedentes nem equivalentes nas sociedades ocidentais pós-guerra: a substituição progressiva de um Estado providência para um Estado penal e policial, no qual a discriminação das populações marginalizadas e a operatividade punitiva em direção às categorias desfavorecidas substituíram a verdadeira política criminal.

O crescimento do Estado penal nos Estados Unidos se produz segundo duas modalidades principais. A primeira consiste em transformar os serviços sociais em instrumentos de vigilância e controle das “classes sociais perigosas”. Isto se observa através de várias medidas tomadas nos últimos anos por diversos Estados americanos, que condicionam o direito a ajudas sociais à adoção de certas normas de comportamento (sexual, familiar, educativo, etc.) e ao cumprimento de obrigações burocráticas muitas vezes onerosas e humilhantes (trabalhos forçados e matrículas em cursos de formação moral de questionável validade).

O segundo componente dessa guerra contra o crime é o recurso massivo e sistemático do encarceramento. A duplicação da população reclusa em dez anos subestima gravemente o peso real da autoridade penal no novo mecanismo para o tratamento da miséria e de suas conseqüências.

O aumento explosivo da população reclusa, o recurso massivo às formas mais variadas de pré e pós encarceramento, a eliminação de programas de trabalho e educação no interior dos presídios, a multiplicação dos instrumentos de vigilância em todos os níveis, são sinais de que a nova doutrina penal americana não tem como objetivo reabilitar criminosos, mas sim reduzir custos e controlar as “classes perigosas”, que são mantidas marginalizadas, de modo a encobrir o abandono de que são objeto por parte dos serviços sociais.

Desta forma, o crescimento do Estado penal nos Estados Unidos não responde à criminalidade, que se mantém, apesar do sistema altamente repressivo. A nosso ver, o problema da criminalidade deve ser concebido sob uma eficiente política criminal, que cada Estado deve escolher, de acordo com suas características próprias.

  1. Os princípios preventivos seguem sendo, sem dúvida, o melhor antídoto para o crime.
  2. A simples retribuição passa a idéia de uma verdadeira vingança estatal, concepção que deve ser de todo evitada.
  3. Na Espanha, existe um dispositivo constitucional (art.25, 2) no sentido de que a pena deve estar dirigida à reeducação e reinserção social do condenado.

Trata-se de uma demonstração inequívoca do louvável princípio de prevenção especial. Em Portugal, o Código Penal (art.40) estabelece como finalidade da pena a proteção de bens jurídicos (prevenção geral) e a reintegração do agente na sociedade (prevenção especial).

Por fim, vale lembrar que o objetivo final de uma eficiente política criminal não é erradicar o crime, mas sim controlá-lo, na medida do possível. Para prevenir a ocorrência de crimes é necessário que se intervenha na etiologia do problema criminal, neutralizando suas causas. A idéia de prevenção deve ser concebida como uma conscientização social e comunitária, justamente porque o crime é um problema social e comunitário.

Trata-se de um compromisso solidário da comunidade e não somente do sistema legal e das autoridades penais. Notas (1) Sobre o pensamento de Kant, vide Mir Puig, Derecho Penal, Parte General, Barcelona, 4ª ed., 1996, p.56. (2) Roxin, a respeito de Hegel, Problemas Básicos de Direito Penal, Lisboa, 2ª ed., 1993, p.48.
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O que é teoria da prevenção geral?

Para essa teoria, a finalidade é de prevenir os delitos antes de que eles aconteçam. Nela, o Estado valer-se-ia do instituto penalizador para fazer a manutenção e reforço da confiança da sociedade na eficiência das normas penais.
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O que é a teoria da prevenção especial?

Teoria da Prevenção Especial Parecida com a teoria da prevenção geral por conta de sua relatividade, a teoria da prevenção especial foi desenvolvida no período histórico do iluminismo e tem como base fundamental individualizar a pena para cada caso concreto.

  1. Ela busca transformar o indivíduo criminoso em cidadão comum por intermédio do instituto da ressocialização do indivíduo.
  2. FORMAS DE ATUAÇÃO A teoria da prevenção especial atua tanto para assegurar a sociedade contra os indivíduos que cometam atos infracionais por intermédio da intimidação do agente e de quem o sabe punido, quanto para que este agente não venha a cometer futuros delitos, pois a pena teria caráter educativo.

O Estado busca corrigir o indivíduo para que ele pare de cometer delitos. → Programa de Marburg (1882) trazia as ideias de que a função da pena seria, precipuamente, neutralizar o indivíduo para que ele não cometa mais crimes e corrigir aqueles que já recaíram na reincidência.

Ausência de critérios objetivos ou subjetivos para aplicar a dosimetria da pena. Critério sem discricionariedade para que o Estado exerça seu ius puniendi, possibilitando aplicação de penas muito severas com prazos indeterminados, desproporcionais. Immanuel Kant e Georg Wilhelm Friedrich Hegel questionavam a justificativa da teoria. Questionava-se qual era a ratio legis utilizada pelo Estado para que, valendo-se dela, aplicasse o instituto da ressocialização. Sob pena de ferir categoricamente o princípio da dignidade da pessoa humana, o Estado impunha ao indivíduo a sua ressocialização (e o fazia da forma como melhor considerasse, sem verdadeiros testes de efetividade), não deixando que ele efetuasse a escolha de sua trajetória. E o que fazer com os indivíduos que não necessitam de ressocialização? A exemplo do crime culposo, como efetuar a ressocialização de um indivíduo que não teve dolo de cometer o ato criminoso? A ideia de nothing Works, ou seja, de que a teoria da prevenção especial não é capaz de alcançar o objetivo da ressocialização.

Aulas : Teoria da Prevenção Especial
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O que é a prevenção especial positiva?

Teoria da Pena: Teoria relativa da pena –> Prevenção especial positiva – Finalmente, a prevenção especial positiva, dirigida ao agente que praticou o delito, expressa o caráter ressocializador da pena, a aplicação da pena possui o objetivo de que o infrator repense o ato delituoso por ele cometido e suas consequências, de modo que não torne a desrespeitar a lei penal.
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O que é a teoria da prevenção especial negativa?

CERTO Para a teoria relativa, a pena atua como um instrumento de prevenção, um meio para alcançar determinadas finalidades. De acordo com a prevenção geral negativa, a pena deve coagir psicologicamente a coletividade, intimidando-a. Na perspectiva da prevenção geral positiva, o objetivo da pena é demonstrar a vigência da lei (existência, validade e eficiência).

  1. A intenção, aqui, não é intimidar, mas estimular a confiança da coletividade na higidez e poder do Estado de execução do ordenamento jurídico.
  2. Já na ótica da prevenção especial, a pena é direcionada à pessoa do condenado.
  3. Sob o enfoque da prevenção especial negativa, a pena deve servir para inibir a reincidência, não se confundindo com a prevenção especial positiva, onde a preocupação é a ressocialização do delinquente.

Somente a recuperação do condenado faz da pena um instituto legítimo. Ademais, a própria sociedade se beneficia desta espécie de prevenção, já que, ao retornar para o convívio, o indivíduo estará mais bem preparado para respeitar as regras impostas pelo Direito.
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Qual a finalidade da prevenção?

Resumo O estudo traz considerações gerais sobre os princípios da prevenção e da precaução. Trata de suas implicações específicas no direito à saúde, nas mais diversas vertentes. Aborda o princípio da precaução como mecanismo de gestão de riscos. Analisa como o tema vem sendo tratado pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Palavras-chave: Prevenção. Precaução. Princípio. Direito à saúde. Supremo Tribunal Federal. Abstract The article brings general considerations about the prevention principle and the precautionary principle. It deals with their specific implications in the right to health, in the most diverse aspects. It addresses the precautionary principle as a risk management mechanism. It analyzes how the subject has been treated by the jurisprudence of the Supreme Court. Keywords: Prevention. Precautionary principle. Right to health. Supreme Court. Introdução O ditado popular segundo o qual “é melhor prevenir do que remediar” é tão antigo como aceito pela sociedade e pela ciência. Os provérbios bíblicos, que estudiosos estimam poder remontar ao segundo milênio antes de Cristo, já diziam que “o ingênuo acredita em tudo o que se diz; o prudente vigia seus passos” (Pr: 14,15) e que “o sábio teme o mal e dele se aparta, mas o insensato que se eleva dá-se por seguro” (Pr: 14,16). A prudência, que, segundo Pitágoras, “é o olho de todas as virtudes”, caminha ao lado da cautela. Se, mesmo quando há a possibilidade de se remediar, sugere-se a prevenção, essa exortação torna-se imperativa quando não se pode desfazer o mal já ocorrido. Mais do que isso, uma conduta prudente impõe a cautela até mesmo em relação a atos cujas consequências prejudiciais ao indivíduo ou à sociedade são ainda incertas, apesar de possíveis. Muito além dos âmbitos religioso e filosófico, as noções de prudência e de cautela, bem como a preferência da prevenção sobre a reparação, também permeiam a ciência e o direito. Especificamente em relação ao direito à saúde, que é o objeto deste estudo, as facetas mais concretas dessas ideias são encontradas nos princípios da prevenção e da precaução, que serão adiante detalhados. Este texto é escrito em um momento em que todo o planeta é assolado por uma pandemia (a da Covid-19) que já dizimou, somente com base em dados oficiais, quase um milhão de vidas em uma velocidade impressionante. Buscando o combate à doença, a ciência opera apressadamente e em meio a incertezas de diversas ordens, seja em relação ao conhecimento do vírus, seja às tecnologias adequadas para sua prevenção, redução ou eliminação. A pressa e as incertezas, quando aliadas, resultam nos riscos dos métodos científicos e sanitários empregados. Todo esse contexto traz novamente à tona os princípios da prevenção e da precaução, que já haviam ganhado espaço anteriormente, sobretudo na questão ambiental, inclusive ensejando novas reflexões sobre suas definições e seus limites. O estudo abordará justamente as noções de tais princípios sob a ótica específica do direito à saúde, seus âmbitos de incidência dentro das diversas áreas de atuação do Sistema Único de Saúde e da saúde suplementar e, por fim, a forma pela qual o Supremo Tribunal Federal os vem aplicando em casos paradigmáticos. Com isso, espera-se que a precaução e a prevenção passem, de fato, a ser enxergadas como princípios não apenas científicos, mas também jurídicos norteadores do direito sanitário, inclusive com a discussão sobre a necessidade de aprimoramento ou evolução de seus conceitos.1 Noções sobre os princípios da prevenção e da precaução 1.1 Considerações gerais Tanto as ciências naturais como as humanas consideram o dano como algo a ser prioritariamente evitado. Nas palavras de Ferrer e Álvarez, “o mais fundamental na vida moral e o que nos une de maneira mais rigorosa é a obrigação de evitar o mal”. Não sendo possível impedir a sua ocorrência, busca-se como segunda opção a sua reparação. A respeito da preferência do impedimento da ocorrência do dano sobre a sua reparação, a medicina e a bioética trabalham com o conhecido princípio do primum non nocere (não maleficência), pelo qual se evita, antes de qualquer coisa, causar o mal ao paciente. O direito, por sua feita, permite a tutela jurisdicional inibitória para impedir a prática de ato ilícito independentemente da ocorrência do dano (art.497, parágrafo único, do Código de Processo Civil). Com efeito, a primazia da prevenção sobre a reparação do dano justifica-se, em primeiro lugar, pelos inevitáveis prejuízos ou malefícios que ocorrerão no período que permeia a sua ocorrência e a própria reparação. Além do mais, há diversas situações em que é impossível a plena restauração do status quo, como se observa em relação aos danos ambientais ou àqueles que sacrificam a vida ou a integridade física de uma pessoa de maneira irreversível. Em casos tais, o amparo do Estado sobre esses bens jurídicos, que, além de inerentes à dignidade humana, são de restauração dificílima ou impossível após a sua violação, deve se dar antecipadamente, ou seja, de maneira que evite a própria violação. Reportando-se à jurisprudência da Corte Constitucional alemã, Mendes assevera que o dever de adoção, pelo Estado, de medidas de proteção dos cidadãos ou prevenção em relação ao desenvolvimento técnico ou tecnológico está ligado ao “dever de evitar riscos”, que é uma decorrência do princípio da proibição de proteção insuficiente dos direitos fundamentais, sobretudo os sociais. Sucede que a sociedade moderna evolui de maneira acentuadamente rápida e um tanto desorganizada. Essa evolução vem acompanhada de sensíveis alterações climáticas, ambientais e de saúde pública. Por outro lado, o progresso tecnológico traz consigo não apenas inúmeros benefícios, mas também muitas incertezas científicas, dúvidas em relação às consequências geradas na saúde humana e no meio ambiente e, consequentemente, riscos individuais e sociais. Nesse sentido, observou Beck que: Na modernidade tardia, a produção social de riqueza é acompanhada sistematicamente pela produção social de riscos. Consequentemente, aos problemas e aos conflitos distributivos da sociedade da escassez sobrepõem-se os problemas e os conflitos surgidos a partir da produção, da definição e da distribuição de riscos científico-tecnologicamente produzidos. Os riscos trazidos pelo desenvolvimento tecnológico e pela acelerada integração entre os povos disseminam-se de forma invisível, abstrata, e adquirem proporções muitas vezes indetermináveis. Comparando os riscos de antigamente com aqueles hoje presentes na sociedade moderna, Beck assim os distingue: É de se notar, porém, que as ameaças de então, à diferença das atuais, agastavam somente o nariz ou os olhos, sendo, portanto, sensorialmente perceptíveis, enquanto os riscos civilizatórios atuais tipicamente escapam à percepção, fincando pé sobretudo na esfera das fórmulas físico-químicas (por exemplo, toxinas nos alimentos ou a ameaça nuclear). Uma outra diferença está relacionada a esses casos. Naquela época, elas poderiam ser atribuídas a uma subprovisão de tecnologia higiênica. Hoje, elas têm sua causa numa superprodução industrial. Prossegue o autor afirmando que os riscos e as ameaças “são um produto de série do maquinário industrial do progresso, sendo sistematicamente agravados com seu desenvolvimento ulterior”. A maior exposição aos riscos e o fato de eles muitas vezes serem imperceptíveis sensorialmente impõem como contrapartida a necessidade de uma maior atuação do Estado na prevenção contra os próprios riscos e os danos por eles causados. Em outras palavras, os riscos tecnológicos ou científicos devem ser anulados ou no mínimo mitigados mediante uma segurança social proporcionada pelos desenvolvedores de tecnologia e pelo poder público. Mais uma vez nos valendo dos ensinamentos de Beck, “a promessa de segurança avança com os riscos e precisa ser, diante de uma esfera pública alerta e crítica, continuamente reforçada por meio de intervenções cosméticas ou efetivas no desenvolvimento técnico-econômico”. É nesse cenário que vêm à tona os deveres de prevenção e precaução, que, ao ingressarem no ordenamento jurídico, ganham força de verdadeiros princípios que servem como mecanismos para contrabalançar e afastar, na medida do possível e do desejável, os riscos inerentes ao desenvolvimento de tecnologias e os gravames deles decorrentes à saúde pública. Partindo do pressuposto de que o progresso tecnológico é indissociável da evolução da sociedade, a prevenção dos danos dele resultantes e a precaução contra as incertezas dos riscos gerados objetivam assegurar que o aprimoramento das tecnologias existentes e o surgimento de novas revertam apenas para o bem da sociedade, sem lesar a saúde dos indivíduos que a compõem.1.2 O princípio da prevenção no direito à saúde Na ótica do direito sanitário, o princípio da prevenção é aquele segundo o qual se deve buscar com absoluta prioridade evitar um mal à saúde já identificado e passível de ser afastado. O desenvolvimento científico através dos séculos possibilita a constante identificação de causas e efeitos entre agentes nocivos e das adversidades por eles geradas na saúde humana. O princípio da prevenção estabelece que, sendo conhecida a relação de causalidade entre o agente e o dano, este último deve ser sempre que possível evitado pelo afastamento da própria causa. Dallari e Ventura assim sistematizam as três formas de aplicação do referido princípio: (.) a primária, que se preocupa com a eliminação das causas e das condições de aparecimento das doenças, agindo sobre o ambiente (segurança nas estradas, saneamento básico, por exemplo) ou sobre o comportamento individual (exercício e dieta, por exemplo); a secundária ou prevenção específica, que busca impedir o aparecimento de doença determinada, por meio da vacinação, dos controles de saúde, da despistagem; e a terciária, que visa a limitar a prevalência de incapacidades crônicas ou de recidivas (Leavell e Clark, 1976). O conhecimento do dano e a certeza da relação de causalidade entre o agente desencadeador e o próprio dano são, portanto, fatores determinantes para a aplicação do princípio da prevenção. Dito princípio é previsto expressamente no texto constitucional. Com efeito, o art.196 da Constituição estabelece que o direito à saúde é garantido “mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”, disposição essa reproduzida pelo art.2º, § 1º, da Lei nº 8.080/90. Reduzir o risco de doenças e outros agravos significa prevenir a sua ocorrência. Já a proteção da saúde é uma etapa anterior à sua recuperação, sendo ambas abrangidas pelo dispositivo legal em comento. A proteção implica justamente evitar a doença. De maneira ainda mais expressa, o art.198, II, da Constituição elenca como uma das diretrizes do SUS o “atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais”. Especificamente em relação à saúde do trabalhador, o art.7º, XXII, da Carta Magna impõe o dever de “redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança”. Já no âmbito privado, a alusão à prevenção encontra-se no art.35-F da Lei nº 9.656/96, pelo qual o atendimento prestado pelos planos e pelos seguros privados de assistência à saúde “compreende todas as ações necessárias à prevenção da doença e à recuperação, manutenção e reabilitação da saúde (.)”. O princípio da prevenção norteia diversas vertentes das ações e dos serviços públicos em saúde, o que bem demonstra a sua força como diretriz de todo o direito sanitário. A vigilância sanitária e epidemiológica, que é certamente uma das principais atribuições do Sistema Único de Saúde (art.200, II, da Constituição), emerge como a faceta mais visível e concreta do princípio da prevenção, que constitui a sua própria essência. De fato, o art.6º, § 1º, da Lei nº 8.080/90 define a vigilância sanitária como “um conjunto de ações capaz de eliminar, diminuir ou prevenir riscos à saúde e de intervir nos problemas sanitários decorrentes do meio ambiente, da produção e circulação de bens e da prestação de serviços de interesse da saúde”. A vigilância epidemiológica, por sua feita, é conceituada pelo parágrafo segundo do mesmo dispositivo legal como: (.) um conjunto de ações que proporcionam o conhecimento, a detecção ou prevenção de qualquer mudança nos fatores determinantes e condicionantes de saúde individual ou coletiva, com a finalidade de recomendar e adotar as medidas de prevenção e controle das doenças ou agravos, As ações de vigilância sanitária e epidemiológica, que se pautam sempre pela prevenção de doenças e agravos à saúde, são das mais diversas, compreendendo desde normas de higiene básica da população até a fiscalização de alimentos, medicamentos e outros produtos – em todas as etapas de produção e comercialização – que se relacionem direta ou indiretamente à saúde, de estabelecimentos de saúde, etc. Tamanha é a amplitude dessas ações que elas acabam por envolver inclusive questões socioeconômicas atinentes às condições efetivas da população de manter hábitos adequados de higiene, alimentação e cuidados em geral com o próprio corpo. Os programas de vacinação também aparecem como política concreta de aplicação do princípio da prevenção no direito sanitário, evitando a propagação de doenças infectocontagiosas que colocam em risco a saúde de toda uma população. A pandemia da Covid-19, que se alastrou por todo o planeta a partir do início do ano de 2020, atingindo severamente o Brasil, demonstrou com grande clareza a relevância do princípio da prevenção para a manutenção da saúde individual e coletiva. No momento em que este texto é escrito, somente com base nos dados oficiais, quase dezoito milhões de pessoas já foram contaminadas e praticamente setecentas mil perderam suas vidas em todo o planeta. Como não há atualmente vacina disponível ou cura medicamentosa para o vírus, a prevenção contra a sua propagação é o único mecanismo que pode salvar a vida e a integridade física da população brasileira e mundial. Por isso é que a Lei nº 13.979/2020, em seu art.3º, autorizou a Administração a adotar uma série de medidas preventivas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do novo coronavírus, dentre elas: a) isolamento; b) quarentena; c) determinação de realização compulsória de exames médicos, testes laboratoriais, coleta de amostras clínicas, vacinação e outras medidas profiláticas e tratamentos médicos específicos; d) uso obrigatório de máscaras de proteção individual; e) restrição excepcional e temporária, por rodovias, portos ou aeroportos, de entrada e saída do país e de locomoção interestadual e intermunicipal. A prevenção é a regra a ser seguida também nos programas de saúde do trabalhador, que devem priorizar medidas que evitem acidentes de trabalho e a ocorrência de doenças ocupacionais, nos termos do art.6º, § 3º, da Lei nº 8.080/90, in verbis : Art.6º (.) (.) § 3º Entende-se por saúde do trabalhador, para fins desta lei, um conjunto de atividades que se destina, através das ações de vigilância epidemiológica e vigilância sanitária, à promoção e proteção da saúde dos trabalhadores, assim como visa à recuperação e reabilitação da saúde dos trabalhadores submetidos aos riscos e agravos advindos das condições de trabalho, abrangendo: (.) II – participação, no âmbito de competência do Sistema Único de Saúde (SUS), em estudos, pesquisas, avaliação e controle dos riscos e agravos potenciais à saúde existentes no processo de trabalho ; III – participação, no âmbito de competência do Sistema Único de Saúde (SUS), da normatização, fiscalização e controle das condições de produção, extração, armazenamento, transporte, distribuição e manuseio de substâncias, de produtos, de máquinas e de equipamentos que apresentam riscos à saúde do trabalhador ; (.) V – informação ao trabalhador e à sua respectiva entidade sindical e às empresas sobre os riscos de acidentes de trabalho, doença profissional e do trabalho, bem como os resultados de fiscalizações, avaliações ambientais e exames de saúde, de admissão, periódicos e de demissão, respeitados os preceitos da ética profissional; (.) VIII – a garantia ao sindicato dos trabalhadores de requerer ao órgão competente a interdição de máquina, de setor de serviço ou de todo o ambiente de trabalho, quando houver exposição a risco iminente para a vida ou saúde dos trabalhadores, (destacamos) A saúde do consumidor também é tutelada pelo princípio da prevenção. Além de outras disposições referentes ao tema, o art.6º, I, da Lei nº 8.078/90 prevê o direito básico de proteção da vida e da saúde contra os riscos causados por produtos ou serviços nocivos ou perigosos. O art.8º da mesma lei dispõe que “os produtos e serviços colocados no mercado de consumo não acarretarão riscos à saúde ou segurança dos consumidores, exceto os considerados normais e previsíveis em decorrência de sua natureza e fruição”. Em complemento, o art.10 estabelece que “o fornecedor não poderá colocar no mercado de consumo produto ou serviço que sabe ou deveria saber apresentar alto grau de nocividade ou periculosidade à saúde ou à segurança”. Tamanha é a importância da prevenção na salvaguarda da vida e da saúde que a simples exposição delas a perigo direto e iminente constitui crime tipificado no art.132 do Código Penal. Como se pode perceber, o princípio da prevenção – ou seja, o propósito de impedir o advento de conhecidos malefícios à saúde humana a partir de causas certas – permeia todo o direito sanitário, tanto na instituição como na implementação de políticas públicas. A prevenção como meta impositiva ganha relevo especial na atenção básica à saúde da população, sobretudo em um país como o Brasil, que conta com diversas regiões ainda muito pobres, com várias outras em que a pobreza é somada a uma densidade populacional elevada, além das localidades distantes de centros urbanos e desassistidas dos profissionais e dos estabelecimentos de saúde necessários aos cuidados de seus habitantes. Tudo isso reforça a necessidade, por exemplo, de combate às endemias causadas por insetos e outros animais transmissores (dengue, zika, febre amarela, leptospirose, doença de chagas, etc.) mediante conscientização pública sobre hábitos de limpeza e higiene e adoção de medidas de saneamento básico; de promoção de campanhas de vacinação abrangentes e consistentes; de acompanhamento constante da população por programas de saúde da família; de eficiência em programas de acompanhamento pré-natal, além de outras medidas. Nesse cenário, uma aplicação plena do princípio da prevenção demanda muito mais do que medidas exclusivamente sanitárias. É preciso que elas estejam integradas a programas de ordem assistencial, educacional e econômica que permitam que a população seja adequadamente instruída sobre regras básicas de higiene, saúde e cidadania, bem como que tenha condições materiais para adotar as condutas necessárias aos métodos preventivos. Aqui, ganha especial relevo uma política de comunicação pública e institucional do Estado que priorize a orientação da população sobre normas de proteção à saúde e de segurança no trânsito, em vez dos dispêndios que muitas vezes se vê com propagandas de cunho promocional e pessoal dissonante dos interesses públicos.1.2.1 Eficácia jurídica do princípio da prevenção O princípio da prevenção no direito à saúde, como visto anteriormente, está expressamente previsto no art.196 e no art.198, II, ambos da Constituição, irradiando seus efeitos sobre as mais diversas áreas do direito sanitário. Ele rege não apenas os atos praticados pela Administração, mas também os de particulares. Com efeito, cabe aos cidadãos a adoção das medidas de resguardo necessárias à preservação da saúde pública, conforme as orientações e as determinações emanadas do poder público, especialmente pelo fato de que a falta de cuidado próprio muitas vezes repercute na saúde alheia e na coletiva. Tomem-se como exemplos a permissão, em ambiente privado, de desenvolvimento de criadouros de insetos transmissores de doenças que podem infectar a vizinhança ou o hábito de fumar em locais fechados de acesso ao público. Cite-se, ainda, o art.5º da Lei nº 13.979/2020, que impõe a todas as pessoas o dever de colaboração com as autoridades sanitárias mediante a comunicação imediata de possíveis contatos com agentes infecciosos da Covid-19 e de circulação em áreas consideradas como regiões de contaminação pelo vírus. A tutela da saúde pública por meio de medidas preventivas a serem empreendidas até mesmo por particulares foi alçada à esfera criminal, tamanha é a sua relevância. Com efeito, “infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa”, e “deixar o médico de denunciar à autoridade pública doença cuja notificação é compulsória” constituem infrações penais, nos termos dos artigos 268 e 269 do Código Penal, respectivamente. Caso mais polêmico sobre a vinculação de particulares ao princípio da prevenção é a possível obrigação de se submeterem à vacinação compulsória, sobretudo em situações em que a imunização objetiva, além de impedir o adoecimento da própria pessoa, obstar também a transmissão comunitária da doença, protegendo a saúde de toda a coletividade. Nessa hipótese, há que se ponderar a liberdade e a integridade física dos cidadãos com a tutela da saúde pública. A questão é complexa e extrapola o objeto deste estudo. Adotando-se a concepção de Larenz, para quem os princípios jurídicos consistem em uma ideia geral que ilumina o processo de concretização das normas jurídicas, mas agregando a eles a necessária força jurídica própria – já que, como sustentado por Ávila, “os princípios também possuem uma consequência normativa: a razão (fim, tarefa) à qual o princípio se refere deve ser julgada relevante diante do caso concreto” –, o princípio da prevenção não se resume às regras legais e constitucionais que tratam das medidas de afastamento de doenças ou outros agravos à saúde. Muito mais do que isso, ele deve direcionar toda a hermenêutica do direito sanitário. Assim, é com base no princípio da prevenção que se deve interpretar as leis e os atos administrativos relacionados à saúde, conferindo-lhes sentidos que vão ao encontro do objetivo profilático, afastando conclusões a ele contrárias e, sendo o caso, reconhecendo a inconstitucionalidade das normas que estejam em franca contradição com o postulado preventivo. A amplitude do princípio da prevenção na concretização do direito à saúde pode ser bem percebida quando se lhe atribui o sentido de que é dever do poder público assegurar aos cidadãos condições de vida saudáveis que efetivamente os previnam de ser atingidos por doenças e demais agravos evitáveis mediante condições básicas de alimentação, saúde, moradia, saneamento básico e educação. Não se trata de alargamento indevido do princípio em tela, uma vez que a própria Constituição Federal, ao estabelecer as diretrizes do SUS, arrola o “atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais” (art.198, II). Além disso, prevê, em seu art.200, dentre as diversas atribuições do sistema público de saúde, aquelas relacionadas às ações de saneamento básico (inciso IV), às de fiscalização e inspeção de alimentos e bebidas (inciso VI) e à proteção ao meio ambiente (inciso VIII). Essa amplitude do princípio decorre da concepção alargada do seu objeto de incidência, a saúde, assim definida pelo art.3º da Lei nº 8.080/90: Art.3º Os níveis de saúde expressam a organização social e econômica do País, tendo a saúde como determinantes e condicionantes, entre outros, a alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, o trabalho, a renda, a educação, a atividade física, o transporte, o lazer e o acesso aos bens e serviços essenciais. (Redação dada pela Lei nº 12.864, de 2013) O princípio da prevenção limita, de alguma maneira, o poder discricionário da Administração, impondo-lhe um dever de deferência a critérios e dados técnico-científicos. Uma vez estando objetivamente comprovada uma ameaça à saúde pública, seja qual for a sua causa, é dever (e não opção) do poder público inibi-la sempre que isso seja materialmente possível, tanto mediante a prática de ato administrativo específico como por meio de implementação de políticas públicas. Via de regra, a prevenção impõe um dever de ação ao administrador, que consiste justamente em impedir a ocorrência do fato causador de dano já conhecido. É possível cogitar, entretanto, de atos administrativos ou leis inconstitucionais por afronta ao princípio da prevenção. Um exemplo claro seria a definição de velocidade máxima para o tráfego de veículos automotores em vias públicas em limite que, segundo dados científicos seguros, aumentam de forma acentuada e desproporcional o risco de acidentes de trânsito. Suponha-se, para deixar a hipótese mais clara, que seja fixado um limite máximo de velocidade de 180 Km/h em uma estrada de pistas simples. Tal ato seria inconstitucional por afrontar o princípio da prevenção, já que incrementa o risco de mortes e lesões corporais decorrentes de acidentes automobilísticos. Mais à frente, serão analisados casos concretos em que o Supremo Tribunal Federal se valeu do princípio da prevenção para declarar a inconstitucionalidade de lei, de campanha publicitária do governo federal e de pretensão de importação de bens que causam prejuízos à saúde pública e ao meio ambiente, tudo a demonstrar a força normativa irradiante do princípio em questão. Por outro lado, o princípio da prevenção, justamente por essa qualidade que possui, deve ser, sempre que necessário, compatibilizado com outros princípios constitucionais quando em potencial conflito em casos concretos, conforme as lições de Dworkin amplamente aceitas pela doutrina e pela jurisprudência pátrias. Um exemplo atual é bastante elucidativo quanto ao ponto. O alastramento da pandemia da Covid-19 pelo Brasil e pelos demais países de todos os continentes do planeta impôs a adoção de graves medidas de isolamento social, quarentena e fechamento de estabelecimentos industriais, comerciais e de prestação de serviços não essenciais ( lockdown ). O objetivo é a prevenção de disseminação demasiadamente veloz do vírus que viesse a ceifar milhares de vidas que poderiam ser preservadas e a colapsar os sistemas público e privado de saúde diante da demanda insuportável de internações. Incidência do dever de prevenção, portanto. A manutenção do fechamento dos estabelecimentos industriais, comerciais e de prestação de serviços não essenciais por longo período, entretanto, causa consequências econômicas e sociais nefastas, como o aumento expressivo do desemprego e da falência de empresas (sobretudo as pequenas), a redução dos rendimentos dos trabalhadores, o consequente aumento da pobreza e da fome e a perda de arrecadação fiscal. Esse cenário trouxe acalorados debates a respeito da prevalência das medidas de isolamento social sobre a normalidade econômica ou desta sobre aquelas. Independentemente da conclusão a que se chegue, até mesmo os partidários das medidas de isolamento não costumam defendê-la como método perene a ser mantido de forma integral ou absoluta até que o vírus desapareça ou atinja uma incidência desprezível, como seria de se esperar pela adoção estrita e incondicional do princípio da prevenção. Com efeito, ainda que com baixa circulação, o potencial de nova disseminação descontrolada da Covid-19 permaneceria considerável com a reabertura das atividades empresariais e o relaxamento das medidas de restrição à circulação de pessoas. O que os defensores das medidas de distanciamento social pretendem, em sua grande maioria, é um paulatino retorno à normalidade conforme os riscos à saúde pública e à sustentabilidade dos sistemas de saúde diminuam, ainda que o vírus permaneça em circulação relativamente controlada, equilibrando a necessidade de controle da pandemia para preservação da saúde dos indivíduos com a necessidade de salvaguarda mínima da economia para a preservação de empregos e rendas. Nesse sentido, vale transcrever o seguinte trecho da recomendação expedida pela Organização Mundial da Saúde em 16 de abril de 2020 (” Considerations in adjusting public health and social measures in the context of COVID-19 “), que ora é traduzido livremente: Medidas adicionais de saúde pública e sociais em larga escala (PHSM), incluindo restrições de movimento, fechamento de escolas, empresas, quarentena de área geográfica e restrições internacionais de viagem, foram implementadas por um certo número de países. Elas são algumas vezes referidas como medidas de “bloqueio” ( lockdown ) ou “desligamento” ( shutdown ). Uma avaliação do impacto do PHSM na saúde pública para a Covid-19 ainda não está disponível, mas é necessária. Essa avaliação precisa levar em conta as consequências sociais e os custos econômicos de tais medidas, que podem ser consideráveis. Nesse sentido, uma cuidadosa avaliação de riscos e uma abordagem por fases são necessárias para equilibrar os benefícios e os possíveis danos no ajustamento dessas medidas, para não provocar um ressurgimento de casos de Covid-19 e comprometer a saúde da população. Até que intervenções farmacêuticas específicas e eficazes (por exemplo, terapias e vacinas) estejam disponíveis, os países podem precisar continuar a afrouxar ou restabelecer medidas durante toda a pandemia. As decisões para enrijecer ou afrouxar ou reinstalar o PHSM devem ser tomadas com base em evidências científicas e experiência do mundo real e levar em consideração outros fatores críticos, como economia, fatores relacionados a segurança, direitos humanos, segurança alimentar e sentimento público e adesão a medidas. Houve, por parte da OMS, como se percebe, uma clara preocupação de prevenir a disseminação do vírus e combater a pandemia, mas equilibrando as medidas restritivas para tanto necessárias com outras destinadas a preservar minimamente condições econômicas que garantam à população – sobretudo aos mais pobres – o acesso ao emprego, à renda e, consequentemente, a condições dignas de sobrevivência. Isso nada mais significa do que ponderar, no caso concreto, o princípio da prevenção com o princípio da dignidade da pessoa humana (que, a propósito, também acaba por ser tutelado com a própria prevenção), especialmente no que se relaciona com os direitos fundamentais ao trabalho e à alimentação. Não se está, absolutamente, a enfraquecer o princípio da prevenção. Pelo contrário, ele é de tamanha importância que acaba por ser objeto de ponderação com os direitos sociais acima mencionados, até porque o bem jurídico que tutela (a vida) é o mais relevante de todos. Ocorre que, mais do que o direito à vida, o ser humano tem direito a uma vida digna, o que torna necessária a compatibilização dos princípios e dos direitos fundamentais referidos.1.3 O princípio da precaução no direito à saúde 1.3.1 Conceito e distinção entre precaução e prevenção Se o princípio da prevenção é de identificação relativamente fácil no direito à saúde e possui seus contornos bem definidos, o mesmo não ocorre com o princípio da precaução, que desperta importantes controvérsias doutrinárias. Originariamente, a precaução foi um conceito surgido no trato de questões ambientais. Afirma-se que teve origem na Suécia, na década de sessenta do século passado. No entanto, o princípio da precaução ganhou notoriedade na Alemanha, nos anos setenta, quando passou a ser de fato tratado como uma “filosofia ambiental mais ampla”. Em linhas gerais, ainda que não se tenha chegado a um conceito consensual do princípio em tela, ele está necessariamente relacionado aos deveres de cautela, de cuidado, de prudência frente a incertezas científicas sobre eventuais danos que uma determinada atividade ou produto podem gerar ao meio ambiente e/ou à saúde humana. Uma concepção do princípio da precaução que se tornou bastante conhecida é aquela encampada pelo Princípio 15 da Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento na Conferência das Nações Unidas, conhecida como Eco-92, in verbis : Princípio 15 Com o fim de proteger o meio ambiente, o princípio da precaução deverá ser amplamente observado pelos Estados, de acordo com suas capacidades. Quando houver ameaça de danos graves ou irreversíveis, a ausência de certeza científica absoluta não será utilizada como razão para o adiamento de medidas economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental. Noção parecida já havia sido adotada anteriormente pela Assembleia Geral das Nações Unidas de 1982, da qual resultou a Carta Mundial da Natureza, cujo item “11.b” dispôs o seguinte: b – as atividades que possam causar um significativo risco ao meio ambiente devem ser precedidas de estudos exaustivos; os interessados devem demonstrar que os seus potenciais benefícios se sobrepõem aos potenciais danos ao meio ambiente, devendo ser paralisadas as atividades cujos potenciais efeitos adversos não forem completamente conhecidos. (tradução livre de World Charter for Nature) O princípio da precaução tem como escopo evitar que se aguarde a comprovação dos danos resultantes de determinada causa para que sejam adotadas as medidas preventivas necessárias. Havendo dúvidas, há que se adotar a postura acautelatória. O enunciado acabou sendo repetido, às vezes com algumas poucas variações, em outras convenções internacionais, tais como a da Diversidade Biológica (Decreto nº 2.519/98) e a Convenção Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (Decreto nº 2.652/98). Em outras palavras, ele determina que medidas de prevenção à degradação ambiental não podem deixar de ser tomadas pela ausência de certeza científica da existência de danos graves e irreversíveis dela advindos, sempre que viáveis economicamente. Sintetizando, a incerteza do advento dos danos não pode obstar a adoção das medidas de cautela. Nas precisas palavras de Dallari e Ventura : De maneira geral, o escopo da precaução é ultrapassar a prevenção. Não seria mais preciso que um dano se produzisse, ou se mostrasse iminente, para que um gesto, visando a evitar a produção ou a repetição desse dano, fosse legítimo. Invertendo essa lógica, a precaução baseia-se na experiência em matéria técnica e científica: as vantagens que surgem a curto prazo são, com frequência, seguidas de desvantagens a médio e longo prazo. Logo, é preciso dotar-se dos meios de prever o surgimento de eventuais danos, antes mesmo da certeza da existência de um risco. A razão de ser do princípio da precaução é bem pontuada por Machado, para quem: A incerteza no conhecimento é uma forma de ignorância. Quem sabe, não ignora. A ignorância não pode ser um pretexto para ser imprudente. O princípio da precaução não quer conservar ou perenizar a ignorância, mas, pelo contrário, quer vencê-la, com a pesquisa, com o estudo e com a constante avaliação dos fatos e dos métodos. A distinção entre o princípio da precaução e o da prevenção, que é constantemente trabalhada pela doutrina, serve para bem compreender o primeiro. Nesse sentido, Wedy faz essa diferenciação com base na relação “risco de perigo” (precaução) x “risco de dano” (prevenção). Vejamos: A diferenciação inicia-se pelo fato de que o princípio da precaução, quando aplicado, é uma medida para evitar o mero risco, e o princípio da prevenção é aplicado para evitar diretamente o dano. O risco pode ser entendido como a possibilidade de ocorrência de uma situação de perigo. Já o perigo nada mais é do que a possibilidade de ocorrência de dano. Isso porque o princípio da precaução deve ser aplicado quando não houver certeza científica de que a atividade sindicada não oferece risco de dano, e o princípio da prevenção deve ser aplicado após, ou seja, quando a atividade sindicada causar danos com prévia comprovação científica. Pode ser referido, ainda, que o princípio da prevenção tem a finalidade de se evitar o perigo concreto (comprovado cientificamente), e o princípio da precaução objetiva evitar o perigo abstrato (não comprovado cientificamente, mas cuja ocorrência seja verossímil). O princípio da prevenção pode ser aplicado para impedir que sejam praticadas atividades que já se sabem causadoras de danos, por fontes de informações científicas reconhecidas. Já o princípio da precaução, por sua vez, pode ser aplicado quando os dados científicos do risco da atividade a ser realizada são insuficientes ou contraditórios. O risco de perigo, nesse caso, pode ser meramente potencial, ou seja, configura-se com a possibilidade verossímil de nocividade da atividade, embora não se possa qualificar nem quantificar os efeitos do risco. Assim, o princípio da prevenção visa a evitar o risco conhecido, e o princípio da precaução visa a evitar o risco potencial. Já Milaré se vale das expressões “risco certo” x “risco incerto” e “perigo concreto” x “perigo abstrato” para traçar a diferenciação entre prevenção e precaução. Note-se: Com efeito, há cambiantes semânticos entre essas expressões, ao menos no que se refere à etimologia. Prevenção é substantivo do verbo prevenir (do latim prae = antes e venire = vir, chegar), e significa ato ou efeito de antecipar-se, chegar antes; induz uma conotação de generalidade, simples antecipação no tempo, é verdade, mas com intuito conhecido. Precaução é substantivo do verbo precaver-se (do latim prae = antes e cavere = tomar cuidado), e sugere cuidados antecipados com o desconhecido, cautela para que uma atitude ou ação não venha a concretizar-se ou a resultar em efeitos indesejáveis. De maneira sintética, podemos dizer que a prevenção trata de riscos ou impactos já conhecidos pela ciência, ao passo que a precaução se destina a gerir riscos ou impactos desconhecidos. Em outros termos, enquanto a prevenção trabalha com o risco certo, a precaução vai além e se preocupa com o risco incerto. Ou ainda, a prevenção se dá em relação ao perigo concreto, ao passo que a precaução envolve perigo abstrato. Em breves palavras e sem prejuízo da análise mais detida, adiante, de algumas de suas características, pode-se tomar o princípio da precaução, da forma como definido tradicionalmente, como aquele segundo o qual a ausência de certeza científica da ocorrência do dano à saúde não é razão para que se deixe de adotar as medidas necessárias ao afastamento da suposta causa. Não se trata de presunção da ocorrência de um dano, seja ela absoluta, seja relativa. Pela precaução, não há necessidade dessa presunção. Basta a incerteza da ocorrência do dano para que a postura acautelatória seja tomada. Um exemplo real ajudará a assimilar a aplicação do princípio da precaução em saúde pública na prática. Ele se refere a questões relacionadas à prevenção da disseminação da Covid-19, pandemia de acentuada gravidade que está em curso no momento em que este trabalho é escrito. Não há controvérsias em relação à transmissão do vírus por meio de gotículas respiratórias grandes passadas por indivíduos próximos um ao outro, as quais, uma vez expelidas, acomodam-se rapidamente nas superfícies próximas; bem como por meio de superfícies contaminadas. No entanto, não há até o momento evidências científicas seguras a respeito da transmissão do vírus pelo ar por meio de gotículas pequenas que ficam suspensas. A esse respeito, a Organização das Nações Unidas para o Controle de Infecções chegou a se manifestar no sentido de que a transmissão aérea seria possível, mas não suportada por evidências sólidas. A despeito disso, vários cientistas passaram a apontar evidências de que a transmissão também poderia ser feita pelo ar, sugerindo à Organização Mundial da Saúde que passasse a reconhecer essa possibilidade em suas orientações técnicas e recomendações. A possibilidade de transmissão da Covid-19 pelo ar impacta nos meios de proteção contra o seu contágio. Havendo essa forma de transmissão, o uso de máscaras em locais fechados reduz as chances de contaminação. Não havendo, a medida seria inócua na prevenção. Ainda que não haja, no momento, provas seguras da possibilidade de transmissão do vírus por gotículas pequenas suspensas no ar, mas havendo essa possibilidade, a OMS acabou por posteriormente recomendar o uso de máscaras em locais fechados em que a transmissão por essa forma pudesse ocorrer. Aplicou, portanto, o princípio da precaução ao sugerir a adoção de medidas de segurança mesmo ante a incerteza dos danos.1.3.2 O princípio da precaução como gestão de riscos Antes de prosseguir na análise do princípio da precaução no direito sanitário propriamente dito, é importante que se faça um delineamento um pouco mais preciso de seus contornos. A adoção de uma concepção rígida do princípio da precaução fez com que ele fosse bastante questionado ou mesmo combatido. Entenda-se como concepção rígida aquela segundo a qual se deve evitar a qualquer custo a ocorrência de um fato que possa causar danos ao meio ambiente ou à saúde ainda não comprovados cientificamente. Por essa visão, portanto, sempre e somente após a segura comprovação de inexistência de qualquer dano dela resultante é que uma atividade potencialmente degradadora do meio ambiente ou prejudicial à saúde poderia ser desenvolvida. As principais críticas que essa leitura do princípio da precaução recebe foram bem sintetizadas por Tickner, Kriebel e Wright, com tradução aqui feita livremente: O princípio da precaução foi criticado por: sufocar a inovação, causar consequências não intencionais potencialmente mais graves do que o problema que desencadeou a ação preventiva em primeiro lugar e criar “falsos positivos” – riscos aparentes que desperdiçam recursos e distraem os problemas reais. Cross insurge-se fortemente contra essa abordagem do princípio da precaução, salientando principalmente os elevados e, no seu entender, desarrazoados custos econômicos que ela traz. Diz ele que, “quanto mais o governo se esforça para eliminar o último risco potencial, maior o risco de consequências adversas” (tradução livre). Para fundamentar suas críticas, elenca vários exemplos de situações concretas em que o excesso de precaução traria mais prejuízos do que benefícios, tais como: a) a resistência à incineração de armas químicas militares acondicionadas no Havaí por receio de poluição atmosférica acabaria trazendo maior risco à ilha em decorrência da permanência do arsenal, que poderia causar vazamentos químicos ou explosões; b) a restrição à produção e à comercialização de adoçantes por conta do receio de conterem substâncias cancerígenas causaria um aumento do consumo de açúcar pela população, com os malefícios à saúde daí advindos; c) a substituição de veículos movidos a combustíveis fósseis por veículos elétricos demandaria maior queima de combustível para gerar a energia elétrica necessária para abastecer os automóveis. O autor elenca ainda hipóteses mais extremas e de comprovação empírica questionável, como o aumento de acidentes de trânsito proporcionado por restrições de voos por companhias aéreas em más condições de tempo e os alegados prejuízos ao tratamento de diversas doenças que a regulação de medicamentos pela FDA causaria. Resume sua posição da seguinte maneira (tradução livre): O princípio da precaução repousa na ilusão de que as ações não têm consequências além dos fins pretendidos. De fato, não existe “almoço grátis”. Os esforços para eliminar qualquer risco criarão alguns novos riscos, enquanto possivelmente reduzirão outros riscos relacionados. Se a intenção de alguém é proteger verdadeiramente a saúde pública e o meio ambiente, todos esses riscos incidentais devem ser considerados, contrariamente às aplicações prevalecentes do princípio da precaução. As críticas da corrente de entendimento aqui representada por Cross seriam razoáveis se o princípio da precaução fosse de fato compreendido da maneira rígida como ele presume em sua premissa. O desenvolvimento desse princípio desde que ele foi concebido, entretanto, leva-o atualmente a uma formatação distinta. Tem-se entendido, majoritariamente, que o princípio da precaução não impõe necessariamente que se aguarde ou se exija a cabal comprovação científica de inexistência de qualquer risco causado ao meio ambiente ou à saúde pública por uma atividade potencialmente danosa para que ela seja autorizada, ou que os riscos potenciais sejam prévia e integralmente neutralizados. Atualmente, o princípio da precaução vem sendo utilizado como um mecanismo de gestão de riscos pelo qual são ponderados, de um lado, os potenciais danos que uma atividade poderia gerar e, de outro, as consequências das mais diversas ordens que as necessárias medidas de cautela ou o não desenvolvimento da atividade proporcionariam. Considerando que o princípio da precaução foi criado e desenvolvido sobretudo na Europa, disseminando-se posteriormente, é importante analisar como ele vem sendo lá tratado. É muito interessante, nesse sentido, a “Comunicação da Comissão (da União Europeia) relativa ao princípio da precaução”, da qual se extraem os seguintes trechos: 3. O princípio da precaução não é definido no Tratado, que o prescreve apenas uma vez – para proteger o ambiente. Mas, na prática, o seu âmbito de aplicação é muito mais vasto, especificamente quando uma avaliação científica objectiva preliminar indica que há motivos razoáveis para suspeitar que efeitos potencialmente perigosos para o ambiente, a saúde das pessoas e dos animais ou a protecção vegetal podem ser incompatíveis com o elevado nível de protecção escolhido para a Comunidade.(.) 4.(.) O princípio da precaução é particularmente relevante no que se refere à gestão de riscos,(.) O recurso ao princípio da precaução pressupõe que se identificaram efeitos potencialmente perigosos decorrentes de um fenómeno, de um produto ou de um processo e que a avaliação científica não permite a determinação do risco com suficiente segurança.(.) 5. As instâncias de decisão devem estar conscientes do grau de incerteza relativo aos resultados da avaliação dos dados científicos disponíveis. Determinar qual é o nível de risco “aceitável” para a sociedade é eminentemente uma responsabilidade política, As instâncias de decisão, quando confrontadas com um risco inaceitável, uma incerteza científica e as preocupações do público, têm o dever de encontrar respostas. Contudo, todos estes factores têm de ser tomados em consideração,(.) 6.(.) Uma proibição total nem sempre constitui uma resposta proporcional a um risco potencial. Contudo, em determinados casos, é a única resposta possível a um dado risco,(.) Analisar vantagens e encargos implica comparar o custo total para a Comunidade da actuação e da ausência de actuação, a curto e a longo prazo, Não se trata simplesmente de uma análise económica custo/benefício: o seu âmbito é muito mais vasto e inclui considerações não económicas, como a eficácia das opções possíveis e a sua aceitabilidade pelo público, Ao efectuar esta análise, devem ter-se em conta o princípio geral e a jurisprudência do Tribunal, segundo os quais a protecção da saúde tem precedência sobre as considerações económicas,(.) A análise do princípio da precaução realça dois aspectos, diferentes devido à sua natureza: (i) a decisão política de actuar ou de não actuar, ligada aos factores que desencadeiam a utilização do princípio da precaução ; (ii) em caso afirmativo, como actuar, ou seja as medidas que resultam dessa utilização do princípio da precaução.(.) A abordagem de prudência inscreve-se na política de avaliação de riscos que é determinada antes de qualquer avaliação de riscos e que recorre aos elementos descritos no ponto 5.1.3. Faz pois integralmente parte do parecer científico emitido pelos avaliadores de riscos. Em contrapartida, a aplicação do princípio da precaução insere-se na gestão de riscos, quando a incerteza científica não permite uma avaliação completa dos riscos e as instâncias de decisão consideram que pode existir uma ameaça ao nível escolhido de protecção do ambiente, da saúde das pessoas ou dos animais ou de protecção vegetal. A Comissão considera que as medidas de aplicação do princípio da precaução se inscrevem no quadro geral da análise de riscos, mais precisamente na gestão de riscos, Diversos aspectos do comunicado parcialmente transcrito acima chamam a atenção. Dentre eles, três merecem destaque. O primeiro é o fato de que o princípio da precaução vem sendo tratado, como dito acima, como meio de gestão de riscos. Ainda que ele imponha o dever de cautela mesmo à míngua de comprovação científica dos danos causados por uma determinada atividade, permite, por outro lado, que sejam levadas em consideração as consequências da vedação ao exercício dessa atividade ou da implementação das medidas preventivas necessárias ao afastamento ou à mitigação dos riscos. Considera-se, portanto, o risco total. O segundo aspecto digno de nota é o de que a decisão final sobre os riscos – apurados com o devido rigor científico – aceitáveis, após feitas as ponderações necessárias, é de natureza política. Assim, cabe à ciência investigar a potencialidade danosa e os riscos de uma determinada atividade, bem como as consequências ambientais, econômicas, sanitárias e sociais do seu desempenho, da sua proibição ou da implementação das medidas de prevenção necessárias. Feita essa apuração, a decisão sobre a alternativa concreta a ser adotada é de cunho político, devendo levar em consideração os anseios e os valores aceitos na comunidade envolvida. O terceiro ponto a ser sublinhado é a premissa de que “a protecção da saúde tem precedência sobre as considerações económicas”. Assim, se o conflito no caso concreto for entre a preservação do direito à saúde (ainda que o risco de lesão seja incerto) e interesses exclusivamente econômicos, o princípio da precaução pende para a proteção da saúde. A Comissão Europeia deixou bastante claro no comunicado em epígrafe que há que se buscar uma proporcionalidade entre a onerosidade das medidas necessárias para a precaução e o nível de proteção pretendido. Consignou também que não é de se buscar sempre o “risco zero”, que dificilmente será atingido. Ainda assim, são necessários estudos científicos que apontem com a máxima precisão possível os riscos existentes e as alternativas postas à disposição do agente decisor, de maneira que a decisão proferida seja qualificada e eficiente. Vejamos: As medidas previstas devem permitir atingir o nível de protecção adequado. As medidas baseadas no princípio da precaução não deveriam ser desproporcionadas em relação ao nível de protecção pretendido e querer atingir um nível zero de risco, que raramente existe. Contudo, em certos casos, uma estimação incompleta dos riscos pode limitar consideravelmente o número de opções disponíveis para os gestores de riscos. Em certos casos, uma proibição total pode não ser uma resposta proporcional a um risco potencial. Noutros casos, pode ser a única resposta possível a um determinado risco. Essa concepção do princípio da precaução ecoa na doutrina. Beck reforça a ideia de que as informações e as conclusões científicas são o material utilizado para que decisões políticas sejam tomadas segundo os interesses sociais. Segundo ele, “constatações de risco baseiam-se em possibilidades matemáticas e interesses sociais, mesmo e justamente quando se revestem de certeza técnica”. Por isso, “racionalidade científica sem racionalidade social fica vazia, racionalidade social sem racionalidade científica, cega”. Para tanto, é indispensável que haja uma aproximação entre a comunidade científica e a sociedade, assegurando que aquela tenha noção dos valores e dos anseios sociais, e que a população em geral seja munida de conhecimentos científicos básicos para que possa tomar suas decisões. Como bem resumido por Comba, Martuzzi e Botti, várias questões filosóficas, econômicas e sociais estão subjacentes às decisões que serão tomadas. Com efeito, a sociedade está muitas vezes disposta a correr certos riscos, desde que isso lhe proporcione benefícios que seguramente superem os danos potenciais. Tome-se como exemplo o uso dos meios de transporte individuais e coletivos. Não há dúvida de que eles oferecem riscos à vida e à saúde das pessoas (acidentes aéreos ou de trânsito, poluição, etc.). Ainda assim, o proveito trazido é considerado muito maior do que os riscos gerados, de maneira que sua utilização é admitida. Há outras situações em que a ponderação entre os riscos e os benefícios da adoção de medidas potencialmente causadoras de danos à saúde é bem mais complexa e controversa social e politicamente. Um exemplo claro está relacionado ao combate à Covid-19, causadora da grave pandemia que atinge fortemente todos os continentes do planeta neste momento. Medidas de isolamento social têm sido largamente adotadas nos mais diversos países para impedir a disseminação do vírus, que se propaga rapidamente e, sobretudo, em ambientes fechados e com aglomeração de pessoas. Por isso, por vários meses, escolas permaneceram ou ainda permanecem fechadas com o objetivo de evitar que os alunos se contaminem e levem a doença também às pessoas próximas, fora do ambiente escolar. Com o passar do tempo, entretanto, os prejuízos acadêmicos gerados aos alunos, especialmente às crianças menores, começam a se tornar bastante claros. Além disso, nas camadas mais pobres da sociedade, a necessidade de os filhos pequenos permanecerem em casa dificulta ou impede que os pais trabalhem, além de lhes trazer maiores despesas com cuidados e alimentação dos pequenos. Por outro lado, sabe-se atualmente que as crianças são bem menos suscetíveis aos sintomas graves da doença quando comparadas aos adultos, cogitando-se inclusive da possibilidade de o contágio em relação a elas ser mais difícil. Não se sabe ao certo, todavia, se a transmissão do vírus pelas crianças ocorre da mesma maneira que pelos adultos, havendo estudos científicos sugerindo que a chance de uma criança espalhar o vírus é menor do que a de indivíduo adulto, mas sem resultados aceitos inquestionavelmente pela comunidade científica em geral, que continua com as pesquisas. Nesse cenário, o debate sobre a reabertura das escolas tem sido latente. Há necessidade de se ponderar, de um lado, o risco à saúde pública que ela pode causar em razão da disseminação da doença, e, de outro, as consequências negativas no aprendizado dos alunos, na possibilidade de trabalho pelos pais, na renda familiar e nos cuidados com as crianças que a manutenção do fechamento das escolas causa. Tanto os riscos da abertura como as consequências do fechamento devem ser cuidadosamente analisados segundo critérios técnicos confiáveis para que a sociedade, por meio de seus representantes políticos, decida da melhor maneira o que deve prevalecer em um dado momento e em um determinado local. Eis a amplitude do princípio da precaução, cujo conteúdo Tickner, Kriebel e Wright explicam com maestria, refutando com argumentos sólidos as críticas que recebeu por parcela da doutrina. A consistência dos fundamentos justifica a longa transcrição de suas lições (em tradução ora feita livremente): O princípio da precaução incentiva a tomada de decisões usando o maior número possível de informações e participantes. Não cria proibições rígidas para novas tecnologias quando há risco de danos. Prova absoluta de segurança é impossível; o desafio para os formuladores de políticas é encontrar o equilíbrio entre risco potencial e benefício social na ausência de prova de segurança. O princípio da precaução fornece orientação nesses dilemas de política contestada, incentivando a utilização da evidência como um todo, incluindo: a força da evidência de risco, a incerteza e a ignorância sobre o risco, sua magnitude potencial e a disponibilidade de alternativas viáveis à tecnologia proposta. A precaução pode ser uma ferramenta para redirecionar a inovação para práticas mais seguras e limpas para atender às necessidades humanas.(.) A precaução sufoca a inovação? Algumas tecnologias e substâncias provavelmente devem ser retardadas ou bloqueadas, após uma análise cuidadosa de seus benefícios, riscos, alternativas e incertezas gerais. A precaução incentiva essa revisão, mas não sufoca indiscriminadamente a inovação. Pelo contrário, uma busca minuciosa por maneiras alternativas de alcançar os mesmos objetivos sociais geralmente identifica tecnologias que devem ser incentivadas.(.) Consequências não intencionais são um risco de decisões políticas. Mas elas podem ser minimizadas, quando se age de maneira preventiva, ao: explorar e implementar uma ampla gama de opções preventivas; incluir uma ampla gama de perspectivas nos processos de tomada de decisão; usar uma perspectiva científica multidisciplinar de lentes e sistemas para examinar os riscos antes e depois das intervenções; e desenvolver métodos para monitorar intervenções de saúde pública quando há sinais precoces de problemas.(.) Precaução não significa apenas pesquisas mais acuradas; significa também vincular a avaliação de riscos a avaliações alternativas e discussões mais democráticas de necessidades e objetivos sociais.(.) Muitas crises ambientais recentes surgiram do fracasso em agir rapidamente para evitar consequências não intencionais de tecnologias aparentemente benéficas, e a precaução é vista como uma maneira de evitar esses erros em decisões futuras. Evidentemente, não existe segurança absoluta, nem certeza absoluta, e regulamentos errados e falhas de regulamentação ocorrerão. Mas acreditamos que a sociedade ainda não implementou todo o potencial da política baseada na ciência para evitar danos aos ecossistemas e à saúde, garantindo progresso em direção a um futuro mais saudável e economicamente sustentável. Longe de ser anticientíficas, políticas de precaução podem estimular inovações em ciência, medicina e tecnologia para promover a saúde e a segurança do planeta. Daí se conclui que o princípio da precaução é um mecanismo de resguardo da saúde que prima pela qualificação das informações técnicas e científicas que serão utilizadas para as decisões de cunho político a serem tomadas segundo o interesse público, permitindo que a política atue com base em evidências científicas. No entanto, não se pode perder de vista que a sua essência é a de impedir que a ausência de evidência científica dos danos causados por uma atividade dispense qualquer medida de cautela. Ainda que se chegue à conclusão de que não há necessidade de qualquer intervenção quanto à prática da atividade, isso somente pode ser feito após uma ponderação detida dos dados científicos especificamente colhidos sobre os riscos potenciais existentes e sobre as implicações de ordem ambiental, sanitária, econômica, social e política decorrentes da inação ou da implementação de medidas preventivas. Em decorrência da necessidade de análise científica rigorosa como procedimento prévio à escolha entre as alternativas postas, é de suma importância que a decisão proferida seja devidamente fundamentada, permitindo à sociedade como um todo e aos órgãos de controle uma perfeita compreensão dos dados e das informações considerados pelo poder público em sua deliberação e das razões que o levaram a decidir em um determinado sentido. Aliado ao dever de fundamentação, portanto, está o de publicidade. Essas premissas foram de certa maneira positivadas na ordem jurídica interna. O art.20 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Decreto-Lei nº 4.657/42), acrescentado pela Lei nº 13.655/2018, estabelece o seguinte: Art.20. Nas esferas administrativa, controladora e judicial, não se decidirá com base em valores jurídicos abstratos sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão. (Incluído pela Lei nº 13.655, de 2018) (Regulamento) Parágrafo único. A motivação demonstrará a necessidade e a adequação da medida imposta ou da invalidação de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa, inclusive em face das possíveis alternativas. (Incluído pela Lei nº 13.655, de 2018) O caput do referido dispositivo legal, ao determinar que as consequências práticas da decisão sejam consideradas, acaba por exigir que a autoridade administrativa se certifique, com base em critérios técnicos que possam tornar objetivas as previsões, dos resultados que dela advirão. Já o parágrafo único impõe que o agente decisor leve em consideração as possíveis alternativas à prática do ato, privilegiando aquela que se demonstre como mais adequada à solução do caso concreto. Exige, ainda, que a decisão seja devidamente motivada. Ainda que o art.20 da LINDB tenha sido instituído para normatizar as atividades decisórias em geral, tanto administrativas como judiciais, suas disposições encaixam-se perfeitamente ao conteúdo do princípio da precaução. Essa abertura para a análise de riscos que o princípio da precaução proporciona leva alguns doutrinadores, inclusive, a tratá-lo como um método de indução de tomada de decisões, e não propriamente como uma regra de decisão. Essa não parece ser a compreensão mais acertada. Ainda que se adote um conceito flexível do princípio da precaução, ele é dotado de acentuada carga normativa ao determinar (e não apenas induzir) que a incerteza científica dos danos causados por determinada atividade não seja invocada para a dispensa da adoção de medidas preventivas, ou mesmo, quando o caso impuser, para que a própria atividade seja vedada. Diante da amplitude das análises a serem feitas na aplicação do princípio da precaução como mecanismo de gestão de riscos, discute-se quais seriam os métodos mais apropriados para a definição da melhor decisão a ser tomada em cada caso concreto, seja ela a absoluta vedação do exercício da atividade potencialmente danosa, seja a sua completa liberação, a opção por meio alternativo (bem como a melhor alternativa, caso haja mais de uma) ou, ainda, a adoção de medidas de cautela ou controle da atividade proposta. A questão é complexa e sua análise detida não cabe nos propósitos deste estudo. Ainda assim, convém ao menos apontar alguns desses métodos. O já referido Comunicado da Comissão (da União Europeia) relativo ao princípio da precaução dispõe que “a avaliação de riscos consiste em quatro componentes – designadamente, a identificação do perigo, a caracterização do perigo, a avaliação da exposição e a caracterização do risco”, de maneira que “os limites do conhecimento científico podem afectar cada uma destas componentes”. Além disso, há que se conjugar a probabilidade dos danos com a sua suposta gravidade, de forma que sejam avaliados com pesos distintos: a) a alta probabilidade de ocorrência de danos graves; b) a baixa probabilidade de ocorrência de danos graves; c) a alta probabilidade de ocorrência de danos leves; e d) a baixa probabilidade de ocorrência de danos leves. Na situação “a”, não há maiores dúvidas de que são fortes os fundamentos para que se adotem as medidas necessárias a evitar os danos em detrimento de outras vantagens que a prática da atividade pudesse trazer. Por outro lado, na situação “d”, há boas razões para que se permita o exercício de atividades que possam trazer razoável benefício social em detrimento dos danos causados. As situações “b” e “c” encontram-se na zona de penumbra, exigindo maiores cuidados na ponderação entre os riscos existentes e os aceitáveis. O mesmo ocorre quando a gravidade dos riscos ou a probabilidade dos danos são desconhecidas. Gonçalves divide os métodos de interpretação econômica do princípio da precaução em dois paradigmas. O primeiro é o racional-instrumental, que “considera a teoria da escolha em incerteza, que envolve a economia, mas também conceitos da psicologia e da teoria da decisão estatística”. Ele se divide em duas correntes principais: a teoria da utilidade esperada, que é maximizada a partir dos custos e dos benefícios estimados nas diferentes opções alternativas; e os modelos designados como “aversão à ambiguidade”, aplicados “em situações em que existem expectativas divergentes sobre a incerteza por parte de diferentes indivíduos”. O segundo método é o deliberativo constitutivo, o qual “considera os quadros e os modelos multicritérios, que incluem objetivos múltiplos (ambientais, econômicos, sociais, etc.) na tomada de decisão e permitem integrar processos participativos e deliberativos”. Já Comba, Martuzzi e Botti elencam outros dois métodos para a gestão dos riscos por meio do princípio da precaução. Pelo critério bayesiano/utilitarista, privilegiam-se as consequências mais favoráveis para a maioria dos envolvidos ( the most good for the most people ). O grande problema deste método é a possibilidade de que um grupo pequeno de pessoas sofra consequências severas a partir da decisão ao final adotada. Já o critério maximin ( maximum minimorum ) leva em consideração as piores consequências possíveis para cada alternativa que possa ser adotada, independentemente de sua probabilidade ( better safe than sorry ). Este segundo método parece ser mais condizente com os propósitos do princípio da precaução. Os próprios autores chegam à conclusão de que (tradução livre): Ambas as abordagens preocupam-se com o bem-estar social e visam a proteger e melhorar o estado geral de saúde de uma comunidade, mas a visão utilitarista bayesiana o identifica como a melhoria do bem-estar total ou médio, enquanto a abordagem maximin está principalmente preocupada com o bem-estar dos subgrupos populacionais mais desfavorecidos e resulta na redução da diferença entre aqueles que estão em melhor situação e os que estão em pior. Essa lacuna não é necessariamente preocupante na avaliação utilitarista bayesiana. Assim, a estratégia maximin é considerada mais adequada para lidar com o problema da justiça distributiva. Não se pretende chegar a uma conclusão a respeito do melhor método de gestão de riscos e decisão, até porque existem vários outros critérios que não foram aqui abordados. Ainda assim, tudo o que já foi exposto serve para demonstrar com mais precisão o alcance do princípio da precaução, a multidisciplinariedade das questões por ele abrangidas e a importância do seu emprego correto para a conciliação da preservação da saúde humana com o progresso científico, tecnológico e social.1.3.3 Princípio da precaução e ônus da prova Tema sempre afeto às discussões relacionadas ao princípio da precaução e objeto de consideráveis divergências doutrinárias é a distribuição do ônus da prova acerca dos riscos e dos danos relacionados à atividade potencialmente lesiva à saúde ou ao meio ambiente. Em rápida síntese, é preciso definir se o que deve ser comprovado é a existência ou a inexistência de danos ou riscos causados por uma atividade ou um produto que em tese podem ter efeitos prejudiciais à saúde. Além disso, há que se resolver sobre quem pesa o ônus da prova. A complexidade da questão é bem sintetizada por Pearce em trecho de artigo aqui traduzido livremente: Talvez o aspecto mais discutível do princípio da precaução seja aquele que transfere o ônus da prova para os proponentes de uma atividade. Em outras palavras, a responsabilidade recai sobre os proponentes para provar que uma atividade é segura, e não sobre seus oponentes para provar que é insegura. O segundo é geralmente muito difícil, embora não impossível, mas normalmente só pode ser feito de maneira reativa após a exposição da população ao risco já ter ocorrido. Por outro lado, provar a segurança completa é geralmente impossível. Alguns doutrinadores sugeriram que, se aplicado cegamente, alterar o ônus da prova dessa maneira sufocaria toda inovação (Holm & Harris, 1999; Anonymous, 2000) e criaria riscos “falso-positivos” que desperdiçam recursos e ofuscam os problemas reais (Graham & Weinder, 1995; Keeney & von Winterfeldt, 2001). De fato, a maioria das tomadas de decisões em saúde pública envolve necessariamente uma abordagem de “equilíbrio de evidências”, em vez de uma abordagem “inocente até que se prove o contrário” ou “culpado até que se prove que é inocente”. Já de antemão, deve-se afastar a necessidade de comprovação da efetiva existência dos danos potencialmente gerados pela atividade ou pelo produto que se pretende desenvolver. É justamente a ausência de prova científica dos danos o pressuposto do princípio da precaução. A primeira questão que surge, então, é se ele impõe, em todos os casos, que se comprove previamente a ausência de riscos ou de danos propriamente ditos para o desempenho de uma atividade ou para a fabricação ou a comercialização de um produto; ou se, pelo contrário, há que se demonstrar ao menos a existência de riscos potenciais e plausíveis para que somente então se exija a cabal demonstração da segurança da atividade ou do produto. A Comissão da União Europeia, apesar de ter emitido comunicado bastante técnico e elaborado sobre o princípio da precaução, não adotou uma diretriz objetiva quanto a esse ponto. Refere em um primeiro momento que, na maioria dos casos, os consumidores e as associações que os representam é que devem demonstrar o perigo associado a um procedimento ou a um produto colocado no mercado, salvo em relação a medicamentos, pesticidas e aditivos alimentares. No entanto, pondera que, em certas hipóteses, poderá ser exigido que o produtor, o fabricante ou o importador prove a ausência de perigo. Essa possibilidade teria de ser examinada caso a caso, não podendo ser alargada de modo generalizado ao conjunto dos produtos e dos processos colocados no mercado. É difícil e não recomendável, de fato, estabelecer uma regra uniforme para uma variedade tão grande de situações que podem se apresentar no mundo real. Mesmo assim, alguns critérios minimamente objetivos podem ser previstos. Há situações em que os riscos são inerentes às atividades ou aos produtos que se pretende desenvolver, porquanto já demonstrados cientificamente à saciedade no decorrer do tempo. São os casos, por exemplo, da instalação de uma usina nuclear ou do desenvolvimento de novos medicamentos. Dada a notoriedade dos riscos e diante da possibilidade da comprovação da segurança da atividade ou do produto, o princípio da precaução impõe que o proponente produza as provas da ausência desses riscos ou de danos ou, caso existentes, de sua natureza e magnitude. Em tais hipóteses, o desempenho da atividade ou a pesquisa, a fabricação ou a comercialização do produto potencialmente danoso depende, via de regra, de autorização prévia do poder público. Essa autorização é justamente o meio pelo qual o Estado analisará se a segurança da nova tecnologia está satisfatoriamente demonstrada. Em sentido oposto, outras atividades ou produtos, por sua própria natureza, muito dificilmente produzirão riscos ou danos ao meio ambiente ou à saúde. Tome-se como exemplo a fabricação e a venda de roupas de tecido. Em casos tais, presume-se a inofensividade do produto, dispensando-se o fabricante ou o comerciante de comprovar cientificamente a sua segurança. Isso não afasta, entretanto, a possibilidade de terceiros demonstrarem de maneira plausível e com base em indícios científicos a potencialidade danosa do produto ou da atividade. Havendo essa demonstração, o princípio da precaução impõe que o desenvolvedor da atividade ou o fabricante/comerciante do produto comprove a inexistência dos riscos. As situações extremas são de resolução mais fácil. Os problemas surgem quando uma atividade ou um produto não são notoriamente perigosos, tampouco claramente inofensivos. Nesses casos, é preciso encontrar um ponto de equilíbrio para definir se caberá ao proponente comprovar a segurança da atividade ou do produto, ou aos destinatários comprovar a existência de riscos ou os danos efetivos. Não há como fugir da casuística. Em cada situação concreta, deve-se investigar se há ao menos indícios factíveis e sérios da potencialidade danosa da atividade/produto. Havendo, o princípio da precaução impõe ao proponente o ônus de comprovar a sua segurança. Não havendo, a responsabilidade de demonstrar ao menos os riscos recai sobre os destinatários. Quanto mais graves forem os danos potenciais, menor deve ser o rigor na análise dos indícios dos riscos. Nessa linha de raciocínio, Schettler e Raffensperger ensinam que (tradução livre): (.) o ônus da prova é melhor pensado como o ônus da persuasão e da responsabilidade, que evita a afirmação infrutífera de que a segurança absoluta nunca pode ser “comprovada”. Ele reconhece que, à medida que aumentam o potencial de danos graves e irreversíveis e a incerteza científica, o proponente de uma atividade tem uma obrigação crescente de explicar as suas consequências e de se responsabilizar pelos efeitos adversos que dela possam resultar. Evidentemente, essa proposta de sistematização do ônus da prova está sujeita a regramento legal diverso. No entanto, eventual normatização específica não poderá subtrair do princípio da precaução – que tem matriz constitucional, como será visto adiante – a sua essência. É o que ocorreria, por exemplo, se o agente desenvolvedor da atividade ou do produto fosse eximido de qualquer responsabilidade de comprovar a sua segurança quando a potencialidade danosa fosse evidente.1.3.4 Normatização e aplicação do princípio da precaução no direito à saúde no Brasil O princípio da precaução foi concebido e desenvolvido com mais ênfase nas questões ambientais e de segurança alimentar. Ainda assim, seu escopo é, no final das contas, a proteção última da saúde e do bem-estar das pessoas, consideradas tanto individualmente como em sua coletividade (saúde pública). Sem colocar em dúvida o valor intrínseco do meio ambiente, a sua tutela jurídica não se exaure em si mesma. Ela objetiva assegurar que a humanidade e a natureza que a permeia estejam em perfeita harmonia em uma relação de respeito mútuo que torne possível o desenvolvimento sustentável e a garantia de uma vida sadia aos seres humanos. Não há, portanto, como dissociar o princípio da precaução do direito à saúde. Cumpre, portanto, investigar como referido princípio foi incorporado ao ordenamento jurídico pátrio e quais são as suas implicações no direito sanitário. A Constituição não fez referência expressa ao princípio da precaução. Contudo, ele pode ser extraído sem maiores dificuldades a partir de várias de suas disposições. O art.196 da Constituição, após assegurar a saúde como direito de todos e dever do Estado, determina que as políticas públicas que a asseguram tenham como foco, também, a “redução do risco de doença e de outros agravos”. Note-se bem: não se trata apenas de prevenção de danos, mas de redução de riscos, A norma trabalhou com o conceito de incerteza ao se referir a risco, Além disso, o que se buscou afastar de qualquer risco não foi apenas a doença, mas também outros agravos, ou seja, quaisquer prejuízos à saúde humana. Não é difícil concluir, então, que o princípio da precaução, que tem como escopo justamente impedir o desenvolvimento de atividades ou produtos com potencial de causar danos à saúde, ainda que não comprovados (ou seja, que tragam consigo riscos ), encontra guarida na norma constitucional em foco. Há que se referir, também, o art.225, § 1º, IV e V, da Constituição, que é o dispositivo comumente mencionado pela doutrina como introdutor do princípio da precaução no âmbito constitucional. Eis o seu teor: Art.225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. § 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: (.) IV – exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, Estudo Prévio de Impacto Ambiental, a que se dará publicidade; V – controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente; Nos termos do inciso IV, acima citado, basta que a obra ou a atividade seja “potencialmente causadora” de significativos danos ao meio ambiente para que se exija estudo prévio de impacto ambiental, sendo desnecessária a efetiva prova dos danos. Já o inciso V contenta-se com o mero risco para a qualidade de vida para impor o controle da produção, da comercialização e do emprego de técnicas, métodos e substâncias potencialmente danosos. O princípio da precaução é, outrossim, um desdobramento do princípio constitucional da eficiência da Administração (art.37 da Constituição), porquanto busca priorizar o impedimento da ocorrência do agravo à saúde, mesmo quando incerto, ao invés de se contentar em tratá-lo, até porque muitas vezes o tratamento sequer será possível. A precaução também decorre de uma das várias vertentes do princípio da segurança jurídica. A segurança reside, aqui, na garantia de que o Estado tutela a vida e a saúde das pessoas da forma mais eficiente possível, ou seja, inclusive agindo antecipadamente para evitar os riscos à saúde, mesmo quando os danos são ainda incertos, mas possíveis. A segurança, aliás, foi erigida a direito fundamental tanto sob a ótica individual ( caput do art.5º) como social ( caput do art.6º). A legislação infraconstitucional também contempla, inclusive expressamente, o princípio da precaução. Além do Princípio 15 da Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento na Conferência das Nações Unidas (Eco-92) e das Convenções sobre a Diversidade Biológica (Decreto nº 2.519/98) e sobre a Mudança do Clima (Decreto nº 2.652/98), já citadas anteriormente, ele foi referido textualmente pelo art.1º da Lei nº 11.105/2005 (Lei da Biossegurança), que, ao tratar sobre normas de segurança relacionadas a organismos geneticamente modificados, estabeleceu como diretrizes “o estímulo ao avanço científico na área de biossegurança e biotecnologia, a proteção à vida e à saúde humana, animal e vegetal, e a observância do princípio da precaução para a proteção do meio ambiente”. O princípio da precaução atua fortemente na política de assistência farmacêutica à população, seja a pública, seja a privada. O art.16, II, da Lei nº 6.360/76 impõe que, para o registro de drogas, medicamentos, insumos farmacêuticos e correlatos na Anvisa – o que constitui requisito indispensável para a comercialização em território nacional, salvo hipóteses excepcionais –, é necessária a comprovação científica de sua segurança. Esses produtos estão dentre aqueles cuja potencialidade lesiva à saúde é notoriamente alta. Assim, cabe a quem pretende o registro comprovar de antemão que o produto é seguro para a saúde humana, sem a necessidade de prévios indícios de que haja algum dano decorrente do seu uso ou mesmo de que haja riscos de danos incertos. Além do mais, a mera suspeita de que um daqueles produtos, ainda que já registrado, possa ter efeitos nocivos à saúde humana já é causa suficiente a autorizar a suspensão de sua fabricação e sua venda pelo Ministério da Saúde (art.7º da Lei nº 6.360/76). Nessa mesma linha, o art.19-O, parágrafo único, da Lei nº 8.080/90 determina que os medicamentos ou produtos inseridos nos protocolos clínicos e nas diretrizes terapêuticas do SUS devem ser previamente avaliados quanto à sua segurança. Já o art.19-Q da mesma lei impõe que a Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS) avalie, antes da incorporação, as evidências científicas sobre a segurança da tecnologia analisada. Busca-se com isso evitar que os tratamentos oferecidos pelo sistema público de saúde causem mal aos pacientes, ainda que não haja demonstração concreta de potencial prejuízo. Como referido anteriormente, contudo, o princípio da precaução não impõe que toda nova tecnologia a ser introduzida na sociedade possua “risco zero” à saúde da população. Por ele se pondera, mediante um procedimento de gestão de riscos, quais os potenciais benefícios e os possíveis prejuízos advindos da atividade ou do produto avaliado para que então se decida qual a melhor alternativa a ser adotada (a permissão da nova tecnologia, sua proibição ou a adoção de medidas de controle). É exatamente o que ocorre em relação aos medicamentos. Com efeito, raramente será encontrado um medicamento que não tenha a possibilidade de causar efeitos colaterais no usuário. Ainda assim, a sociedade e as comunidades médicas e científicas assumem tais efeitos quando eles são notoriamente admissíveis frente aos benefícios que a droga proporcionará à saúde. Quanto maiores forem os benefícios ou mais graves as doenças a serem tratadas, maior a tolerância em relação aos efeitos adversos. Os tratamentos quimioterápicos para o câncer são exemplo claro disso. Mesmo causando efeitos colaterais graves à saúde dos pacientes, admitem-se a sua produção, a sua comercialização e a sua utilização por conta dos possíveis benefícios. Típica ponderação de riscos e benefícios realizada pelo princípio da precaução, portanto. É indispensável, todavia, que os perigos decorrentes da utilização do medicamento estejam bem delineados e sejam claramente informados aos profissionais da saúde e aos pacientes. O registro, a comercialização e a utilização de agrotóxicos, disciplinados pela Lei nº 7.802/89 e por diversos atos administrativos, também se dão por necessária influência do princípio da precaução. A liberação para uso desses produtos pressupõe prévia autorização do poder público, como ocorre com os medicamentos. Os riscos que oferecem à saúde humana são levantados cientificamente e cotejados com os benefícios que trazem à produção agrícola e ao incremento da produção alimentar. As provas sobre os danos, os riscos ou os benefícios devem ser produzidas antes do registro (aqui incidindo a precaução), sem prejuízo do posterior acompanhamento dos efeitos efetivamente gerados durante sua utilização. O programa de saúde do trabalhador instituído no âmbito do SUS também é permeado de medidas decorrentes do princípio da precaução. Ele tutela os trabalhadores sujeitos não apenas aos agravos, mas também aos riscos das condições de trabalho (art.6º, § 3º, da Lei nº 8.080/90). Abrange, dentre outras medidas, a “avaliação do impacto que as tecnologias provocam à saúde” (inciso IV), a “informação ao trabalhador e à sua respectiva entidade sindical e às empresas sobre os riscos de acidentes de trabalho, doença profissional e do trabalho” (inciso V) e a “garantia ao sindicato dos trabalhadores de requerer ao órgão competente a interdição de máquina, de setor de serviço ou de todo o ambiente de trabalho, quando houver exposição a risco iminente para a vida ou a saúde dos trabalhadores”. A proteção, como se vê, é sempre antecipada em tais casos, tutelando a mera existência de riscos, independentemente dos danos efetivamente comprovados. A saúde do consumidor é outra seara em que o princípio da precaução atua com forte interferência, trabalhando prioritariamente com o afastamento de riscos e independentemente da demonstração de danos concretos. A Lei nº 8.078/90 é repleta de referências à segurança – que traz ínsita a ideia de afastamento de riscos – e à saúde dos consumidores. Dentre elas, seu art.6º enumera como direitos básicos do consumidor, em primeiro lugar, “a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos” (inciso I). Merece destaque, ainda, o art.8º da mesma lei, segundo o qual “os produtos e serviços colocados no mercado de consumo não acarretarão riscos à saúde ou à segurança dos consumidores, exceto os considerados normais e previsíveis em decorrência de sua natureza e fruição (.)”. Percebe-se, mais uma vez, a caracterização do princípio da precaução como um mecanismo de gestão de riscos, porquanto não afasta a possibilidade de fornecimento de produtos ou serviços perigosos, desde que sejam aqueles normais e previsíveis de acordo com suas características e sua forma de utilização.2 Os princípios da prevenção e da precaução na jurisprudência do STF sobre direito à saúde Bem vistos os delineamentos dos princípios da prevenção e da precaução na órbita do direito à saúde, é importante verificar como eles vêm sendo aplicados em casos concretos. Para isso, é bastante interessante a menção a alguns acórdãos do Supremo Tribunal Federal que debateram o tema.2.1 Importação de pneus usados Na ADPF 101, de relatoria da Ministra Cármen Lúcia, o Supremo Tribunal Federal tratou da possibilidade, frente ao ordenamento jurídico constitucional, de importação de pneus usados para aproveitamento como matéria-prima e reciclagem em território brasileiro. A ação foi proposta pelo presidente da República para questionar diversas decisões judiciais que vinham autorizando tais importações e que, segundo a parte-autora, colocavam em grave risco a saúde pública e o meio ambiente porque não existiria método eficaz de eliminação completa dos resíduos de pneumáticos. Em voto bastante substancioso, a ministra relatora ressaltou que o descarte dos resíduos de pneus usados importados implica riscos à saúde humana e ao meio ambiente de diversas ordens, tais como doenças transmitidas por mosquitos (dengue, febre amarela, malária.), incêndios e poluição decorrente da queima e da liberação de resíduos químicos tóxicos. Frisou que não há método cientificamente seguro de eliminação dos resíduos. A ministra ponderou os interesses postos em conflito, consignando que: Na espécie em causa se põem, de um lado, a) a proteção aos preceitos fundamentais relativos ao direito à saúde e ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, cujo descumprimento estaria a ocorrer por decisões judiciais conflitantes; e, de outro, b) o desenvolvimento econômico sustentável, no qual se abrigaria, na compreensão de alguns, a importação de pneus usados para o seu aproveitamento como matéria-prima, utilizado por várias empresas, que, por sua vez, geram empregos diretos e indiretos. Na análise de todos os valores envolvidos na lide, entretanto, bem concluiu que: Nem se há negar a imperiosidade de se assegurar o desenvolvimento econômico. Especialmente em dias como os atuais, nos quais a crise econômica mundial provoca crise social, pelas suas repercussões inegáveis e imediatas na vida das pessoas. Mas ela não se resolve pelo descumprimento de preceitos fundamentais, nem pela desobediência à Constituição. Afinal, como antes mencionado, não se resolve uma crise econômica com a criação de outra crise, esta gravosa à saúde das pessoas e ao meio ambiente. A fatura econômica não pode ser resgatada com a saúde humana nem com a deterioração ambiental para esta e para futuras gerações. Ainda que o voto condutor do julgado tenha feito referências ao princípio da precaução como um dos fundamentos para a conclusão a que chegou, a hipótese é mais propícia à aplicação do princípio da prevenção, porque os efeitos maléficos e os riscos do descarte dos pneus usados à saúde e ao meio ambiente já são bastante conhecidos e claramente identificados pela ciência. Assim, o acórdão firmado pelo STF prestigiou a prevenção no trato da saúde pública ao impedir atividade econômica a ela sabidamente prejudicial.2.2 Extração e utilização do amianto crisotila Também aplicando o princípio da prevenção no direito à saúde, o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade superveniente da Lei nº 9.055/95, que, em seu art.2º, autorizou a extração, a industrialização, a utilização e a comercialização do amianto da variedade crisotila (asbesto branco) na forma por ela disciplinada. As decisões se deram na ADI 3.937, de relatoria do Ministro Dias Toffoli, e nas ADIs 3.406 e 3.470, ambas relatadas pela Ministra Rosa Weber. O Supremo Tribunal Federal considerou que a nocividade do amianto crisotila à saúde humana é atualmente comprovada pela ciência. Conforme constou na ementa do acórdão da ADI 3.937: Se, antes, tinha-se notícia dos possíveis riscos à saúde e ao meio ambiente ocasionados pela utilização da crisotila, falando-se, na época da edição da lei, na possibilidade do uso controlado dessa substância, atualmente, o que se observa é um consenso em torno da natureza altamente cancerígena do mineral e da inviabilidade de seu uso de forma efetivamente segura, sendo esse o entendimento oficial dos órgãos nacionais e internacionais que detêm autoridade no tema da saúde em geral e da saúde do trabalhador. O consenso científico em torno da natureza altamente cancerígena do amianto crisotila e a disponibilidade de materiais alternativos à fibra de amianto levaram o STF a concluir, então, pela superveniente inconstitucionalidade da Lei nº 9.055/95 por ofensa ao direito à saúde (arts.6º e 196, CF/88), ao dever estatal de redução dos riscos inerentes ao trabalho por meio de normas de saúde, higiene e segurança (art.7º, inciso XXII, CF/88) e à proteção do meio ambiente (art.225, CF/88). O sentido das decisões foi impedir um dano à saúde já conhecido e sabidamente advindo da utilização do amianto crisotila, em prestígio ao princípio da prevenção.2.3 Redução do campo eletromagnético das linhas de transmissão de energia elétrica Ao julgar o RE 627.189, em que se discutiu a obrigação das concessionárias de energia elétrica de reduzir a intensidade dos campos eletromagnéticos de torres de transmissão, por ser a radiação potencialmente cancerígena, o Supremo Tribunal Federal debruçou-se detidamente sobre o princípio da precaução. Como pano de fundo do julgamento, estavam os possíveis riscos à saúde humana que esses campos poderiam trazer. O voto do Ministro Dias Toffoli, relator do acórdão, é bastante profícuo e minucioso na análise do princípio de que se trata. Para melhor compreensão do tema, vale a pena transcrever a ementa do julgado: Recurso extraordinário. Repercussão geral reconhecida. Direito Constitucional e Ambiental. Acórdão do tribunal de origem que, além de impor normativa alienígena, desprezou norma técnica mundialmente aceita. Conteúdo jurídico do princípio da precaução. Ausência, por ora, de fundamentos fáticos ou jurídicos a obrigar as concessionárias de energia elétrica a reduzir o campo eletromagnético das linhas de transmissão de energia elétrica abaixo do patamar legal. Presunção de constitucionalidade não elidida. Recurso provido. Ações civis públicas julgadas improcedentes.1. O assunto corresponde ao Tema nº 479 da Gestão por Temas da Repercussão Geral do portal do STF na Internet e trata, à luz dos arts.5º, caput e inciso II, e 225 da Constituição Federal, da possibilidade, ou não, de se impor a concessionária de serviço público de distribuição de energia elétrica, por observância ao princípio da precaução, a obrigação de reduzir o campo eletromagnético de suas linhas de transmissão, de acordo com padrões internacionais de segurança, em face de eventuais efeitos nocivos à saúde da população.2. O princípio da precaução é um critério de gestão de risco a ser aplicado sempre que existirem incertezas científicas sobre a possibilidade de um produto, evento ou serviço desequilibrar o meio ambiente ou atingir a saúde dos cidadãos, o que exige que o Estado analise os riscos, avalie os custos das medidas de prevenção e, ao final, execute as ações necessárias, as quais serão decorrentes de decisões universais, não discriminatórias, motivadas, coerentes e proporcionais.3. Não há vedação para o controle jurisdicional das políticas públicas sobre a aplicação do princípio da precaução, desde que a decisão judicial não se afaste da análise formal dos limites desses parâmetros e privilegie a opção democrática das escolhas discricionárias feitas pelo legislador e pela Administração Pública.4. Por ora, não existem fundamentos fáticos ou jurídicos a obrigar as concessionárias de energia elétrica a reduzir o campo eletromagnético das linhas de transmissão de energia elétrica abaixo do patamar legal fixado.5. Por força da repercussão geral, é fixada a seguinte tese: no atual estágio do conhecimento científico, que indica ser incerta a existência de efeitos nocivos da exposição ocupacional e da população em geral a campos elétricos, magnéticos e eletromagnéticos gerados por sistemas de energia elétrica, não existem impedimentos, por ora, a que sejam adotados os parâmetros propostos pela Organização Mundial de Saúde, conforme estabelece a Lei nº 11.934/2009.6. Recurso extraordinário provido para o fim de julgar improcedentes ambas as ações civis públicas, sem a fixação de verbas de sucumbência. (RE 627.189, relator Min. Dias Toffoli, Tribunal Pleno, julgado em 08.06.2016, acórdão eletrônico, repercussão geral – mérito, DJe-066, divulg.31.03.2017, public.03.04.2017) Invocando o princípio da precaução, a parte-autora da ação objetivava que o campo eletromagnético das linhas de transmissão de energia elétrica fosse reduzido a limites inferiores aos máximos previstos na legislação pátria e recomendados pela OMS, mas de acordo com padrões internacionais, especificamente da Suíça. O que chama a atenção no acórdão em epígrafe é a consideração do princípio da precaução como mecanismo de gestão de riscos, conforme exposto anteriormente. Com efeito, o Supremo Tribunal Federal não exigiu que fosse demonstrado cientificamente um “risco zero” de danos à saúde com a adoção, pelo ordenamento jurídico pátrio, dos limites do campo eletromagnético recomendados pela OMS, que são superiores ao da Suíça. Bastava, segundo o entendimento adotado, que os riscos e as consequências da manutenção ou da redução dos limites fossem previamente apreciados mediante critérios científicos confiáveis para então serem sopesados e considerados na decisão a ser tomada. Os seguintes trechos do voto do ministro relator são bastante elucidativos quanto ao ponto: Com o devido respeito, não se mostra correta a afirmativa de que esse princípio (o da precaução) deva ser aplicado quando não comprovado o afastamento total dos riscos efetivos ou potenciais. Isso porque dificilmente existirá um produto ou serviço que possa estar livre de qualquer margem de risco à saúde ou, conforme o caso, ao meio ambiente.(.) A legislação brasileira, rememoro, instituiu 83,33 μT (microteslas) como o limite máximo de emissão de campos magnéticos, detectável a um metro e meio do solo. A discussão sobre a segurança desse limite para a saúde do ser humano não é nova em nosso país, tendo-se iniciado em 2007. Em 2009, após amplo debate, os Poderes Executivo e Legislativo optaram por acatar os parâmetros propostos pela Organização Mundial da Saúde, e o país acabou por aprovar a Lei nº 11.934/09.(.) Como reiteradamente se manifestaram as partes durante o feito, bem como os especialistas, a caracterização do que é seguro ou não seguro depende do avanço do conhecimento científico. Entretanto, não me parece que existam provas ou mesmo indícios de que o avanço científico na Suíça ou em outros países que não adotam os padrões da OMS esteja além do da maioria dos países que compõem a União Europeia ou do de outros países do mundo que estão a adotar os limites estabelecidos pela OMS e pela ICNIRP. Acentuo, ainda, que esses limites acabaram sendo aceitos em nosso país, inclusive pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), como se verifica na edição da NBR nº 15.415, publicada em 20 de outubro de 2006.(.) Portanto, tendo sido adotadas pelo Estado brasileiro as necessárias cautelas, pautadas pelo princípio constitucional da precaução, e tendo em vista que nosso regime jurídico se encontra pautado de acordo com os parâmetros de segurança reconhecidos internacionalmente, não há razão suficiente que justifique a manutenção da decisão objurgada. É evidente que, no futuro, caso surjam efetivas e reais razões científicas e/ou políticas para a revisão do que se deliberou no âmbito normativo, o espaço para esses debates e a tomada de novas decisões há de ser respeitado. É interessante observar que o julgamento foi precedido de audiência pública em que foram ouvidos representantes do Ministério da Saúde, da Aneel, do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor e do Ministério de Minas e Energia, além de entidades representativas de profissionais da saúde, universidades, centros de pesquisa e especialistas na área. O procedimento segue a ideia de pluralização do debate, que, como já demonstrado anteriormente, exorbita as questões eminentemente técnicas, de forma que os dados científicos solidamente colhidos servem para uma posterior decisão que muitas vezes terá cunho político, observando-se, evidentemente, a primazia que o direito à vida e à saúde tem em relação aos demais.2.4 Controle vetorial por meio de dispersão por aeronaves No julgamento da ADI 5.592/DF, o Supremo Tribunal Federal apreciou a constitucionalidade da norma do art.1º, § 3º, IV, da Lei nº 13.301/16, que trata de mecanismos de controle vetorial por meio de dispersão por aeronaves para o combate ao mosquito transmissor da dengue, do vírus chikungunya e do vírus da zika. Em síntese, seria a pulverização de veneno contra o mosquito. A Procuradoria-Geral da República afirmava que, além de carecer de provas científicas de sua efetividade, a medida poderia causar prejuízos à saúde e ao meio ambiente. A relevância do julgamento reside no entendimento do STF de que, em prestígio ao princípio da precaução, não basta que a medida seja previamente autorizada pela autoridade sanitária competente. É necessário, mais do que isso, que a autorização ocorra com base em estudos científicos consistentes que demonstrem a sua segurança para a saúde humana e a eficácia do método. É interessante observar que o controle vetorial a que se refere a Lei nº 13.301/16 destina-se justamente à prevenção das doenças transmitidas pelo mosquito. Significa dizer que estavam em cotejo dois cenários em que a saúde pública demandava atenção, seja pelos danos causados pelas doenças, seja pelos riscos trazidos pelas medidas de combate. No caso, prevaleceu o entendimento de que o princípio da precaução impunha que se obtivessem evidências científicas seguras acerca do método de controle do vetor antes de sua implementação. É o que se depreende do voto do Ministro Edson Fachin, relator para o acórdão: De fato, apesar de a lei condicionar a utilização de dispersão de substâncias químicas por aeronaves para combate ao mosquito transmissor do vírus da dengue, do vírus chikungunya e do vírus da zika à autorização da autoridade sanitária e à demonstração da eficácia do método, é mister asseverar que, em se tratando de procedimento que acarreta riscos indubitáveis à saúde humana e ao equilíbrio da fauna e da flora da região na qual eventualmente se dispersarão os venenos, mostra-se inafastável a incidência do princípio da precaução, a orientar o agir do Estado, ainda que se trate de grave epidemia a acometer o país. Apesar de submeter a incorporação dessa medida à autorização da autoridade sanitária e à comprovação de eficácia da prática no combate ao mosquito, entendo que o legislador assume a positivação do instrumento sem a realização prévia desses estudos, o que pode levar à violação à sistemática de proteção ambiental contida no artigo 225 da Constituição Federal.(.) Portanto, para o atendimento do princípio da precaução ambiental – que condiz com a própria manutenção da vida no planeta –, não basta a previsão legal autorizando a medida, ainda que com condicionantes; é imperiosa a garantia da segurança e da eficácia da utilização da técnica, com estudos científicos prévios à própria inclusão na legislação, a fim de que o Estado-legislador corretamente demonstre a inexistência ou a mitigação eficiente dos riscos envolvidos antes de sua positivação.(.) Nada obstante, é evidente que não existiu a devida perquirição científica prévia acerca da segurança e da eficácia dessa modalidade de controle da epidemia de doenças causadas pelo mosquito Aedes aegypti,(.) Ao contrário, os estudos citados pela Procuradoria-Geral da República e as notas técnicas juntadas à petição inicial, emitidas pelo Ministério da Saúde e pelo Ministério do Meio Ambiente, demonstram haver incerteza científica no tocante à efetiva segurança da utilização da dispersão aérea de substâncias químicas para o combate ao mosquito Aedes aegypti, A conclusão do Supremo Tribunal Federal foi, então, a de conferir interpretação conforme ao art.1º, § 3º, IV, da Lei 13.301/2016, de maneira que a dispersão aérea de veneno só seja feita após prévia comprovação científica de sua eficácia e da ausência de danos à saúde e ao meio ambiente.2.5 Liberação tácita de comercialização e uso de agrotóxicos A Portaria nº 43/2020 do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento/Secretaria de Defesa Agropecuária, nos itens 64 a 68 da Tabela 1 de seu artigo 2º, estabeleceu prazo de 180 dias para a manifestação da autoridade competente sobre o registro de fertilizantes e de 60 dias para agrotóxicos. Na ausência de manifestação conclusiva da Secretaria de Defesa Agropecuária sobre a liberação, considera-se que houve aprovação tácita. Essas regras foram impugnadas por meio das ADPFs 656 e 658, ambas relatadas pelo Ministro Ricardo Levandowski, cujos acórdãos não foram publicados até a data da conclusão deste trabalho. Ainda assim, as informações extraídas de notícia divulgada pelo Supremo Tribunal Federal foram de que a Corte se valeu do princípio da precaução, diante dos sabidos efeitos nocivos dos agrotóxicos para a saúde e o meio ambiente, para suspender os dispositivos normativos impugnados. De fato, conforme visto anteriormente, o controle sanitário de medicamentos e agrotóxicos é uma das áreas da saúde pública em que o princípio da precaução mais se faz presente. Dados os notórios riscos que esses produtos oferecem à saúde, a sua liberação para uso pressupõe minuciosa análise técnica e científica acerca dos potenciais danos, o que é evidentemente incompatível com a aprovação tácita.2.6 Requisição de hospital particular desativado para tratamento da Covid-19 A pandemia da Covid-19 trouxe à tona inúmeras discussões relacionadas à aplicação dos princípios da precaução e da prevenção no âmbito do direito à saúde. Um caso interessante em que a questão foi abordada é o da STP 393, apreciada pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Dias Toffoli. O Município de Bom Jesus do Galho/MG requisitou um hospital privado desativado para tratamento de portadores da Covid-19, nos termos do art.3º, VII, da Lei 13.979/2020, que prevê tal forma de requisição. Havia até então um único caso da doença confirmado na cidade. Impugnada a medida, o STF, por meio de seu presidente, utilizou o princípio da precaução para mantê-la hígida mesmo diante das incertezas a respeito da forma de propagação do vírus no município, que poderia ou não tornar necessária a utilização dos leitos do hospital requisitado. Vale citar, em relação ao ponto, os seguintes trechos da decisão: (.) a forma como sua disseminação tem ocorrido velozmente país afora e tem acarretado dramáticas situações na rede pública hospitalar de saúde de diversos municípios demonstra que não parece prudente aguardar uma piora do quadro para a tomada de medidas concretas. Por outro lado, a forma absolutamente imprevisível como ocorreu o início e a propagação dessa pandemia torna de todo desarrazoado exigir-se, com exacerbado rigor, que medidas emergenciais na área de saúde pública sejam tomadas com base em sólidas evidências científicas ou estratégicas de informações em saúde.(.) E o acerto de referida medida administrativa também pode ser referendado pela aplicação, ao caso, do princípio da precaução, o qual, muito embora não se refira, diretamente, à hipótese fática em discussão nestes autos, visto que mais comumente ligado a situações ocorridas em matéria tecnológica e ambiental, impõe que o julgador, em matéria de saúde pública e em face de dúvida sobre qual a melhor solução a tomar, sempre opte por aquela que mais adequadamente atenda aos interesses da saúde pública.2.7 Campanha publicitária “O Brasil não pode parar” Também em questão relacionada à pandemia da Covid-19, o Supremo Tribunal Federal foi provocado para se manifestar sobre a campanha publicitária proposta pelo governo federal com o lema “O Brasil não pode parar”. A campanha seria lançada em um momento em que praticamente todas as autoridades sanitárias nacionais e internacionais, inclusive a OMS, recomendavam o isolamento social como medida destinada a amenizar a disseminação descontrolada do vírus, que até o presente momento não pode ser curado por medicamentos nem conta com vacina que o previna. Preocupado com os efeitos econômicos que o isolamento social traria e na contramão das recomendações das autoridades de saúde pública, o governo federal estimulava a manutenção das atividades cotidianas dos cidadãos e das empresas. A campanha publicitária foi então impugnada na ADPF 668, sob a relatoria do Ministro Roberto Barroso. Em uma primorosa decisão cautelar, o ministro considerou que a campanha caminhava em sentido contrário às recomendações da OMS, do Ministério da Saúde, do Conselho Federal de Medicina, da Sociedade Brasileira de Infectologia, além de outras instituições nacionais e internacionais, todas propugnando pelo distanciamento social. Aplicou ao caso os princípios da prevenção e da precaução, “que determinam, na forma da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que, na dúvida quanto à adoção de uma medida sanitária, deve prevalecer a escolha que ofereça proteção mais ampla à saúde”. O ministro assim detalhou seu raciocínio: Ainda que assim não fosse, que não houvesse uma quase unanimidade técnico-científica acerca da importância das medidas de distanciamento social e mesmo que não tivéssemos a agravante de reunirmos grupos vulneráveis em situações de baixa renda, o Supremo Tribunal Federal tem jurisprudência consolidada no sentido de que, em matéria de tutela ao meio ambiente e à saúde pública, devem-se observar os princípios da precaução e da prevenção. Portanto, havendo qualquer dúvida científica acerca da adoção da medida sanitária de distanciamento social – o que, vale reiterar, não parece estar presente –, a questão deve ser solucionada em favor do bem saúde da população. Após o deferimento da medida cautelar, o próprio governo federal entendeu por bem não levar a campanha adiante, fazendo com que a ADPF perdesse seu objeto e fosse extinta. O que é digno de nota no caso ora versado é que os princípios da precaução e da prevenção foram utilizados como parâmetro de controle de uma política pública como um todo que buscava induzir a população a não seguir as orientações de isolamento social preconizadas pelas autoridades sanitárias.2.8 Responsabilização de agentes públicos por decisões relacionadas à pandemia da Covid-19 Diante de tantas incertezas científicas relacionadas à pandemia da Covid-19, das graves repercussões sanitárias e econômicas que ela trouxe, da necessidade de compatibilização da saúde pública com a economia e das implicações da urgência nas tomadas de providências administrativas das mais diversas ordens para se lidar com o vírus, veio a lume a Medida Provisória nº 966/2020, que “dispõe sobre a responsabilização de agentes públicos por ação e omissão em atos relacionados com a pandemia da Covid-19”. De acordo com seu art.1º, a responsabilização dos agentes públicos nas esferas civil e administrativa por decisões concernentes à pandemia depende de ação ou omissão mediante dolo ou erro grosseiro. Já o art.2º, que foi objeto de impugnação por meio da ADI 6.421, dispõe: “considera-se erro grosseiro o erro manifesto, evidente e inescusável praticado com culpa grave, caracterizado por ação ou omissão com elevado grau de negligência, imprudência ou imperícia”. Parcela dos meios jurídico e político considerou que a medida provisória em questão poderia servir como álibi para a não responsabilização de agentes públicos por decisões descoladas de critérios técnicos, o que levou ao questionamento de seu art.2º no Supremo Tribunal Federal por meio da referida ADI 6.421. O plenário do STF, acompanhando os termos do Ministro Roberto Barroso, fixou então as seguintes teses: 1. Configura erro grosseiro o ato administrativo que ensejar violação ao direito à vida, à saúde, ao meio ambiente equilibrado ou impactos adversos à economia, por inobservância: (i) de normas e critérios científicos e técnicos; ou (ii) dos princípios constitucionais da precaução e da prevenção.2. A autoridade a quem compete decidir deve exigir que as opiniões técnicas em que baseará sua decisão tratem expressamente: (i) das normas e dos critérios científicos e técnicos aplicáveis à matéria, tal como estabelecidos por organizações e entidades internacional e nacionalmente reconhecidas; e (ii) da observância dos princípios constitucionais da precaução e da prevenção, sob pena de se tornarem corresponsáveis por eventuais violações a direitos. A um só tempo, o Supremo Tribunal Federal reforçou o status constitucional dos princípios da prevenção e da precaução e os vinculou às normas e aos critérios técnico-científicos como parâmetros decisórios fora dos quais os agentes públicos podem ser responsabilizados. Mais do que isso, frisou que esses critérios sejam estabelecidos por “organizações e entidades internacional e nacionalmente reconhecidas”, tudo a confirmar que os princípios da prevenção e da precaução devem sempre caminhar ao lado da ciência. Com efeito, tratando-se de princípios constitucionais, a prevenção e a precaução devem balizar a atuação dos agentes públicos, tornando ilícitas as condutas que não os seguem. Caso emblemático em que a não observância do princípio da precaução causou prejuízos gravíssimos à saúde de muitos cidadãos, ensejando o reconhecimento pelo próprio Estado do dever de indenização, foi o da talidomida. A droga foi lançada na década de 50 do século passado como antigripal e sedativa. Sem estudos prévios e de longo prazo suficientes em relação à segurança para a saúde humana, atingiu sucesso mundial sob a propaganda agressiva de ser um medicamento seguro e eficaz. Pouco tempo após o início do uso generalizado, ainda no final dos anos 50 e início dos anos 60, começaram a aparecer os primeiros relatos de efeitos colaterais graves, culminando na constatação de malformações congênitas. Como detalhado por Moro e Invernizzi : Entre as anormalidades ocasionadas pela talidomida estão: perda de audição, alterações oculares, surdez, paralisia facial; malformações na laringe, na traqueia, nos pulmões e no coração; e retardo mental em 6,6% dos indivíduos afetados. A taxa de mortalidade entre as vítimas variou entre 40% e 45%. Entre dez e quinze mil crianças nasceram com as malformações típicas associadas à talidomida no mundo, e 40% delas morreram no primeiro ano de vida (Vianna, Sanseverino, Faccini, 2014). No Brasil, a talidomida começou a ser comercializada quando já havia notificação de efeitos adversos na Alemanha. A retirada da droga do mercado ocorreu em 1965, quatro anos depois do país europeu. A tragédia causada na saúde pública foi tamanha que a Lei nº 7.070/82 instituiu pensão especial para as vítimas do medicamento. Já a Lei nº 12.190/2010 concedeu indenização por danos morais para as mesmas vítimas, em um reconhecimento claro da responsabilidade do Estado em razão da não observância dos princípios da prevenção e da precaução quando da liberação da droga para uso em território nacional e da sua suspensão tardia. Conclusões A prudência é uma virtude que deve acompanhar todas as ações humanas. Ela é especialmente importante no trato da vida e da saúde das pessoas, que são os bens jurídicos mais caros que possuem. O desenvolvimento científico e tecnológico, ao mesmo tempo que viabiliza o progresso socioeconômico, permite antever consequências negativas ou ao menos vislumbrar riscos de danos decorrentes de certas práticas e acontecimentos. Por outro lado, as próprias inovações tecnológicas podem oferecer riscos à saúde enquanto seus efeitos, sobretudo a longo prazo, não são perfeitamente conhecidos. Nesse cenário, tanto o impedimento de danos certos quanto o afastamento dos riscos de danos incertos ganham especial importância na proteção à vida e à saúde pública. O princípio da prevenção tem como objetivo evitar a ocorrência de danos conhecidos à saúde. Está previsto expressamente em normas constitucionais e infraconstitucionais relacionadas ao direito à saúde, permeando as mais variadas vertentes do SUS e da saúde suplementar. Encontra-se especialmente presente nas políticas de vigilância sanitária e epidemiológica, de vacinação, de saúde do trabalhador e do consumidor. Na condição de princípio jurídico, impõe padrões de conduta ao Estado e aos particulares. Por outro lado, deve ser harmonizado com outros princípios, observando-se a primazia que o direito à vida e à saúde tem sobre os demais. Já o princípio da precaução lida com os danos desconhecidos ou incertos de uma atividade ou um produto. Busca afastar os simples riscos, impondo que a mera inexistência de comprovação dos danos ou de sua extensão não sirva como justificativa para a permissão do livre desenvolvimento da atividade ou da comercialização do produto. Partindo dos pressupostos de que dificilmente será possível chegar-se ao desenvolvimento e à comprovação de atividades com “risco zero” à saúde e de que muitas vezes os benefícios delas advindos podem superar os riscos oferecidos, o princípio da precaução passou a ser largamente utilizado como mecanismo de gestão de riscos. Para que seja bem empregado e atinja os seus reais propósitos, é necessário que esteja sempre pautado por critérios técnicos e científicos rigorosos para a apuração dos riscos, dos potenciais danos (considerados em relação à sua gravidade, à sua probabilidade e à sua extensão) e, por outro lado, dos proveitos que se almeja obter com a nova tecnologia. A distribuição do ônus da prova quanto à existência dos riscos e à sua extensão na aplicação do princípio da precaução é um tema que enseja intensos debates. Alguns critérios podem ser estabelecidos em relação ao ponto. Pela própria essência do princípio, não há que se exigir a prova de existência de lesividade de uma tecnologia para que se impeça o seu desenvolvimento. Quando há razoáveis indicativos de que ela pode ser perigosa à saúde, cabe ao proponente produzir provas em sentido contrário. Por outro lado, não havendo nenhum indício de riscos, a sua demonstração é de incumbência dos terceiros interessados. Havendo tal demonstração, aí sim se exige do proponente que os afaste. Quanto mais graves ou extensos os possíveis danos, menor deve ser o rigor na apuração dos indícios que farão com que o ônus da prova da inexistência dos danos se volte contra o proponente. A análise é inevitavelmente casuística. O princípio da precaução encontra guarida nas mais diversas facetas do direito sanitário, já que todo ele é pautado pela busca de “redução do risco de doença e de outros agravos”, nos termos do art.196 da Constituição. É de visibilidade mais nítida na regulação de medicamentos e agrotóxicos e na política de assistência farmacêutica do SUS, apesar de também estar presente, por exemplo, nos programas de proteção à saúde do trabalhador e do consumidor. A jurisprudência tem se deparado com inúmeras situações concretas em que os princípios da prevenção e da precaução são diretamente aplicados na interpretação do direito à saúde. O Supremo Tribunal Federal conta com diversas decisões e acórdãos emblemáticos sobre o tema, alguns dos quais aqui elencados em razão de sua relevância como paradigmas a serem observados. Com este estudo, buscou-se demonstrar a relevância que os princípios da precaução e da prevenção possuem também no direito sanitário, visto que eles são costumeiramente abordados no direito ambiental. Se as considerações aqui tecidas servirem ao menos para que se reflita mais sobre tais princípios quando se trata do direito à saúde, sobretudo neste tempo em que a grave pandemia da Covid-19 escancara a necessidade de atenção às medidas preventivas e acautelatórias no trato com a vida humana, os propósitos deste texto terão sido atingidos. Referências bibliográficas ÁVILA, Humberto Bergmann. A distinção entre princípios e regras e a redefinição do dever de proporcionalidade. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, n.215, p.151-179, jan./mar.1999. BECK, Ulrich. Sociedade de risco : rumo a uma outra modernidade.2. ed. São Paulo: Editora 34, 2011. BÍBLIA Sagrada: edição de estudos. : Ave Maria, 2018. COMBA, Pietro; MARTUZZI, Marco; BOTTI, Caterina. The precautionary principle in decision-making: the ethical values. In : WORLD HEALTH ORGANIZATION EUROPE. The precautionary principle : protecting public health, the environment and the future of our children.2004. CROSS, Frank B. Paradoxical perils of the precautionary principle,53 Wash. & LeeL. Rev.851 (1996). Disponível em: https://scholarlycommons.law.wlu.edu/wlulr/vol53/iss3/2, DALLARI, Sueli Gandolfi; VENTURA, Deisy de Freitas Lima. O princípio da precaução: dever do Estado ou protecionismo disfarçado? São Paulo Perspec., São Paulo, v.16, n.2, p.53-63, jun.2002. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-88392002000200007&lng=en&nrm=iso, Acesso em: 12 jul.2020. DWORKIN, Ronald. Is law a system of rules? In : DWORKIN, R.M. (ed.). 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Richtiges Recht, München: Beck, 1979. MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro,21. ed. São Paulo: Malheiros, 2013. MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de direito constitucional,10. ed. São Paulo: Saraiva, 2015. MILARÉ, Édis. Direito do ambiente,11. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018. MORO, Adriana; INVERNIZZI, Noela. A tragédia da talidomida: a luta pelos direitos das vítimas e por melhor regulação de medicamentos. História, Ciências, Saúde, Manguinhos (Rio de Janeiro), v.24, n.3, p.603-622, jul./set.2017. PEARCE, Neil. Public health and the precautionary principle. In : WORLD HEALTH ORGANIZATION EUROPE. The precautionary principle : protecting public health, the environment and the future of our children.2004. PENNA, Moira Maxwell; DUARTE, Ivolethe; COHEN, Cláudio; OLIVEIRA, Reinaldo Ayer de. Concepções sobre o princípio da não maleficência e suas relações com a prudência. Revista Bioética, v.20, n.1, p.78-86, 2012. QUIGGIN, John. The precautionary principle and the theory of choice under uncertainty, Artigo apresentado na 48th Annual Conference of the Australian Agricultural and Resource Economics Society, Melbourne, 10-13 February 2004. Disponível em: https://pdfs.semanticscholar.org/2f08/760f16e7232d596c4f0d22cbb51096b17390.pdf, Acesso em: 16 jul.2020. SARLET, Ingo Wolfgang; FENSTERSEIFER, Tiago. Direito constitucional ambiental : Constituição, direitos fundamentais e proteção ao ambiente.5. ed. Rio de Janeiro: Revista dos Tribunais, 2017. SCHETTLER, Ted; RAFFENSPERGER, Carolyn. Why is a precautionary approach needed? In : WORLD HEALTH ORGANIZATION EUROPE. The precautionary principle : protecting public health, the environment and the future of our children.2004. TESSLER, Marga Inge Barth. A justiça e a efetividade na saúde pública, Dissertação (Mestrado em Direito) – Fundação Getúlio Vargas, Escola de Direito do Rio de Janeiro. Disponível em: http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/8568/DMPPJ%20-%20MARGA%20TESSLER.pdf?sequence=1, Acesso em: 28 jul.2020. TICKNER, Joel A.; KRIEBEL, David; WRIGHT, Sara. A compass for health: rethinking precaution and its role in science and public health. International Journal of Epidemiology, v.32, Aug.2003. Disponível em: https://doi.org/10.1093/ije/dyg186, WEDY, Gabriel de Jesus Tedesco. Os elementos constitutivos do princípio da precaução e a sua diferenciação com o princípio da prevenção. Revista de Doutrina da 4ª Região, Porto Alegre, n.68, out.2015. Disponível em: https://revistadoutrina.trf4.jus.br/artigos/edicao068/Gabriel_Wedy.html, Acesso em: 15 jul.2020. BÍBLIA Sagrada: edição de estudos. : Ave Maria, 2018.p.927. FERRER, J.J.; ALVAREZ, J.C. Para fundamentar la bioética : teorías y paradigmas teóricos en la bioética contemporánea. Madrid: Universidad Pontificia Comillas, 2003.p.130. As diversas concepções éticas e filosóficas do princípio da não maleficência são bem abordadas por PENNA, Moira Maxwell; DUARTE, Ivolethe; COHEN, Cláudio; OLIVEIRA, Reinaldo Ayer de. Concepções sobre o princípio da não maleficência e suas relações com a prudência. Revista Bioética, v.20, n.1, p.78-86, 2012. MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de direito constitucional,10. ed. São Paulo: Saraiva, 2015.p.641. BECK, Ulrich. Sociedade de risco : rumo a uma outra modernidade.2. ed. São Paulo: Editora 34, 2011.p.23. Ob. cit., p.26. Ob. cit., p.24. “Art.2º A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício. § 1º O dever do Estado de garantir a saúde consiste na formulação e execução de políticas econômicas e sociais que visem à redução de riscos de doenças e de outros agravos e no estabelecimento de condições que assegurem acesso universal e igualitário às ações e aos serviços para a sua promoção, proteção e recuperação”. Reforçando a norma constitucional, o art.7º, II, da Lei nº 8.080/90 estabelece como princípio das ações e dos serviços públicos em saúde a “integralidade de assistência, entendida como conjunto articulado e contínuo das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade do sistema”. Dallari e Ventura, no artigo citado na nota 8, acima, traçam uma contextualização histórica bastante interessante sobre a política de higiene pública e sua importância como método preventivo de promoção da saúde. LARENZ, Karl. Richtiges Recht, München: Beck, 1979.p.26; LARENZ, Karl. Methodenlehre der Rechtswissenschaft,6. ed. München: Beck, 1991.p.474. ÁVILA, Humberto Bergmann. A distinção entre princípios e regras e a redefinição do dever de proporcionalidade. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, n.215, p.151-179, jan./mar.1999. DWORKIN, Ronald. Taking rights seriously,6. imp. Londres: Duckworth, 1991.p.26. Idem, Is law a system of rules? In : DWORKIN, R.M. (ed.). The philosophy of law, Oxford: Oxford University Press, 1977.p.45. Nesse sentido, Jordan e O’Riordan afirmam que: ” Although widely adopted, the precautionary principle has neither a commonly agreed definition nor a set of criteria to guide its implementation. One well-known legal commentator (Fisher, 2002: 13) suggests that there are ‘countless different legal and policy definitions () and endless examples of where it has been explicitly put into operation’. Its advocates foresee precaution developing into ‘the fundamental principle of environmental protection policy at scales’ (Cameron & Abouchar, 1991). Sceptics, in contrast, claim that: its popularity derives from its vagueness; there is no single principle but ‘droves of differing versions’ (Stone, 2001); it fails to bind anyone to anything; and it does not resolve any of the deep dilemmas that characterize modern environmental policy-making ” (JORDAN, Andrew; O’RIORDAN, Timothy. The precautionary principle: a legal and policy history. In : WORLD HEALTH ORGANIZATION EUROPE. The precautionary principle : protecting public health, the environment and the future of our children.2004). WEDY, Gabriel de Jesus Tedesco. Os elementos constitutivos do princípio da precaução e a sua diferenciação com o princípio da prevenção. Revista de Doutrina da 4ª Região, Porto Alegre, n.68, out.2015. Disponível em: https://revistadoutrina.trf4.jus.br/artigos/edicao068/Gabriel_Wedy.html, Acesso em: 15 jul.2020. JORDAN; O’RIORDAN, ob. cit. MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro,21. ed. São Paulo: Malheiros, 2013.p.112. WEDY, Gabriel de Jesus Tedesco. Os elementos constitutivos do princípio da precaução e a sua diferenciação com o princípio da prevenção. Revista de Doutrina da 4ª Região, Porto Alegre, n.68, out.2015. Disponível em: https://revistadoutrina.trf4.jus.br/artigos/edicao068/Gabriel_Wedy.html, Acesso em: 15 jul.2020. MILARÉ, Édis. Direito do ambiente,11. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018. TICKNER, Joel A.; KRIEBEL, David; WRIGHT, Sara. A compass for health: rethinking precaution and its role in science and public health. International Journal of Epidemiology, v.32, p.489-492, Aug.2003. Disponível em: https://doi.org/10.1093/ije/dyg186, Nesse sentido, Tessler consigna que “o postulado da razoabilidade tem aqui grande possibilidade de auxiliar no exame do caso concreto, demandando uma relação congruente entre a medida adotada e o fim que ela pretende atingir, ou verificação de equivalência entre direitos e sacrifícios exigidos” (TESSLER, Marga Inge Barth. A justiça e a efetividade na saúde pública, Dissertação (Mestrado em Direito) – Fundação Getúlio Vargas, Escola de Direito do Rio de Janeiro. Disponível em: http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/8568/DMPPJ%20-%20MARGA%20TESSLER.pdf?sequence=1, Acesso em: 28 jul.2020). Nessa trilha, Gonçalves assevera que “as autoridades públicas terão de intervir para estabelecer os níveis de risco socialmente aceitáveis para uma dada classe de perigos, com base em procedimentos de pesquisa técnica e científica e de debates públicos” (GONÇALVES, Vasco Barroso. O princípio da precaução e a gestão dos riscos ambientais: contribuições e limitações dos modelos econômicos. Ambient. Soc., São Paulo, v.16, n.4, p.121-138, dez.2013. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-753X2013000400008&lng=en&nrm=iso, Acesso em: 16 jul.2020. BECK, Ulrich. Sociedade de risco : rumo a uma outra modernidade.2. ed. São Paulo: Editora 34, 2011.p.35-36. Nesse sentido, Dallari e Ventura : “Verifica-se, portanto, a necessidade de investimentos tanto na formação dos pesquisadores, que deverão dominar, também, as ciências sociais na teoria e na prática para serem capazes de comunicar à sociedade os resultados de seus experimentos, quanto na das pessoas em geral, que necessitam conhecer as bases do trabalho científico para poderem escolher o grau de risco ao qual consideram aceitável submeter-se em nome do progresso” (DALLARI, Sueli Gandolfi; VENTURA, Deisy de Freitas Lima. O princípio da precaução: dever do Estado ou protecionismo disfarçado? São Paulo Perspec., São Paulo, v.16, n.2, p.53-63, jun.2002. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-88392002000200007&lng=en&nrm=iso, Acesso em: 12 jul.2020). COMBA, Pietro; MARTUZZI, Marco; BOTTI, Caterina. The precautionary principle in decision-making: the ethical values. In : WORLD HEALTH ORGANIZATION EUROPE. The precautionary principle : protecting public health, the environment and the future of our children.2004. TICKNER, Joel A.; KRIEBEL, David; WRIGHT, Sara. A compass for health: rethinking precaution and its role in science and public health. International Journal of Epidemiology, v.32, p.489-492, Aug.2003. Disponível em: https://doi.org/10.1093/ije/dyg186, Acerca do dever de publicidade das informações consideradas pelo poder público na tomada de decisões, especialmente em questões ambientais: SARLET, Ingo Wolfgang; FENSTERSEIFER, Tiago. Direito constitucional ambiental : Constituição, direitos fundamentais e proteção ao ambiente.5. ed. Rio de Janeiro: Revista dos Tribunais, 2017. Nesse sentido: QUIGGIN, John. The precautionary principle and the theory of choice under uncertainty, Artigo apresentado na 48th Annual Conference of the Australian Agricultural and Resource Economics Society, Melbourne, 10-13 February 2004. Disponível em: https://pdfs.semanticscholar.org/2f08/760f16e7232d596c4f0d22cbb51096b17390.pdf, Acesso em: 16 jul.2020. Adotando esse mesmo entendimento acerca do princípio da precaução como norma de decisão: SCHETTLER, Ted; RAFFENSPERGER, Carolyn. Why is a precautionary approach needed? In : WORLD HEALTH ORGANIZATION EUROPE. The precautionary principle : protecting public health, the environment and the future of our children.2004. COMBA, Pietro; MARTUZZI, Marco; BOTTI, Caterina. The precautionary principle in decision-making: the ethical values. In : WORLD HEALTH ORGANIZATION EUROPE. The precautionary principle : protecting public health, the environment and the future of our children.2004. Quiggin vai além, entendendo que o princípio da precaução seria, inclusive, mais próximo de uma regra de distribuição do ônus da prova do que de um mecanismo de decisão (nesse sentido: QUIGGIN, John. The precautionary principle and the theory of choice under uncertainty, Artigo apresentado na 48th Annual Conference of the Australian Agricultural and Resource Economics Society, Melbourne, 10-13 February 2004. Disponível em: https://pdfs.semanticscholar.org/2f08/760f16e7232d596c4f0d22cbb51096b17390.pdf, Acesso em: 16 jul.2020. PEARCE, Neil. Public health and the precautionary principle. In : WORLD HEALTH ORGANIZATION EUROPE. The precautionary principle : protecting public health, the environment and the future of our children.2004. SCHETTLER, Ted; RAFFENSPERGER, Carolyn. Why is a precautionary approach needed? In : WORLD HEALTH ORGANIZATION EUROPE. The precautionary principle : protecting public health, the environment and the future of our children.2004. A relação indissociável entre meio ambiente e saúde humana é reconhecida pela própria Constituição Federal, que, em seu art.200, VIII, elenca como uma das atribuições do SUS a colaboração na proteção ao meio ambiente. A Lei nº 8.080/90 também tem diversas disposições relacionando a saúde à questão ambiental (art.3º; art.6º, § 1º; art.16, IV; art.17, V; art.18, VI, dentre outros). STF – ADPF 101, relator(a): Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, julgado em 24.06.2009, DJe-108, divulg.01.06.2012, public.04.06.2012, Ement. VOL-02654-01, PP-00001, RTJ VOL-00224-01, PP-00011. STF – ADI 3.937, relator(a): Marco Aurélio, relator(a) p/ acórdão: Dias Toffoli, Tribunal Pleno, julgado em 24.08.2017, acórdão eletrônico, DJe-019, divulg.31.01.2019, public.01.02.2019. STF – ADI 3.406, processo eletrônico, julg.29.11.2017, UF-RJ, Turma-TP, M. Rosa Weber, n. pág-176, DJe-019, divulg.31.01.2019, public.01.02.2019; e ADI 3.470, relator(a): Rosa Weber, Tribunal Pleno, julg.29.11.2017, processo eletrônico, DJe-019, divulg.31.01.2019, public.01.02.2019. ADI 5.592, relator(a): Cármen Lúcia, relator(a) p/ acórdão: Edson Fachin, Tribunal Pleno, julg.11.09.2019, processo eletrônico, DJe-051, divulg.09.03.2020, public.10.03.2020. STF – STP 393 MC/MG – Minas Gerais – Relator(a): Min. Presidente – Decisão proferida pelo(a): Min. Dias Toffoli – Julgamento: 22.06.2020 – Publicação: processo eletrônico, DJe-157, divulg.23.06.2020, public.24.06.2020. STF – ADPF 668 MC – Relator: Min. Roberto Barroso – Julgamento: 31.03.2020 – Publicação: 03.04.2020. STF – ADI 6.421 – Relator: Min. Roberto Barroso – Julgamento: 21.05.2020 – Acórdão ainda não publicado. MORO, Adriana; INVERNIZZI, Noela. A tragédia da talidomida: a luta pelos direitos das vítimas e por melhor regulação de medicamentos. História, Ciências, Saúde, Manguinhos (Rio de Janeiro), v.24, n.3, p.603-622, jul./set.2017. EMAGIS – ESCOLA DA MAGISTRATURA DO TRF DA 4ª REGIÃO FICHA TÉCNICA Diretor da Emagis Des. Federal Márcio Antônio Rocha Vice-Diretora da Emagis Desa. Federal Claudia Cristina Cristofani Conselho Consultivo da Emagis Des. Federal João Pedro Gebran Neto Des. Federal Leandro Paulsen Assessoria da Emagis Isabel Cristina Lima Selau Direção da Divisão de Publicações Arlete Hartmann Revisão e Formatação Marina Spadaro Jacques Patrícia Picon Divisão de Editoração e Artes Web Design Ricardo Lisboa Pegorini Apoio técnico Ulisses Rodrigues de Oliveira Pesquisa nas páginas da Emagis: Tribunal Regional Federal da 4ª Região Rua Otávio Francisco Caruso da Rocha, 300 CEP 90.010-395 | Porto Alegre | RS www.trf4.jus.br/emagis e-mail: [email protected] O projeto Direito Hoje, da Emagis, tem o objetivo de trazer mais dinamismo à divulgação da produção textual dos magistrados, com a publicação online de artigos que abordem questões emergentes no Direito nacional e internacional.
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O que é prevenção especial positiva e negativa?

A prevenção especial é direcionada a pessoa do condenado. Para a prevenção especial negativa o importante é intimidar o condenado para evitar a reincidência. A prevenção especial positiva preocupa-se com a ressocialização do condenado para que possa retornar ao convívio em sociedade.
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Como se dá a prevenção geral positiva para Jakobs?

Olá, pessoal! Hoje vamos comentar uma das questões do nosso curso intensivo para Delegado da Polícia Federal, redigida nestes termos: (EMAGIS) Para Roxin, a finalidade principal da pena é a prevenção geral, enquanto que Gunther Jakobs a finalidade da pena não é prevenção geral negativa de bens jurídicos ou a prevenção especial, mas a própria reafirmação da norma e tutela do ordenamento jurídico.

Gabarito: CERTO. Para a teoria dialética unificadora de Claus Roxin, a finalidade precípua do Direito Penal é a prevenção geral dos crimes, como forma de proteção subsidiária dos bens jurídicos, que se realiza em três momentos: cominação da pena, a individualização judicial e a respectiva execução. Prevenção geral porque fim da norma penal é essencialmente dissuadir as pessoas do cometimento de delitos e consequentemente atuarem conforme o direito; subsidiária, porque o direito penal somente deve ter lugar quando fracassem outras formas de prevenção e controle social.

Vale lembrar que para Roxin, por ocasião da individualização da pena, embora permaneça a função de prevenção geral, Roxin vê a prevenção especial como último fim da pena, no sentido de ressocializá-lo. (Paulo Queiroz, Direito Penal – Parte Geral – 4ª Ed., p.95).

Segundo a teoria da prevenção geral positiva de Gunther Jakobs, a norma penal constitui uma necessidade funcional/sistêmica de estabilização de expectativas sociais por meio da aplicação de penas ante as frustrações que decorrem da violação das normas. Para o professor alemão, o fundamento da pena não é a prevenção geral negativa para proteção de bens jurídicos, ou a prevenção especial, mas sim a manutenção da norma enquanto modelo de orientação de condutas para os contatos sociais.

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Quais são as classificações da função preventiva?

Resumo: O autor analisa as funções da pena no sistema penal brasileiro. Palavras chave : Teorias Absolutas, Teoria Relativa, Teoria Mista, A pena como prevenção da violência No decorrer da evolução da pena, surgiram teorias que buscaram explicar ou apenas entender a utilidade da pena diante dos comportamentos sociais de cada época e da organização do Estado, suas finalidades e características, e, acima de tudo, a figura do condenado como sujeito passivo da atuação dela, como se vê a seguir.

Num primeiro momento, a pena foi vista como um meio de retribuir ao condenado o mal por ele causado, em virtude da infração cometida. Posteriormente, o caráter preventivo da sanção penal foi enfatizado e, em determinado momento, surgiram as teorias mistas que buscavam conciliar as teorias absolutas e as relativas.

Luiz Flávio Gomes, sobre o papel desempenhado pela pena, expõe: “A pena ou qualquer outra resposta estatal ao delito, destarte, acaba assumindo um determinado papel. No modelo clássico, a pena (ou castigo) ou é vista com finalidade preventiva puramente dissuasória (que está presente, em maior ou menor intensidade, na teoria preventiva geral negativa ou positiva, assim como na teoria preventiva especial negativa).

Já no modelo oposto (Criminologia Moderna), à pena se assinala um papel muito mais dinâmico, que é o ressocializador, visando a não reincidência, seja pela via da intervenção excepcional no criminoso (tratamento com respeito aos direitos humanos), seja pelas vias alternativas à direta intervenção penal.

TEORIAS ABSOLUTAS OU RETRIBUTIVAS DA PENA Esta Teoria foi desenvolvida na Idade Média, uma época em que a teologia e a política eram estritamente ligadas pelo eixo do Direito Divino, no qual a identidade de soberano era confundida com o Estado, já que concedidos por Deus.

Neste período, era imposto um castigo às condutas imorais ou a algum pecado cometido, que afrontasse a Igreja ou o Estado na figura do soberano; a este castigo foi dado o termo poena, que em latim significa castigo, expiação ou suplício. Com o avanço da sociedade e o nascimento do Mercantilismo, o Estado Absolutista começa a se desgastar e, junto com ele, a idéia vinculada de Deus-Soberano-Estado, surgindo o Estado Burguês com novas idéias de governo com a participação do povo e distinção dos poderes.

O castigo, neste período, passa a ser a retribuição a uma ordem jurídica interrompida; e a lei humana passa a substituir a lei de Deus. Sendo o Estado uma expressão do querer do povo, ele passa a organizar a ordem político-jurídica como um ‘contrato social’, onde o indivíduo se vê obrigado a manter o consenso coletivo e sujeito a um castigo que fosse capaz de retribuir o mal cometido à sociedade, caso descumprida esta obrigação.

  1. Explica Cezar Roberto Bittencourt que, “segundo este esquema retribucionista, é atribuída à pena, exclusivamente, a difícil incumbência de realizar Justiça.
  2. A pena tem como fim fazer justiça, nada mais”.
  3. Deste modo, a pena seria a imposição de um mal necessário diante de seus atos negativos que prejudicavam a sociedade e a integridade do Estado.

Neste caráter retributivo, Gilberto Ferreira esclarece que “a pena é justa em si e sua aplicação se dá sem qualquer preocupação quanto a sua utilidade. Ocorrendo o crime, ocorrerá a pena, inexoravelmente. O importante é retribuir com o mal, o mal praticado”.

  1. A pena justificar-se-ia não pela finalidade a que se presta, mas sim pela realização de um ideal de justiça.
  2. Antônio Henrique Graciano Suxberger sobre o tema afirma: “A pena consubstancia retribuição da culpabilidade do sujeito, considerada a culpabilidade como decorrente da idéia kantiana de livre arbítrio.

Esse é seu único fundamento e, com amparo nesse argumento, é que se diz que, se o Estado não mais se ocupasse em retribuir, materializar numa pena a censurabilidade social de uma conduta, o próprio povo que o justifica também se tornaria cúmplice ou conivente com tal prática e a censura também sobre o povo recairia.” Maria Lúcia Karam, afirma que “as teorias absolutas surgiram sustentando que a pena encontra sua justificação em si mesma, baseando-se na idéia de retribuição, do castigo, da compensação do mal, representado pela infração, com o mal, representado pelo sofrimento da pena”,

  • Os principais defensores desta idéia foram Immanuel Kant e G.F.
  • Hegel, segundo os quais, tal teoria carregava em seus moldes uma influência filosófica de base ética e moral.
  • Assim, cabia ao soberano punir rigorosamente os transgressores das ordens jurídicas impostas a sociedade, pois a lei era um imperativo categórico que descrevia uma ação ou omissão ao indivíduo, como um mandamento, para buscar o bem e a satisfação da coletividade em geral e o seu não cumprimento tem como conseqüência a imposição de uma sanção capaz de retribuir o mal feito.

Não bastava a legalidade das ações; era necessário, ainda, que o respeito à lei geral ou universal de moralidade fosse o motivo concreto impulsionador da vontade. A pena nunca poderia ter uma finalidade voltada ao social, pois não seria ético tê-la, uma vez que o homem não é objeto passível de instrumentalização visto que ele “nunca deve ser analisado como meio, mas sim como um fim para si mesmo”, logo a pena só é aplicada pela infringência da lei visando realizar Justiça.

Sobre esta teoria, Gilberto Ferreira, resumidamente, diz que: “Para se ter uma idéia do que pregam os integrantes destas teorias basta tomar por base a hipótese de Kant, para quem se a sociedade se dissolvesse, ainda assim o último assassino deveria ser punido a fim de pagar pelo mal cometido.” Kant, em suas teses de definições da pena, sempre valorou a importância da espécie e medida da pena, explicando que cada um tem o castigo segundo a conduta ilegal que cometeu e na medida do mau que causou à coletividade.

Vale dizer, ainda que a sociedade fosse dissolvida, era preciso executar o último assassino, para que cada um sofresse as conseqüências dos seus atos. Na mesma linha, Hegel afirmava que o delito caracteriza a desordem e o desrespeito a vontade geral da sociedade que simboliza a ordem jurídica do Estado.

Assim, a pena vem para retribuir a má conduta do agente e para confirmar o querer geral, sendo estabelecida conforme a espécie do delito e na medida do mal causado à coletividade. Antônio Henrique Graciano Suxberger, explicando o pensamento de Hegel, afirma: “O crime, pois, seria aniquilado, negado, expiado pelo sofrimento da pena que, desse modo, restabeleceria o direito lesado.

A pena substanciaria a negação da negação do direito, segundo a referida fórmula clássica de Hegel, razão pela qual cumpriria um papel restaurador ou retributivo. Quanto mais intensa a negação do direito, mais intensa será a pena, sendo certo que, para essa abordagem, nenhum outro fator influi em sua mensuração.” O delito representaria a vontade irracional e particular do agente, uma vez que o Direito é composto da vontade racional e geral da sociedade, sendo aquela uma contradição a esta, exigindo-se desta forma uma punição compensatória, um castigo que restabelecesse a ordem jurídica afetada ou desrespeitada.

Na opinião de Hegel, em sua obra Filosofía del Derecho : “Somente através da aplicação da pena trata-se o delinqüente como um ser ‘racional’ e ‘livre’. Só assim ele será honrado dando-lhe não apenas algo justo em si, mas lhe dando o seu Direito : contrariamente ao inadmissível modo de proceder dos que defendem princípios preventivos, segundo os quais se ameaça o homem como quando se mostra um pau a um cachorro, e o homem, por sua honra e liberdade, não deve ser tratado como um cachorro”.

Assim, as teorias retribucionistas consideravam tão-somente a expressão retribucionista da pena. Vale dizer, a pena traduzia um mal que recai sobre um sujeito que cometeu um mal do ponto de vista do direito. Essa concepção de pena estava ligada, sem quaisquer dúvidas, a uma visão de Estado guardião e não a um Estado intervencionista.

Embora Kant e Hegel tenham sido os principais defensores desta teoria absolutista da pena, é preciso destacar também Francesco Carrara, Edmund Mezger, Hans Welzel, H.H. Jescheck entre outros que seguiram a mesma linha. A grande crítica formulada à teoria absoluta, defendida por Kant e Hegel, assenta na idéia de que a pena, para esta teoria, é apenas uma punição, servindo para retribuir o delito do delinqüente com um castigo; pagar o mal feito pelo “mal” (a pena), o que não mostra nenhuma utilidade à sociedade.

Tal teoria, ao invés de justificar a pena, pressupõe a sua necessidade. Maria Lúcia Karam, demonstrando os equívocos das teorias absolutas, expõe que: “A privação da liberdade, o isolamento, a separação, a distância do meio familiar e social, a perda de contato com as experiências da vida normal de um ser humano, tudo isto constitui um sofrimento considerável.

Mas, a este sofrimento logo se somam as dores físicas: a privação de ar, de sol, de espaço, os alojamentos superpovoados e promíscuos, as condições sanitárias precárias e humilhantes, a falta de higiene, a alimentação muitas vezes deteriorada, a violência das torturas, dos espancamentos e enclausuramentos em “celas de castigo”, das agressões, atentados sexuais, homicídios brutais”,

Assim, a visão de retribuição trazida pela teoria absoluta, sob o ponto de vista clássico, é inapta à ressocializar o condenado, mesmo porque, para os defensores desta teoria, o indivíduo era visto como mero instrumento. Luiz Regis Prado aponta, com peculiar maestria, que a visão acerca de retribuição, veiculada pela teoria absoluta, nos dias atuais, já não encontra terreno fértil, isto porque: “Na atualidade, a idéia de retribuição jurídica significa que a pena deve ser proporcional ao injusto culpável, de acordo com o princípio de justiça distributiva.

Logo, essa concepção moderna não corresponde a um sentimento de vingança social, mas antes equivale a um princípio limitativo, segundo o qual o delito perpetrado deve operar como fundamento e limite da pena, que deve ser proporcional à magnitude do injusto e da culpabilidade” TEORIA RELATIVA OU PREVENTIVA DA PENA Em outro extremo, as teorias relativas fundamentavam a pena na necessidade de evitar a prática de delitos.

Assim, a pena era vista como instrumento apto à prevenção de possíveis delitos, tinha, pois, um nítido caráter utilitário de prevenção. Gamil Föppel El Hireche, em obra indispensável à análise do tema, aduz que: “Superadas as teorias absolutas, compete, agora, fazer o estudo das chamadas teorias relativas, que buscam uma finalidade para a pena, razão pela qual esta deixa de ser um fim em si mesma, passando a ser vista como algo instrumental: passa a ser um meio de combate à ocorrência e reincidência de crimes, É notadamente uma perspectiva utilitarista.” A teoria relativa ou preventiva não trata a pena como forma de retribuir ao delinqüente o mal por ele praticado contra a sociedade, mas atribui à pena um caráter preventivo à prática do delito.

  • A tese preventiva tem por base a função de inibir o máximo possível a realização de novos atos ilícitos.
  • A punição era encarada como meio de segurança e defesa da sociedade.
  • Deste modo, a pena seria aplicada para impor o medo.
  • Todavia, muitas vezes, tal medo era incapaz de coagir a prática do delito, já que o condenado agia com confiança de que não seria descoberto.

Esta teoria pode ser dividida em preventiva geral, a qual tem por característica a intimidação da sociedade para a não prática do ilícito, e preventiva especial, que possui como objeto o próprio delinqüente. Prevenção Geral Na Preventiva Geral a pena tem o caráter ameaçador, pois, segundo Cezar Roberto Bittencourt, “com a ameaça de pena, avisando os membros da sociedade quais as ações injustas contra as quais se reagirá; e, por outro lado, com a aplicação da pena cominada, deixa-se patente a disposição de cumprir a ameaça realizada”.

A pena é tratada como uma coação psicológica, pois é forma de ameaça aos cidadãos que se recusam a observar e obedecer as ordens jurídicas da sociedade, motivando os indivíduos à não prática de novos delitos. Antônio Henrique Graciano Suxberger, sobre o tema afirma: “A teoria da prevenção geral ou cai na utilização do medo como forma de controle social, com o qual se chega num Estado de terror e na transformação dos indivíduos em animais, ou na suposição de uma racionalidade absoluta do homem no juízo de ponderação entre as condutas que poderá eleger, na sua capacidade de motivação, tão ficcional como a idéia de livre arbítrio, ou, por último, cai na teoria do bem social ou da utilidade pública, que tão-somente acoberta os interesses em jogo: uma determinada socialização das contradições e dos conflitos de uma democracia imperfeita”.

Demonstram-se assim duas bases fundamentais da Prevenção Geral, sendo elas a coação, por intermédio do medo, gerando a intimidação da lei face o indivíduo; e o raciocínio ponderado do homem face à lei e à conduta adequada perante a ordem jurídica da sociedade.

Diante disto, esta teoria geral é subdividida em negativa, que busca a intimidação daqueles que não praticaram a conduta ilícita, para que estes não se sintam motivados ou instigados à prática do crime e também em positiva, na qual a pena nada mais é do que um novo meio de se produzir novos valores morais e éticos diante da sociedade e do indivíduo que não praticou a conduta ilegal.

Prevenção Geral Negativa O caráter negativo da prevenção geral foi, historicamente, o primeiro a ser conhecido. Consiste na intimidação genérica da coletividade por meio da ameaça de aplicação de sanções contida nas normas incriminadoras. A intimidação começa no momento da cominação das sanções penais e é reforçada com a aplicação e a execução das mesmas.

  1. A efetividade da prevenção geral, sob o aspecto da intimidação da coletividade, decorre da eficácia do funcionamento do sistema penal em seu conjunto: a aplicação e a execução das penas tornam mais visível a ameaça penal, certificando-a.
  2. Nesta teoria geral negativa, Eugênio Rául Zaffaroni e Nilo Batista explicam que “a criminalização assumiria uma função utilitária, livre de toda consideração ética e, por conseguinte, sua medida deveria ser a necessária para intimidar aqueles que possam sentir tentação de cometer delitos”.

Há de se mencionar, no entanto, que em algumas formas criminosas de condutas, tal forma de inibir a delinqüência é praticamente inexistente, seja em razão de agentes não vulneráveis, seja em razão de alguns não levarem em conta a pena e suas conseqüências, seja porque recebem quantias significativas de dinheiro para a prática de delitos, seja, ainda, pela conduta ilícita não proporcionar reflexão quanto as conseqüências penais ou quando o agente criminoso pratica sua conduta ilegal motivado por situações ou circunstâncias semi-imputáveis.

Contribuindo para cristalizar esta teoria, Eugênio Rául Zaffaroni e Nilo Batista esclarecem que: “O êxito da teoria advém de sua pretensa comprovação por introspecção não poder afirmar, a partir de seu status social e ético, se o efeito dissuasivo está na pena ou na estigmatização social devida ao fato em si.

Isso se deve a que tal discurso parte da ilusão de um pan-penalismo jurídico e ético, que confunde o efeito do direito em geral e de toda a ética social com o do poder punitivo : em suma, tal discurso identifica o poder punitivo com a totalidade da cultura.

A imensa maioria das pessoas evita as condutas aberrantes e lesivas por uma enorme e diversificada quantidade de motivações éticas, jurídicas e afetivas que nada têm a ver com o temor à criminalização secundária. No plano político e teórico essa teoria permite legitimar a imposição de penas sempre mais grave, por que não se consegue nunca a dissuasão total, como demonstra a circunstância de que os crimes continuam sendo praticados.

Assim, o destino final desse caminho é a pena de morte para todos os delitos, mas não por que com ela obtenha a dissuasão, mas sim por que esgota o catálogo de males crescentes com os quais se pode ameaçar uma pessoa”. Assim, nesta vertente doutrinária, a pena se impõe pelo medo, ou seja, ela deve ter a capacidade de atemorizar as pessoas da sociedade, independente do sofrimento da pessoa que a suporta, para que aquele delito não seja praticado novamente.

Portanto, as penas teriam de ser proporcionais aos fatos pelos quais são impostos, devendo ser mais rígidas a medida que os crimes prescritos por elas fossem praticados. Não haveria qualquer ligação entre a pena e os delitos praticados, porque a medida dela seria dependente de fatos externos, por exemplo, nos crimes contra o patrimônio, a pena deveria aumentar, pois tais delitos tendem também a aumentar, ficando a sociedade mais frágil e vulnerável e a perda de bens ou coisas de valores seria algo irreversível e de difícil reposição.

Esta espécie de intimidação pressupõe a necessidade da utilização de uma pessoa como meio de realização do Estado, para concretização de seus serviços e funções perante a sociedade. Ainda sobre o assunto, Zaffaroni e Batista destacam que, “dar por demonstrado que o ser humano empreende um frio cálculo de rentabilidade perante cada impulso infracional é arrimar-se numa ficção.

  • Mesmo um discurso penal legitimante não pode fundar-se numa óbvia falsidade, e o uso desse argumento equivale a uma confissão de que não existe base válida para ocultar a natureza policial do poder punitivo”.
  • Vê-se, portanto, que, se tal caráter retributivo não cumpre sua intimidação na sociedade, a pena também não cumprirá esta função.

Para que se realize tal função, é indispensável diferençar as pessoas da sociedade que se intimidam com a pena e os delinqüentes que exigem uma forma especial de prevenção, devendo esta ser ilimitada; criando, dessa forma, penas limitadas à sociedade e penas ilimitadas aos delinqüentes, o que formaria um sistema pluralista.

Analisando o contexto social do agente criminoso, é possível descobrir se seu grau de culpabilidade é menor, pois sua origem está ligada a uma sociedade ‘acultural’, desprovida economicamente e com baixo nível de escolaridade, o que diminui seu espaço, enquanto cidadão, dentro da sociedade, sendo marcado e corrompido pela criminalidade, que o reduz mais ainda.

O sentido de intimidação do delito perde sua característica de lesão jurídica para transformar-se em um começo de contradição com a cultura que o estado quer tornar única entre todos os membros da coletividade, ou com a moral que se procura estabelecer.

Demonstra-se, desta forma, segundo os dizeres de Zaffaroni e Batista, “seu caráter verticalista, hierarquizante, homogeneizador, corporativo e, por conseguinte, contrário ao pluralismo próprio do estado de direito e à ética baseada no respeito pelo ser humano como pessoa”. Prevenção Geral Positiva O aspecto positivo da prevenção geral relaciona-se com a manutenção da fidelidade jurídica dos cidadãos e opera de diversas formas.

A primeira consiste no estabelecimento de diretrizes de conduta para a sociedade, através da demonstração do especial valor de determinados bens jurídicos, que se faz por meio da criação dos tipos penais, da cominação das penas correspondentes e do estabelecimento dos critérios de persecução penal.

  1. A segunda forma pela qual opera a prevenção geral positiva decorre da confiança que surge na sociedade a partir da constatação de que o Direito efetivamente se aplica.
  2. E, ao final, a prevenção geral positiva opera também através do efeito de pacificação que se produz quando, em virtude da aplicação e execução da sanção penal, a consciência jurídica da sociedade se tranqüiliza e considera solucionado o conflito com o autor da infração.

A Teoria da Prevenção Geral Positiva busca, pois, gerar efeitos sobre os indivíduos não-criminalizados da sociedade, não intimidando-os para se omitirem da prática do ilícito, mas para produzir um acordo para reafirmar a confiança no sistema coletivo, impondo um mal ao agente delinqüente.

Demonstra desta forma que a pena é maior que o incômodo produzido, como reflexo do fato ilícito, que é o único que importa, exprimindo-se na desconformidade da vigência da norma, indispensável para uma coletividade existir. Acerca do tema Zaffaroni e Batista registram a seguinte posição: “A partir da realidade social, essa teoria se sustenta em mais dados reais que a anterior.

Segundo ela, uma pessoa seria criminalizada porque com isso a opinião pública é normalizada ou renormalizada, dado ser importante o consenso que sustenta o sistema social. Como os crimes de “Colarinho Branco” não alteram o consenso enquanto não forem percebidos como conflitos delituosos, sua criminalização não teria sentido.

Na prática, tratar-se-ia de uma ilusão que se mantém porque a opinião pública a sustenta, e convém continuar sustentando-a e reforçando-a porque com ela o sistema penal se mantém: ou seja, o poder a alimenta para ser por ela alimentado.” Em síntese, essa tese se desenvolve pela intimidação causada pela aprovação dos que acreditam que somente serão punidos os que delinqüem.

A pena, para esta concepção, deveria possuir uma medida capaz de reestruturar o sistema, formando uma concordância geral da sociedade, que depende da sua crença na pena e nas suas conseqüências severas, para estabelecer seu equilíbrio, independente do delinqüente ou de seu delito.

Sobre o assunto, aduz Zaffaroni e Batista: “A diante do imenso poder de vigilância (e corrupção) que as agências que o exercem acumulam, a defesa dos valores éticos fundamentais não pode ser levada a cabo mediante a legitimação desse poder, mas precisamente através de sua contenção e limitação ; aliás, a respeito de tal versão é válido, também, o que se disse acerca do pretenso valor simbólico: os valores éticos não se fortalecem, mas se fomenta a certeza de que aqueles que são invulneráveis continuaram assim; tal versão pressupõe algo que é falso: nem todo delito afeta valores éticos-sociais básicos, nas complexas sociedades modernas não há um único sistema de valores e, além do mais, a posição contrária está consagrando o estado como gerador de valores éticos, o que implica uma ditadura ética.” A busca incessante por uma melhor teoria que satisfizesse o interesse jurídico e que fosse capaz de solucionar os conflitos jurídico-sociológicos, produziram a divisão da teoria da prevenção geral positiva em Limitadora e Fundamentadora.

Na Prevenção Geral Positiva Fundamentadora o Direito Penal possui uma finalidade mais importante que resguardar os bens jurídicos, qual seja, garantir os valores éticos-sociais de uma coletividade através de previsões legais e sanções a condutas que impliquem o desrespeito a valores fundamentais.

  1. Entretanto, nos ensinamentos de Bitencourt, esta vertente da teoria geral positiva: “Não constitui uma alternativa real que satisfaça as atuais necessidades da teoria da pena.
  2. É criticável também sua pretensão de impor ao indivíduo, de forma coativa, determinados padrões éticos, algo inconcebível em um Estado social e democrático de Direito.

É igualmente questionável a eliminação dos limites do ius puniendi, tanto formal como materialmente, fato que conduz à legitimação e desenvolvimento de uma política criminal carente de legitimidade democrática.” Na Prevenção Geral Positiva Limitadora, o Direito Penal é visto como mais um instrumento para controle, organização e ordem da coletividade, sendo diferenciado dos demais por seu caráter formal.

O poder de punir, exercido pelo Direito Penal e pelo Estado, está subordinado a alguns requisitos limítrofes, aos quais as demais formas de punir não se vinculam. Tal punição deve obedecer certos procedimentos legais, jurídicos, constitucionais e até administrativos, respeitando princípios e fundamentos importantes e essenciais para a sua validade e eficiência, tais como o princípio da proporcionalidade.

Sobre esta vertente da teoria da prevenção geral positiva, Cezar Roberto Bitencourt afirma que: “A formalização do Direito Penal tem lugar através da vinculação com as normas e objetiva limitar a intervenção jurídico-penal do Estado em atenção aos direitos individuais do cidadão.

O Estado não pode – a não ser que se trate de um Estado totalitário – invadir a esfera dos direitos individuais do cidadão, ainda e quando haja praticado algum delito. Ao contrário, os limites em que o Estado deve atuar punitivamente deve ser uma realidade concreta. Esses limites referidos materializam-se através dos princípios da intervenção mínima, da proporcionalidade, da ressocialização, da culpabilidade etc.

A principal finalidade, pois, a que deve dirigir-se a pena é a prevenção geral – em seus sentidos intimidatórios e limitadores –, sem deixar de lado as necessidades de prevenção especial, no tocante à ressocialização do delinqüente. Entende-se que o conteúdo da ressocialização não será o tradicionalmente concebido, isto é, com a imposição de forma coativa (arbitrária).

  1. A ressocialização do delinqüente implica um processo comunicacional e interativo entre indivíduo e sociedade.
  2. Não se pode ressocializar o delinqüente sem colocar em dúvida, ao mesmo tempo, o conjunto social normativo ao qual se pretende integrá-lo.
  3. Caso contrário, estaríamos admitindo, equivocadamente, que a ordem social é perfeita, o que, no mínimo, é discutível.” Assim, tal como a prevenção negativa, também a prevenção positiva se realiza através da cominação, aplicação e execução das sanções penais, dependendo sua efetividade do funcionamento eficaz do sistema penal em seu conjunto e, além disso, da medida em que os tipos penais retratem os valores mais importantes na sociedade e cuja defesa, aos olhos da sociedade, necessite da intervenção penal.

Quando os parâmetros definidos para a incriminação afastam-se dos valores que, aos olhos da maioria do corpo social, justificariam a tutela penal, não apenas o efeito de prevenção positiva, em todas as suas formas, se enfraquece, como também a democracia se debilita.

Há que se ressaltar, por fim, que, muitas vezes, a distinção da prevenção geral em positiva e negativa parece artificial. A forma mais fácil de fazer uma distinção segura entre um e outro aspecto talvez seja aludir ao fato de que a prevenção geral negativa atua principalmente sobre aqueles membros da comunidade que, seja lá por quais motivos for, apresentam uma especial propensão ao cometimento de delitos (no sentido de cogitarem, freqüentemente, perpetrar delitos); enquanto que a prevenção positiva refere-se principalmente àqueles que, não apresentando propensão especial à prática de fatos delituosos, não se impressionam propriamente com a ameaça penal, pois não a percebem subjetivamente como a eles dirigida, mas se tranqüilizam e se sentem seguros com a percepção de que o sistema penal está operando satisfatoriamente, ou seja, está protegendo com eficiência os valores escolhidos pela coletividade para gozarem de tutela penal.

Prevenção Especial: No que se refere à Prevenção Especial, esta é direcionada ao próprio indivíduo, na busca de um convencimento subjetivo para que o mesmo não volte à prática do ilícito, medindo-se a pena por meios preventivos especiais, os quais visam ressocializar e reeducar o infrator da ordem jurídica intimidando os demais integrantes da coletividade a não praticar o ilícito, demonstrando as conseqüências e sanções legais pela prática.

  • Nos ensinamentos de Cezar Roberto Bitencourt sobre esta visão, “a pena deveria concretizar-se em outro sentido: o da defesa da nova ordem, a defesa da sociedade.
  • O delito não é apenas a violação à ordem jurídica, mas, antes de tudo, um dano social; e o delinqüente é um perigo social (um anormal) que põe em risco a nova ordem”.

Para Gilberto Ferreira: “Esta teoria se baseia nas Teorias do Melhoramento e da Emenda; e do Ressarcimento, onde na primeira a principal finalidade é impedir a pratica de novos delitos, e esta finalidade só seria atingida através do melhoramento do agente do ilícito, o qual não voltaria a prática do delito; já na segunda a pena serviria para castigar o indivíduo marginalizado e, conseqüentemente o ressarcimento dos danos e prejuízos causados por sua conduta ilegal”,

  • Antônio Henrique Graciano Suxberger sobre o tema afirma: “Os defensores da abordagem preventivo-especial preferem a idéia de “medidas”, em lugar de penas.
  • A pena pressupõe a liberdade ou a capacidade racional do delinqüente, de modo a considerar um critério de igualdade geral; já a medida, ao contrário, parte da idéia de que o criminoso é um sujeito perigoso, diferente do normal, e que há de ser tratado consoante suas peculiares características perigosas.

O castigo e a intimidação perdem, assim, sentido, porquanto a incidência da sanção penal volta-se a corrigir ou reabilitar o delinqüente, sempre que seja possível, ou então a afastá-lo para torná-lo inofensivo.” Deste modo, a prevenção especial refere-se à atuação sobre o indivíduo que já delinqüiu, a fim de que ele não volte a delinqüir, e teoricamente opera três diferentes formas: através da intimidação pessoal do condenado, da sua neutralização, decorrente da segregação compulsória e, afinal, da sua ressocialização ou reintegração social.

A intimidação pessoal do condenado relaciona-se com a aplicação e execução das diversas penas, inclusive as não privativas de liberdade. A neutralização do condenado refere-se apenas à execução das sanções penais privativas de liberdade (e, no caso dos países que adotam a pena de morte, também à execução dessa pena).

Consiste em impedir fisicamente o condenado à pena privativa de liberdade de voltar a delinqüir, em virtude do seu encarceramento. Assegura-se, assim, a sociedade contra novas violações do ordenamento jurídico por parte do recluso. É claro, contudo, que essa neutralização somente opera com eficácia relativamente à comunidade extra-muros e durante o período de tempo em que atua a segregação compulsória do indivíduo.

A função de reintegração social refere-se à aplicação e execução das penas restritivas de direitos e privativas de liberdade e consiste, basicamente, no efeito que se deseja obter, através da intervenção estatal, no sentido de criar estímulos, no condenado, para que ele não volte a delinqüir após o cumprimento da pena imposta.

A função de reintegração social ou ressocialização, como hoje é atribuída à pena privativa de liberdade, incorporou-se gradativamente à pena principalmente como decorrência das pregações do Positivismo Criminológico, que, retomando a idéia da pena com caráter utilitário, como instrumento de defesa social, acentuada à época do Iluminismo, condenava a concepção retributiva ou absoluta da pena, enfatizando que a ressocialização dos criminosos deveria ser o objetivo essencial da execução penal.

Esta teoria também pode ser divida em Prevenção Especial Positiva e Prevenção Especial Negativa. Prevenção Especial Positiva A prevenção especial positiva tem por objetivo buscar o melhoramento do infrator, pois está provado que a criminalidade desvirtua o seu agente, tornando-o cada vez mais dependente do delito.

O discurso desta vertente parte da premissa que a pena é benéfica àquele que se submete a ela. Deste modo, o delito seria um sintoma de inferioridade apto à demonstrar ao Estado a necessidade de aplicar o remédio social da pena. Todavia, os adeptos de tal pensamento, parecem esquecer que a criminalidade não tem feito isto sozinha, já que cada vez mais o sistema prisional, ou carcerário, tem participado desse processo de desvirtuamento do delinqüente, construindo um quadro irreversível.

  1. É inadmissível acreditar na possibilidade de melhorar o agente do delito com a imposição de penas ou castigos aliados a um meio, que ao invés de recuperá-lo, ajuda a denegri-lo.
  2. Prevenção Especial Negativa Esta vertente, por seu turno, também analisa o indivíduo como agente do ilícito, porém não busca melhorá-lo, com a reeducação ou ressocialização, mas sim castigá-lo com a imposição de uma pena severa, que, concomitantemente, age como solução e como busca pela satisfação social, com a finalidade de neutralizar as conseqüências da inferioridade do delinqüente.

Na verdade, esta teoria não tem atuação exclusiva, pois ela se manifesta em conformidade com a Teoria Especial Positiva, uma vez que esta não consegue atingir sua finalidade de ressocialização, aquela assume o papel de buscar a eliminação e o controle sobre o agente do ilícito e a conduta deste.

Já que as idéias de recuperar e reintegrar o delinqüente à sociedade têm fracassado ultimamente, como as demais intenções de melhorá-lo, esse controle não passa de um castigo imposto de forma arbitral pelo Estado legítimo. Esta tendência acredita que há êxito em sua essência ideológica, pois o controle seria satisfeito à medida que o castigo e a penalização produzissem limitações físicas ao agente do delito, causando-lhe impossibilidade de praticar crimes posteriores.

Tratando sobre este assunto Zaffaroni e Batista expõe que: “Ao nível teórico, a idéia de uma sanção jurídica é incompatível com a criação de um mero obstáculo mecânico ou físico, porque este não motiva o comportamento, mas apenas o impede, o que fere o conceito de pessoa (art.1.º da Declaração Universal dos Direitos Humanos e art.1.º da Convenção Americana dos Direitos Humanos), cuja autonomia ética lhe permite orientar-se conforme o sentido.

  1. Por isso, a mera neutralização física está fora do conceito de direito, pelo menos em nosso atual horizonte cultural.
  2. Como no discurso anterior – do qual é complemento originário – o importante é o corpo social, ou seja, o correspondente a uma visão corporativa e organicista da sociedade, que é o verdadeiro objeto de atenção, pois as pessoas não passam de meras células que, quando defeituosas ou incorrigíveis, devem ser eliminadas.

A característica do poder punitivo dentro desta corrente é sua redução à coerção direta administrativa: não há diferença entre esta e a pena, pois as duas procuram neutralizar um perigo atual,” Esta teoria da função da pena tem sofrido severas críticas, pois há quem afirme que tal forma de prevenção não é tão eficaz diante do agente que não precisa ser ressocializado ou ter sua personalidade restabelecida para o bom convívio em sociedade.

Claus Roxin, discorrendo acerca dos equívocos da teoria da prevenção especial aduz: “A teoria da prevenção especial não é idônea para fundamentar o direito penal, porque não pode delimitar os seus pressupostos e conseqüências, porque não explica a punibilidade de crimes sem perigo de repetição e porque a idéia de adaptação social coativa, mediante a pena, não se legitima por si própria, necessitando de uma legitimação jurídica que se baseia noutro tipo de considerações.” TEORIA MISTA DA PENA Esta teoria busca a unificação dos pontos mais importantes e fundamentais das teorias anteriormente expostas, porque qualquer uma destas, atuando em sentido próprio, são insuficientes para atingir e solucionar os problemas sociais, garantindo a proteção e os direitos dos cidadãos.

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Na lição precisa de Gamil Föppel El Hireche sobre as teorias mistas, “não obstante novas idéias que se propunham mistas ou ecléticas, estas representaram, como ordinariamente ocorre com as teorias desta natureza, um acúmulo não só de acertos como ordinariamente de erros”.

  1. Para tal teoria a prevenção é tratada como fim do Direito Penal, no qual o papel atuante da retribuição é apenas de limitar a aplicação daquela.
  2. Nesta visão teórica, Gilberto Ferreira defende que, “a pena tem duas razões: a retribuição, manifestada através do castigo; e a prevenção, como instrumento de defesa da sociedade”, e ela deve ser baseada simples e unicamente no delito e nada mais.

Proposta por Claus Roxin, a teoria dialética buscou, claramente, sintetizar as teorias anteriores, enfatizando os acertos verificados e buscando fugir dos erros encontrados nas outras teorias. A teoria unificadora de Claus Roxin vê o sentido da pena não apenas na compensação da culpa do delinqüente, mas também no sentido geral de fazer prevalecer a ordem jurídica e também determinados fins político-criminais, com o fim de prevenir futuros crimes.

  • Para esta teoria, o direito penal devia ser analisado sob o ponto de vista dos princípios constitucionais, notadamente aquele princípio constitucional considerado o norteador de toda e qualquer atuação num Estado democrático de direito, qual seja, o princípio da dignidade da pessoa humana.
  • Segundo Claus Roxin: “No Estado moderno, junto a esta proteção de bens jurídicos previamente dados, surge a necessidade de assegurar, se necessário, através dos meios do direito penal, o cumprimento das prestações de caráter público de que depende o indivíduo no quadro da assistência social por parte do Estado.

Com esta dupla função, o direito penal realiza uma das mais importantes das numerosas tarefas do Estado, na medida em que apenas a proteção dos bens jurídicos constitutivos da sociedade e a garantia das prestações públicas necessárias para a assistência possibilitam ao cidadão o livre desenvolvimento da sua personalidade, que a nossa Constituição considera como pressuposto digno.” Claus Roxin, assim, defende o caráter subsidiário do direito penal, o qual poderá incidir como medida última.

  1. Partindo de uma síntese dialética, ele admite que a aplicação da pena esteja inserida na idéia de prevenção geral e prevenção especial.
  2. A prevenção geral, seja positiva ou negativa, sempre com a devida observância das garantias da dignidade humana e o respeito aos ditames constitucionais e a prevenção especial limitada pela culpabilidade do infrator.

Claus Roxin, ainda sobre o tema, afirma: ” Não é lícito ressocializar com a ajuda de sanções jurídico-penais que não são culpadas das agressões insuportáveis contra a ordem dos bens jurídicos, por mais degeneradas e inadaptadas que sejam essas pessoas.

Caso este ponto de vista seja ignorado, estaremos sob a ameaça do perigo de uma associação coletivista que oprime o livre desenvolvimento da personalidade. As conseqüências da garantia constitucional da autonomia da pessoa devem, pois, respeitar-se igualmente na execução da pena. É proibindo um tratamento coativo que interfira com a estrutura da personalidade, mesmo que possua eficácia ressocializante.

Se quiséssemos consagrar numa só frase o sentido e limites do direito penal, poderíamos caracterizar a sua missão como proteção subsidiária de bens jurídicos e prestações de serviços estatais, mediante prevenção geral e especial, que, salvaguarda a personalidade no quadro traçado pela medida da culpa individual.

” A teoria dialética unificadora, deste modo, sustenta a existência de um processo dialético, em que o momento de retribuição não aparece de modo abstrato, para cumprir um ideal absoluto de Justiça, mas limitando e condicionando à realidade imposta pelos momentos de prevenção geral e especial. Tal teoria busca evitar os exageros unilaterais e dirigir os diversos fins da pena para vias socialmente construtivas, de modo a obter o equilíbrio de todos os princípios mediante restrições recíprocas.

Valendo-se, claramente, de uma concepção de Estado que reúne os princípios do Estado social e do Estado liberal. A teoria proposta por Claus Roxin sofreu inúmeras críticas, isto porque o critério desenvolvido por ele, para alguns, poderia ceder à arbitrariedade, o que somente seria impedido pelo condicionamento que lhe impõem outros momentos e porque a pena não pode superar a gravidade do fato e o grau de censurabilidade que recai sobre o delinqüente.

A abordagem de Roxin é essencialmente preventiva, uma vez que o momento retributivo resta totalmente esvaziado de seu conteúdo clássico e somente se evidencia como manifestação de Justiça no sentido de limite imposto pela culpabilidade e pela prevenção, dentro desta, com preponderância à idéia de ressocialização.

A PENA COMO PREVENÇÃO DA VIOLÊNCIA Fundando no Direito Penal Mínimo, esta função defende que a penalização ou o castigo seria necessário somente em situações de grave ameaça ou de altos riscos que possam atingir e afetar os interesses da coletividade.

Então se associaria o poder punitivo ao mais vulnerável, seja como vítima, por ocasião do delito, seja como autor, pelo motivo da pena. Isso demonstra um duplo caráter estatal de garantia a segurança social, um como potencialidade e legitimidade para punir; outro como protetor dos interesses da coletividade contra o delito do criminoso.

Para que este segundo caráter funcione, essencialmente seria necessária uma mudança da política criminal, sendo mais direcionada a proteção e guarda dos direitos. Concluindo o estudo acerca desta função da pena, vale registrar a seguinte posição de Eugênio Rául Zaffaroni e Nilo Batista: “A atual criminalização não cumpre essa função, salvo em casos excepcionais.

  1. A teoria o direito penal mínimo reconhece isso e, portanto, propõe uma radical redução do poder punitivo.
  2. Contudo, deve-se observar que essa proposta é totalmente contrária ao que acontece e implica a realização de um modelo de sociedade bem diverso,
  3. Como, porém, nos modelos atuais de sociedade a pena só por exceção assume a função que o minimalismo penal imagina em uma sociedade futura, é inútil centrar a discussão em torno de um remanescente hipotético.

Na verdade, centrar a discussão nesse tema conduz a um debate sem conseqüências práticas imediatas, voltado para as alternativas de supressão total ou radical redução do poder punitivo, quando as tendências atuais caminham na direção exatamente oposta.

  1. O poder punitivo não é legitimado pela tese do minimalismo penal,de vez que ela não pode ser tratada como uma nova teoria da pena, mas sim como uma proposta política digna de ser discutida, voltada para o futuro.
  2. Por outro lado, torna-se duvidoso que uma coerção limitada à evitação de conflitos (vingança) ou a sua interrupção (defender a vítima) seja realmente uma pena: quando esses riscos existem, de modo efetivo e iminente, convém pensar em coerção direta atual ou diferida.

Apesar da existência do poder punitivo amplo, sabe-se que existem fatos cruéis de vingança, como também conhecem-se casos gravíssimos de impunidade, que não deram lugar a estas reações (a impunidade dos torturadores da ditadura militar, por exemplo).” Assim, diante desta exposição teórica sobre a função e finalidade da pena, conclui-se que o caráter utilitário da pena faz-se necessário, não apenas como retribuição ao criminoso pelo mal praticado, mas também para ensinar à sociedade as conseqüências de uma conduta reprovável, bem como propiciar ao delinqüente a reeducação e reabilitação ao convívio em sociedade, como forma de redução da violência e criminalidade, gerando, conseqüentemente, segurança social e eficácia na atividade estatal de executar a pena e recuperar o criminoso.

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Notas: GOMES, Luiz Flávio. Penas e medidas alternativas à prisão: doutrina e jurisprudência.2. Ed. vol.1. Ver., Atual. e Ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000, p.40. BITENCOURT, Cezar Roberto. Manual de Direito Penal, São Paulo: Saraiva, 2000; p,68. FERREIRA, Gilberto. Aplicação da Pena, Rio de Janeiro: Forense, 2000; p.25.

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O que significa prevenção geral positiva?

A prevenção geral positiva ou de integração busca a conservação e o reforço da confiança na firmeza e no poder de execução do ordenamento jurídico.
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O que é a prevenção especial positiva?

Teoria da Pena: Teoria relativa da pena –> Prevenção especial positiva – Finalmente, a prevenção especial positiva, dirigida ao agente que praticou o delito, expressa o caráter ressocializador da pena, a aplicação da pena possui o objetivo de que o infrator repense o ato delituoso por ele cometido e suas consequências, de modo que não torne a desrespeitar a lei penal.
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Quais são as classificações da função preventiva da pena?

Resumo: O autor analisa as funções da pena no sistema penal brasileiro. Palavras chave : Teorias Absolutas, Teoria Relativa, Teoria Mista, A pena como prevenção da violência No decorrer da evolução da pena, surgiram teorias que buscaram explicar ou apenas entender a utilidade da pena diante dos comportamentos sociais de cada época e da organização do Estado, suas finalidades e características, e, acima de tudo, a figura do condenado como sujeito passivo da atuação dela, como se vê a seguir.

Num primeiro momento, a pena foi vista como um meio de retribuir ao condenado o mal por ele causado, em virtude da infração cometida. Posteriormente, o caráter preventivo da sanção penal foi enfatizado e, em determinado momento, surgiram as teorias mistas que buscavam conciliar as teorias absolutas e as relativas.

Luiz Flávio Gomes, sobre o papel desempenhado pela pena, expõe: “A pena ou qualquer outra resposta estatal ao delito, destarte, acaba assumindo um determinado papel. No modelo clássico, a pena (ou castigo) ou é vista com finalidade preventiva puramente dissuasória (que está presente, em maior ou menor intensidade, na teoria preventiva geral negativa ou positiva, assim como na teoria preventiva especial negativa).

Já no modelo oposto (Criminologia Moderna), à pena se assinala um papel muito mais dinâmico, que é o ressocializador, visando a não reincidência, seja pela via da intervenção excepcional no criminoso (tratamento com respeito aos direitos humanos), seja pelas vias alternativas à direta intervenção penal.

TEORIAS ABSOLUTAS OU RETRIBUTIVAS DA PENA Esta Teoria foi desenvolvida na Idade Média, uma época em que a teologia e a política eram estritamente ligadas pelo eixo do Direito Divino, no qual a identidade de soberano era confundida com o Estado, já que concedidos por Deus.

  1. Neste período, era imposto um castigo às condutas imorais ou a algum pecado cometido, que afrontasse a Igreja ou o Estado na figura do soberano; a este castigo foi dado o termo poena, que em latim significa castigo, expiação ou suplício.
  2. Com o avanço da sociedade e o nascimento do Mercantilismo, o Estado Absolutista começa a se desgastar e, junto com ele, a idéia vinculada de Deus-Soberano-Estado, surgindo o Estado Burguês com novas idéias de governo com a participação do povo e distinção dos poderes.

O castigo, neste período, passa a ser a retribuição a uma ordem jurídica interrompida; e a lei humana passa a substituir a lei de Deus. Sendo o Estado uma expressão do querer do povo, ele passa a organizar a ordem político-jurídica como um ‘contrato social’, onde o indivíduo se vê obrigado a manter o consenso coletivo e sujeito a um castigo que fosse capaz de retribuir o mal cometido à sociedade, caso descumprida esta obrigação.

Explica Cezar Roberto Bittencourt que, “segundo este esquema retribucionista, é atribuída à pena, exclusivamente, a difícil incumbência de realizar Justiça. A pena tem como fim fazer justiça, nada mais”. Deste modo, a pena seria a imposição de um mal necessário diante de seus atos negativos que prejudicavam a sociedade e a integridade do Estado.

Neste caráter retributivo, Gilberto Ferreira esclarece que “a pena é justa em si e sua aplicação se dá sem qualquer preocupação quanto a sua utilidade. Ocorrendo o crime, ocorrerá a pena, inexoravelmente. O importante é retribuir com o mal, o mal praticado”.

A pena justificar-se-ia não pela finalidade a que se presta, mas sim pela realização de um ideal de justiça. Antônio Henrique Graciano Suxberger sobre o tema afirma: “A pena consubstancia retribuição da culpabilidade do sujeito, considerada a culpabilidade como decorrente da idéia kantiana de livre arbítrio.

Esse é seu único fundamento e, com amparo nesse argumento, é que se diz que, se o Estado não mais se ocupasse em retribuir, materializar numa pena a censurabilidade social de uma conduta, o próprio povo que o justifica também se tornaria cúmplice ou conivente com tal prática e a censura também sobre o povo recairia.” Maria Lúcia Karam, afirma que “as teorias absolutas surgiram sustentando que a pena encontra sua justificação em si mesma, baseando-se na idéia de retribuição, do castigo, da compensação do mal, representado pela infração, com o mal, representado pelo sofrimento da pena”,

  1. Os principais defensores desta idéia foram Immanuel Kant e G.F.
  2. Hegel, segundo os quais, tal teoria carregava em seus moldes uma influência filosófica de base ética e moral.
  3. Assim, cabia ao soberano punir rigorosamente os transgressores das ordens jurídicas impostas a sociedade, pois a lei era um imperativo categórico que descrevia uma ação ou omissão ao indivíduo, como um mandamento, para buscar o bem e a satisfação da coletividade em geral e o seu não cumprimento tem como conseqüência a imposição de uma sanção capaz de retribuir o mal feito.

Não bastava a legalidade das ações; era necessário, ainda, que o respeito à lei geral ou universal de moralidade fosse o motivo concreto impulsionador da vontade. A pena nunca poderia ter uma finalidade voltada ao social, pois não seria ético tê-la, uma vez que o homem não é objeto passível de instrumentalização visto que ele “nunca deve ser analisado como meio, mas sim como um fim para si mesmo”, logo a pena só é aplicada pela infringência da lei visando realizar Justiça.

Sobre esta teoria, Gilberto Ferreira, resumidamente, diz que: “Para se ter uma idéia do que pregam os integrantes destas teorias basta tomar por base a hipótese de Kant, para quem se a sociedade se dissolvesse, ainda assim o último assassino deveria ser punido a fim de pagar pelo mal cometido.” Kant, em suas teses de definições da pena, sempre valorou a importância da espécie e medida da pena, explicando que cada um tem o castigo segundo a conduta ilegal que cometeu e na medida do mau que causou à coletividade.

Vale dizer, ainda que a sociedade fosse dissolvida, era preciso executar o último assassino, para que cada um sofresse as conseqüências dos seus atos. Na mesma linha, Hegel afirmava que o delito caracteriza a desordem e o desrespeito a vontade geral da sociedade que simboliza a ordem jurídica do Estado.

Assim, a pena vem para retribuir a má conduta do agente e para confirmar o querer geral, sendo estabelecida conforme a espécie do delito e na medida do mal causado à coletividade. Antônio Henrique Graciano Suxberger, explicando o pensamento de Hegel, afirma: “O crime, pois, seria aniquilado, negado, expiado pelo sofrimento da pena que, desse modo, restabeleceria o direito lesado.

A pena substanciaria a negação da negação do direito, segundo a referida fórmula clássica de Hegel, razão pela qual cumpriria um papel restaurador ou retributivo. Quanto mais intensa a negação do direito, mais intensa será a pena, sendo certo que, para essa abordagem, nenhum outro fator influi em sua mensuração.” O delito representaria a vontade irracional e particular do agente, uma vez que o Direito é composto da vontade racional e geral da sociedade, sendo aquela uma contradição a esta, exigindo-se desta forma uma punição compensatória, um castigo que restabelecesse a ordem jurídica afetada ou desrespeitada.

  • Na opinião de Hegel, em sua obra Filosofía del Derecho : “Somente através da aplicação da pena trata-se o delinqüente como um ser ‘racional’ e ‘livre’.
  • Só assim ele será honrado dando-lhe não apenas algo justo em si, mas lhe dando o seu Direito : contrariamente ao inadmissível modo de proceder dos que defendem princípios preventivos, segundo os quais se ameaça o homem como quando se mostra um pau a um cachorro, e o homem, por sua honra e liberdade, não deve ser tratado como um cachorro”.

Assim, as teorias retribucionistas consideravam tão-somente a expressão retribucionista da pena. Vale dizer, a pena traduzia um mal que recai sobre um sujeito que cometeu um mal do ponto de vista do direito. Essa concepção de pena estava ligada, sem quaisquer dúvidas, a uma visão de Estado guardião e não a um Estado intervencionista.

  • Embora Kant e Hegel tenham sido os principais defensores desta teoria absolutista da pena, é preciso destacar também Francesco Carrara, Edmund Mezger, Hans Welzel, H.H.
  • Jescheck entre outros que seguiram a mesma linha.
  • A grande crítica formulada à teoria absoluta, defendida por Kant e Hegel, assenta na idéia de que a pena, para esta teoria, é apenas uma punição, servindo para retribuir o delito do delinqüente com um castigo; pagar o mal feito pelo “mal” (a pena), o que não mostra nenhuma utilidade à sociedade.

Tal teoria, ao invés de justificar a pena, pressupõe a sua necessidade. Maria Lúcia Karam, demonstrando os equívocos das teorias absolutas, expõe que: “A privação da liberdade, o isolamento, a separação, a distância do meio familiar e social, a perda de contato com as experiências da vida normal de um ser humano, tudo isto constitui um sofrimento considerável.

Mas, a este sofrimento logo se somam as dores físicas: a privação de ar, de sol, de espaço, os alojamentos superpovoados e promíscuos, as condições sanitárias precárias e humilhantes, a falta de higiene, a alimentação muitas vezes deteriorada, a violência das torturas, dos espancamentos e enclausuramentos em “celas de castigo”, das agressões, atentados sexuais, homicídios brutais”,

Assim, a visão de retribuição trazida pela teoria absoluta, sob o ponto de vista clássico, é inapta à ressocializar o condenado, mesmo porque, para os defensores desta teoria, o indivíduo era visto como mero instrumento. Luiz Regis Prado aponta, com peculiar maestria, que a visão acerca de retribuição, veiculada pela teoria absoluta, nos dias atuais, já não encontra terreno fértil, isto porque: “Na atualidade, a idéia de retribuição jurídica significa que a pena deve ser proporcional ao injusto culpável, de acordo com o princípio de justiça distributiva.

Logo, essa concepção moderna não corresponde a um sentimento de vingança social, mas antes equivale a um princípio limitativo, segundo o qual o delito perpetrado deve operar como fundamento e limite da pena, que deve ser proporcional à magnitude do injusto e da culpabilidade” TEORIA RELATIVA OU PREVENTIVA DA PENA Em outro extremo, as teorias relativas fundamentavam a pena na necessidade de evitar a prática de delitos.

Assim, a pena era vista como instrumento apto à prevenção de possíveis delitos, tinha, pois, um nítido caráter utilitário de prevenção. Gamil Föppel El Hireche, em obra indispensável à análise do tema, aduz que: “Superadas as teorias absolutas, compete, agora, fazer o estudo das chamadas teorias relativas, que buscam uma finalidade para a pena, razão pela qual esta deixa de ser um fim em si mesma, passando a ser vista como algo instrumental: passa a ser um meio de combate à ocorrência e reincidência de crimes, É notadamente uma perspectiva utilitarista.” A teoria relativa ou preventiva não trata a pena como forma de retribuir ao delinqüente o mal por ele praticado contra a sociedade, mas atribui à pena um caráter preventivo à prática do delito.

A tese preventiva tem por base a função de inibir o máximo possível a realização de novos atos ilícitos. A punição era encarada como meio de segurança e defesa da sociedade. Deste modo, a pena seria aplicada para impor o medo. Todavia, muitas vezes, tal medo era incapaz de coagir a prática do delito, já que o condenado agia com confiança de que não seria descoberto.

Esta teoria pode ser dividida em preventiva geral, a qual tem por característica a intimidação da sociedade para a não prática do ilícito, e preventiva especial, que possui como objeto o próprio delinqüente. Prevenção Geral Na Preventiva Geral a pena tem o caráter ameaçador, pois, segundo Cezar Roberto Bittencourt, “com a ameaça de pena, avisando os membros da sociedade quais as ações injustas contra as quais se reagirá; e, por outro lado, com a aplicação da pena cominada, deixa-se patente a disposição de cumprir a ameaça realizada”.

A pena é tratada como uma coação psicológica, pois é forma de ameaça aos cidadãos que se recusam a observar e obedecer as ordens jurídicas da sociedade, motivando os indivíduos à não prática de novos delitos. Antônio Henrique Graciano Suxberger, sobre o tema afirma: “A teoria da prevenção geral ou cai na utilização do medo como forma de controle social, com o qual se chega num Estado de terror e na transformação dos indivíduos em animais, ou na suposição de uma racionalidade absoluta do homem no juízo de ponderação entre as condutas que poderá eleger, na sua capacidade de motivação, tão ficcional como a idéia de livre arbítrio, ou, por último, cai na teoria do bem social ou da utilidade pública, que tão-somente acoberta os interesses em jogo: uma determinada socialização das contradições e dos conflitos de uma democracia imperfeita”.

Demonstram-se assim duas bases fundamentais da Prevenção Geral, sendo elas a coação, por intermédio do medo, gerando a intimidação da lei face o indivíduo; e o raciocínio ponderado do homem face à lei e à conduta adequada perante a ordem jurídica da sociedade.

Diante disto, esta teoria geral é subdividida em negativa, que busca a intimidação daqueles que não praticaram a conduta ilícita, para que estes não se sintam motivados ou instigados à prática do crime e também em positiva, na qual a pena nada mais é do que um novo meio de se produzir novos valores morais e éticos diante da sociedade e do indivíduo que não praticou a conduta ilegal.

Prevenção Geral Negativa O caráter negativo da prevenção geral foi, historicamente, o primeiro a ser conhecido. Consiste na intimidação genérica da coletividade por meio da ameaça de aplicação de sanções contida nas normas incriminadoras. A intimidação começa no momento da cominação das sanções penais e é reforçada com a aplicação e a execução das mesmas.

A efetividade da prevenção geral, sob o aspecto da intimidação da coletividade, decorre da eficácia do funcionamento do sistema penal em seu conjunto: a aplicação e a execução das penas tornam mais visível a ameaça penal, certificando-a. Nesta teoria geral negativa, Eugênio Rául Zaffaroni e Nilo Batista explicam que “a criminalização assumiria uma função utilitária, livre de toda consideração ética e, por conseguinte, sua medida deveria ser a necessária para intimidar aqueles que possam sentir tentação de cometer delitos”.

Há de se mencionar, no entanto, que em algumas formas criminosas de condutas, tal forma de inibir a delinqüência é praticamente inexistente, seja em razão de agentes não vulneráveis, seja em razão de alguns não levarem em conta a pena e suas conseqüências, seja porque recebem quantias significativas de dinheiro para a prática de delitos, seja, ainda, pela conduta ilícita não proporcionar reflexão quanto as conseqüências penais ou quando o agente criminoso pratica sua conduta ilegal motivado por situações ou circunstâncias semi-imputáveis.

Contribuindo para cristalizar esta teoria, Eugênio Rául Zaffaroni e Nilo Batista esclarecem que: “O êxito da teoria advém de sua pretensa comprovação por introspecção não poder afirmar, a partir de seu status social e ético, se o efeito dissuasivo está na pena ou na estigmatização social devida ao fato em si.

Isso se deve a que tal discurso parte da ilusão de um pan-penalismo jurídico e ético, que confunde o efeito do direito em geral e de toda a ética social com o do poder punitivo : em suma, tal discurso identifica o poder punitivo com a totalidade da cultura.

  1. A imensa maioria das pessoas evita as condutas aberrantes e lesivas por uma enorme e diversificada quantidade de motivações éticas, jurídicas e afetivas que nada têm a ver com o temor à criminalização secundária.
  2. No plano político e teórico essa teoria permite legitimar a imposição de penas sempre mais grave, por que não se consegue nunca a dissuasão total, como demonstra a circunstância de que os crimes continuam sendo praticados.

Assim, o destino final desse caminho é a pena de morte para todos os delitos, mas não por que com ela obtenha a dissuasão, mas sim por que esgota o catálogo de males crescentes com os quais se pode ameaçar uma pessoa”. Assim, nesta vertente doutrinária, a pena se impõe pelo medo, ou seja, ela deve ter a capacidade de atemorizar as pessoas da sociedade, independente do sofrimento da pessoa que a suporta, para que aquele delito não seja praticado novamente.

Portanto, as penas teriam de ser proporcionais aos fatos pelos quais são impostos, devendo ser mais rígidas a medida que os crimes prescritos por elas fossem praticados. Não haveria qualquer ligação entre a pena e os delitos praticados, porque a medida dela seria dependente de fatos externos, por exemplo, nos crimes contra o patrimônio, a pena deveria aumentar, pois tais delitos tendem também a aumentar, ficando a sociedade mais frágil e vulnerável e a perda de bens ou coisas de valores seria algo irreversível e de difícil reposição.

Esta espécie de intimidação pressupõe a necessidade da utilização de uma pessoa como meio de realização do Estado, para concretização de seus serviços e funções perante a sociedade. Ainda sobre o assunto, Zaffaroni e Batista destacam que, “dar por demonstrado que o ser humano empreende um frio cálculo de rentabilidade perante cada impulso infracional é arrimar-se numa ficção.

  • Mesmo um discurso penal legitimante não pode fundar-se numa óbvia falsidade, e o uso desse argumento equivale a uma confissão de que não existe base válida para ocultar a natureza policial do poder punitivo”.
  • Vê-se, portanto, que, se tal caráter retributivo não cumpre sua intimidação na sociedade, a pena também não cumprirá esta função.

Para que se realize tal função, é indispensável diferençar as pessoas da sociedade que se intimidam com a pena e os delinqüentes que exigem uma forma especial de prevenção, devendo esta ser ilimitada; criando, dessa forma, penas limitadas à sociedade e penas ilimitadas aos delinqüentes, o que formaria um sistema pluralista.

Analisando o contexto social do agente criminoso, é possível descobrir se seu grau de culpabilidade é menor, pois sua origem está ligada a uma sociedade ‘acultural’, desprovida economicamente e com baixo nível de escolaridade, o que diminui seu espaço, enquanto cidadão, dentro da sociedade, sendo marcado e corrompido pela criminalidade, que o reduz mais ainda.

O sentido de intimidação do delito perde sua característica de lesão jurídica para transformar-se em um começo de contradição com a cultura que o estado quer tornar única entre todos os membros da coletividade, ou com a moral que se procura estabelecer.

Demonstra-se, desta forma, segundo os dizeres de Zaffaroni e Batista, “seu caráter verticalista, hierarquizante, homogeneizador, corporativo e, por conseguinte, contrário ao pluralismo próprio do estado de direito e à ética baseada no respeito pelo ser humano como pessoa”. Prevenção Geral Positiva O aspecto positivo da prevenção geral relaciona-se com a manutenção da fidelidade jurídica dos cidadãos e opera de diversas formas.

A primeira consiste no estabelecimento de diretrizes de conduta para a sociedade, através da demonstração do especial valor de determinados bens jurídicos, que se faz por meio da criação dos tipos penais, da cominação das penas correspondentes e do estabelecimento dos critérios de persecução penal.

  • A segunda forma pela qual opera a prevenção geral positiva decorre da confiança que surge na sociedade a partir da constatação de que o Direito efetivamente se aplica.
  • E, ao final, a prevenção geral positiva opera também através do efeito de pacificação que se produz quando, em virtude da aplicação e execução da sanção penal, a consciência jurídica da sociedade se tranqüiliza e considera solucionado o conflito com o autor da infração.

A Teoria da Prevenção Geral Positiva busca, pois, gerar efeitos sobre os indivíduos não-criminalizados da sociedade, não intimidando-os para se omitirem da prática do ilícito, mas para produzir um acordo para reafirmar a confiança no sistema coletivo, impondo um mal ao agente delinqüente.

Demonstra desta forma que a pena é maior que o incômodo produzido, como reflexo do fato ilícito, que é o único que importa, exprimindo-se na desconformidade da vigência da norma, indispensável para uma coletividade existir. Acerca do tema Zaffaroni e Batista registram a seguinte posição: “A partir da realidade social, essa teoria se sustenta em mais dados reais que a anterior.

Segundo ela, uma pessoa seria criminalizada porque com isso a opinião pública é normalizada ou renormalizada, dado ser importante o consenso que sustenta o sistema social. Como os crimes de “Colarinho Branco” não alteram o consenso enquanto não forem percebidos como conflitos delituosos, sua criminalização não teria sentido.

Na prática, tratar-se-ia de uma ilusão que se mantém porque a opinião pública a sustenta, e convém continuar sustentando-a e reforçando-a porque com ela o sistema penal se mantém: ou seja, o poder a alimenta para ser por ela alimentado.” Em síntese, essa tese se desenvolve pela intimidação causada pela aprovação dos que acreditam que somente serão punidos os que delinqüem.

A pena, para esta concepção, deveria possuir uma medida capaz de reestruturar o sistema, formando uma concordância geral da sociedade, que depende da sua crença na pena e nas suas conseqüências severas, para estabelecer seu equilíbrio, independente do delinqüente ou de seu delito.

Sobre o assunto, aduz Zaffaroni e Batista: “A diante do imenso poder de vigilância (e corrupção) que as agências que o exercem acumulam, a defesa dos valores éticos fundamentais não pode ser levada a cabo mediante a legitimação desse poder, mas precisamente através de sua contenção e limitação ; aliás, a respeito de tal versão é válido, também, o que se disse acerca do pretenso valor simbólico: os valores éticos não se fortalecem, mas se fomenta a certeza de que aqueles que são invulneráveis continuaram assim; tal versão pressupõe algo que é falso: nem todo delito afeta valores éticos-sociais básicos, nas complexas sociedades modernas não há um único sistema de valores e, além do mais, a posição contrária está consagrando o estado como gerador de valores éticos, o que implica uma ditadura ética.” A busca incessante por uma melhor teoria que satisfizesse o interesse jurídico e que fosse capaz de solucionar os conflitos jurídico-sociológicos, produziram a divisão da teoria da prevenção geral positiva em Limitadora e Fundamentadora.

Na Prevenção Geral Positiva Fundamentadora o Direito Penal possui uma finalidade mais importante que resguardar os bens jurídicos, qual seja, garantir os valores éticos-sociais de uma coletividade através de previsões legais e sanções a condutas que impliquem o desrespeito a valores fundamentais.

  • Entretanto, nos ensinamentos de Bitencourt, esta vertente da teoria geral positiva: “Não constitui uma alternativa real que satisfaça as atuais necessidades da teoria da pena.
  • É criticável também sua pretensão de impor ao indivíduo, de forma coativa, determinados padrões éticos, algo inconcebível em um Estado social e democrático de Direito.

É igualmente questionável a eliminação dos limites do ius puniendi, tanto formal como materialmente, fato que conduz à legitimação e desenvolvimento de uma política criminal carente de legitimidade democrática.” Na Prevenção Geral Positiva Limitadora, o Direito Penal é visto como mais um instrumento para controle, organização e ordem da coletividade, sendo diferenciado dos demais por seu caráter formal.

O poder de punir, exercido pelo Direito Penal e pelo Estado, está subordinado a alguns requisitos limítrofes, aos quais as demais formas de punir não se vinculam. Tal punição deve obedecer certos procedimentos legais, jurídicos, constitucionais e até administrativos, respeitando princípios e fundamentos importantes e essenciais para a sua validade e eficiência, tais como o princípio da proporcionalidade.

Sobre esta vertente da teoria da prevenção geral positiva, Cezar Roberto Bitencourt afirma que: “A formalização do Direito Penal tem lugar através da vinculação com as normas e objetiva limitar a intervenção jurídico-penal do Estado em atenção aos direitos individuais do cidadão.

  1. O Estado não pode – a não ser que se trate de um Estado totalitário – invadir a esfera dos direitos individuais do cidadão, ainda e quando haja praticado algum delito.
  2. Ao contrário, os limites em que o Estado deve atuar punitivamente deve ser uma realidade concreta.
  3. Esses limites referidos materializam-se através dos princípios da intervenção mínima, da proporcionalidade, da ressocialização, da culpabilidade etc.

A principal finalidade, pois, a que deve dirigir-se a pena é a prevenção geral – em seus sentidos intimidatórios e limitadores –, sem deixar de lado as necessidades de prevenção especial, no tocante à ressocialização do delinqüente. Entende-se que o conteúdo da ressocialização não será o tradicionalmente concebido, isto é, com a imposição de forma coativa (arbitrária).

A ressocialização do delinqüente implica um processo comunicacional e interativo entre indivíduo e sociedade. Não se pode ressocializar o delinqüente sem colocar em dúvida, ao mesmo tempo, o conjunto social normativo ao qual se pretende integrá-lo. Caso contrário, estaríamos admitindo, equivocadamente, que a ordem social é perfeita, o que, no mínimo, é discutível.” Assim, tal como a prevenção negativa, também a prevenção positiva se realiza através da cominação, aplicação e execução das sanções penais, dependendo sua efetividade do funcionamento eficaz do sistema penal em seu conjunto e, além disso, da medida em que os tipos penais retratem os valores mais importantes na sociedade e cuja defesa, aos olhos da sociedade, necessite da intervenção penal.

Quando os parâmetros definidos para a incriminação afastam-se dos valores que, aos olhos da maioria do corpo social, justificariam a tutela penal, não apenas o efeito de prevenção positiva, em todas as suas formas, se enfraquece, como também a democracia se debilita.

  • Há que se ressaltar, por fim, que, muitas vezes, a distinção da prevenção geral em positiva e negativa parece artificial.
  • A forma mais fácil de fazer uma distinção segura entre um e outro aspecto talvez seja aludir ao fato de que a prevenção geral negativa atua principalmente sobre aqueles membros da comunidade que, seja lá por quais motivos for, apresentam uma especial propensão ao cometimento de delitos (no sentido de cogitarem, freqüentemente, perpetrar delitos); enquanto que a prevenção positiva refere-se principalmente àqueles que, não apresentando propensão especial à prática de fatos delituosos, não se impressionam propriamente com a ameaça penal, pois não a percebem subjetivamente como a eles dirigida, mas se tranqüilizam e se sentem seguros com a percepção de que o sistema penal está operando satisfatoriamente, ou seja, está protegendo com eficiência os valores escolhidos pela coletividade para gozarem de tutela penal.

Prevenção Especial: No que se refere à Prevenção Especial, esta é direcionada ao próprio indivíduo, na busca de um convencimento subjetivo para que o mesmo não volte à prática do ilícito, medindo-se a pena por meios preventivos especiais, os quais visam ressocializar e reeducar o infrator da ordem jurídica intimidando os demais integrantes da coletividade a não praticar o ilícito, demonstrando as conseqüências e sanções legais pela prática.

Nos ensinamentos de Cezar Roberto Bitencourt sobre esta visão, “a pena deveria concretizar-se em outro sentido: o da defesa da nova ordem, a defesa da sociedade. O delito não é apenas a violação à ordem jurídica, mas, antes de tudo, um dano social; e o delinqüente é um perigo social (um anormal) que põe em risco a nova ordem”.

Para Gilberto Ferreira: “Esta teoria se baseia nas Teorias do Melhoramento e da Emenda; e do Ressarcimento, onde na primeira a principal finalidade é impedir a pratica de novos delitos, e esta finalidade só seria atingida através do melhoramento do agente do ilícito, o qual não voltaria a prática do delito; já na segunda a pena serviria para castigar o indivíduo marginalizado e, conseqüentemente o ressarcimento dos danos e prejuízos causados por sua conduta ilegal”,

  1. Antônio Henrique Graciano Suxberger sobre o tema afirma: “Os defensores da abordagem preventivo-especial preferem a idéia de “medidas”, em lugar de penas.
  2. A pena pressupõe a liberdade ou a capacidade racional do delinqüente, de modo a considerar um critério de igualdade geral; já a medida, ao contrário, parte da idéia de que o criminoso é um sujeito perigoso, diferente do normal, e que há de ser tratado consoante suas peculiares características perigosas.

O castigo e a intimidação perdem, assim, sentido, porquanto a incidência da sanção penal volta-se a corrigir ou reabilitar o delinqüente, sempre que seja possível, ou então a afastá-lo para torná-lo inofensivo.” Deste modo, a prevenção especial refere-se à atuação sobre o indivíduo que já delinqüiu, a fim de que ele não volte a delinqüir, e teoricamente opera três diferentes formas: através da intimidação pessoal do condenado, da sua neutralização, decorrente da segregação compulsória e, afinal, da sua ressocialização ou reintegração social.

  • A intimidação pessoal do condenado relaciona-se com a aplicação e execução das diversas penas, inclusive as não privativas de liberdade.
  • A neutralização do condenado refere-se apenas à execução das sanções penais privativas de liberdade (e, no caso dos países que adotam a pena de morte, também à execução dessa pena).

Consiste em impedir fisicamente o condenado à pena privativa de liberdade de voltar a delinqüir, em virtude do seu encarceramento. Assegura-se, assim, a sociedade contra novas violações do ordenamento jurídico por parte do recluso. É claro, contudo, que essa neutralização somente opera com eficácia relativamente à comunidade extra-muros e durante o período de tempo em que atua a segregação compulsória do indivíduo.

A função de reintegração social refere-se à aplicação e execução das penas restritivas de direitos e privativas de liberdade e consiste, basicamente, no efeito que se deseja obter, através da intervenção estatal, no sentido de criar estímulos, no condenado, para que ele não volte a delinqüir após o cumprimento da pena imposta.

A função de reintegração social ou ressocialização, como hoje é atribuída à pena privativa de liberdade, incorporou-se gradativamente à pena principalmente como decorrência das pregações do Positivismo Criminológico, que, retomando a idéia da pena com caráter utilitário, como instrumento de defesa social, acentuada à época do Iluminismo, condenava a concepção retributiva ou absoluta da pena, enfatizando que a ressocialização dos criminosos deveria ser o objetivo essencial da execução penal.

Esta teoria também pode ser divida em Prevenção Especial Positiva e Prevenção Especial Negativa. Prevenção Especial Positiva A prevenção especial positiva tem por objetivo buscar o melhoramento do infrator, pois está provado que a criminalidade desvirtua o seu agente, tornando-o cada vez mais dependente do delito.

O discurso desta vertente parte da premissa que a pena é benéfica àquele que se submete a ela. Deste modo, o delito seria um sintoma de inferioridade apto à demonstrar ao Estado a necessidade de aplicar o remédio social da pena. Todavia, os adeptos de tal pensamento, parecem esquecer que a criminalidade não tem feito isto sozinha, já que cada vez mais o sistema prisional, ou carcerário, tem participado desse processo de desvirtuamento do delinqüente, construindo um quadro irreversível.

  1. É inadmissível acreditar na possibilidade de melhorar o agente do delito com a imposição de penas ou castigos aliados a um meio, que ao invés de recuperá-lo, ajuda a denegri-lo.
  2. Prevenção Especial Negativa Esta vertente, por seu turno, também analisa o indivíduo como agente do ilícito, porém não busca melhorá-lo, com a reeducação ou ressocialização, mas sim castigá-lo com a imposição de uma pena severa, que, concomitantemente, age como solução e como busca pela satisfação social, com a finalidade de neutralizar as conseqüências da inferioridade do delinqüente.

Na verdade, esta teoria não tem atuação exclusiva, pois ela se manifesta em conformidade com a Teoria Especial Positiva, uma vez que esta não consegue atingir sua finalidade de ressocialização, aquela assume o papel de buscar a eliminação e o controle sobre o agente do ilícito e a conduta deste.

  • Já que as idéias de recuperar e reintegrar o delinqüente à sociedade têm fracassado ultimamente, como as demais intenções de melhorá-lo, esse controle não passa de um castigo imposto de forma arbitral pelo Estado legítimo.
  • Esta tendência acredita que há êxito em sua essência ideológica, pois o controle seria satisfeito à medida que o castigo e a penalização produzissem limitações físicas ao agente do delito, causando-lhe impossibilidade de praticar crimes posteriores.

Tratando sobre este assunto Zaffaroni e Batista expõe que: “Ao nível teórico, a idéia de uma sanção jurídica é incompatível com a criação de um mero obstáculo mecânico ou físico, porque este não motiva o comportamento, mas apenas o impede, o que fere o conceito de pessoa (art.1.º da Declaração Universal dos Direitos Humanos e art.1.º da Convenção Americana dos Direitos Humanos), cuja autonomia ética lhe permite orientar-se conforme o sentido.

  • Por isso, a mera neutralização física está fora do conceito de direito, pelo menos em nosso atual horizonte cultural.
  • Como no discurso anterior – do qual é complemento originário – o importante é o corpo social, ou seja, o correspondente a uma visão corporativa e organicista da sociedade, que é o verdadeiro objeto de atenção, pois as pessoas não passam de meras células que, quando defeituosas ou incorrigíveis, devem ser eliminadas.

A característica do poder punitivo dentro desta corrente é sua redução à coerção direta administrativa: não há diferença entre esta e a pena, pois as duas procuram neutralizar um perigo atual,” Esta teoria da função da pena tem sofrido severas críticas, pois há quem afirme que tal forma de prevenção não é tão eficaz diante do agente que não precisa ser ressocializado ou ter sua personalidade restabelecida para o bom convívio em sociedade.

Claus Roxin, discorrendo acerca dos equívocos da teoria da prevenção especial aduz: “A teoria da prevenção especial não é idônea para fundamentar o direito penal, porque não pode delimitar os seus pressupostos e conseqüências, porque não explica a punibilidade de crimes sem perigo de repetição e porque a idéia de adaptação social coativa, mediante a pena, não se legitima por si própria, necessitando de uma legitimação jurídica que se baseia noutro tipo de considerações.” TEORIA MISTA DA PENA Esta teoria busca a unificação dos pontos mais importantes e fundamentais das teorias anteriormente expostas, porque qualquer uma destas, atuando em sentido próprio, são insuficientes para atingir e solucionar os problemas sociais, garantindo a proteção e os direitos dos cidadãos.

Na lição precisa de Gamil Föppel El Hireche sobre as teorias mistas, “não obstante novas idéias que se propunham mistas ou ecléticas, estas representaram, como ordinariamente ocorre com as teorias desta natureza, um acúmulo não só de acertos como ordinariamente de erros”.

  1. Para tal teoria a prevenção é tratada como fim do Direito Penal, no qual o papel atuante da retribuição é apenas de limitar a aplicação daquela.
  2. Nesta visão teórica, Gilberto Ferreira defende que, “a pena tem duas razões: a retribuição, manifestada através do castigo; e a prevenção, como instrumento de defesa da sociedade”, e ela deve ser baseada simples e unicamente no delito e nada mais.

Proposta por Claus Roxin, a teoria dialética buscou, claramente, sintetizar as teorias anteriores, enfatizando os acertos verificados e buscando fugir dos erros encontrados nas outras teorias. A teoria unificadora de Claus Roxin vê o sentido da pena não apenas na compensação da culpa do delinqüente, mas também no sentido geral de fazer prevalecer a ordem jurídica e também determinados fins político-criminais, com o fim de prevenir futuros crimes.

  1. Para esta teoria, o direito penal devia ser analisado sob o ponto de vista dos princípios constitucionais, notadamente aquele princípio constitucional considerado o norteador de toda e qualquer atuação num Estado democrático de direito, qual seja, o princípio da dignidade da pessoa humana.
  2. Segundo Claus Roxin: “No Estado moderno, junto a esta proteção de bens jurídicos previamente dados, surge a necessidade de assegurar, se necessário, através dos meios do direito penal, o cumprimento das prestações de caráter público de que depende o indivíduo no quadro da assistência social por parte do Estado.

Com esta dupla função, o direito penal realiza uma das mais importantes das numerosas tarefas do Estado, na medida em que apenas a proteção dos bens jurídicos constitutivos da sociedade e a garantia das prestações públicas necessárias para a assistência possibilitam ao cidadão o livre desenvolvimento da sua personalidade, que a nossa Constituição considera como pressuposto digno.” Claus Roxin, assim, defende o caráter subsidiário do direito penal, o qual poderá incidir como medida última.

Partindo de uma síntese dialética, ele admite que a aplicação da pena esteja inserida na idéia de prevenção geral e prevenção especial. A prevenção geral, seja positiva ou negativa, sempre com a devida observância das garantias da dignidade humana e o respeito aos ditames constitucionais e a prevenção especial limitada pela culpabilidade do infrator.

Claus Roxin, ainda sobre o tema, afirma: ” Não é lícito ressocializar com a ajuda de sanções jurídico-penais que não são culpadas das agressões insuportáveis contra a ordem dos bens jurídicos, por mais degeneradas e inadaptadas que sejam essas pessoas.

  1. Caso este ponto de vista seja ignorado, estaremos sob a ameaça do perigo de uma associação coletivista que oprime o livre desenvolvimento da personalidade.
  2. As conseqüências da garantia constitucional da autonomia da pessoa devem, pois, respeitar-se igualmente na execução da pena.
  3. É proibindo um tratamento coativo que interfira com a estrutura da personalidade, mesmo que possua eficácia ressocializante.

Se quiséssemos consagrar numa só frase o sentido e limites do direito penal, poderíamos caracterizar a sua missão como proteção subsidiária de bens jurídicos e prestações de serviços estatais, mediante prevenção geral e especial, que, salvaguarda a personalidade no quadro traçado pela medida da culpa individual.

  1. A teoria dialética unificadora, deste modo, sustenta a existência de um processo dialético, em que o momento de retribuição não aparece de modo abstrato, para cumprir um ideal absoluto de Justiça, mas limitando e condicionando à realidade imposta pelos momentos de prevenção geral e especial.
  2. Tal teoria busca evitar os exageros unilaterais e dirigir os diversos fins da pena para vias socialmente construtivas, de modo a obter o equilíbrio de todos os princípios mediante restrições recíprocas.

Valendo-se, claramente, de uma concepção de Estado que reúne os princípios do Estado social e do Estado liberal. A teoria proposta por Claus Roxin sofreu inúmeras críticas, isto porque o critério desenvolvido por ele, para alguns, poderia ceder à arbitrariedade, o que somente seria impedido pelo condicionamento que lhe impõem outros momentos e porque a pena não pode superar a gravidade do fato e o grau de censurabilidade que recai sobre o delinqüente.

A abordagem de Roxin é essencialmente preventiva, uma vez que o momento retributivo resta totalmente esvaziado de seu conteúdo clássico e somente se evidencia como manifestação de Justiça no sentido de limite imposto pela culpabilidade e pela prevenção, dentro desta, com preponderância à idéia de ressocialização.

A PENA COMO PREVENÇÃO DA VIOLÊNCIA Fundando no Direito Penal Mínimo, esta função defende que a penalização ou o castigo seria necessário somente em situações de grave ameaça ou de altos riscos que possam atingir e afetar os interesses da coletividade.

Então se associaria o poder punitivo ao mais vulnerável, seja como vítima, por ocasião do delito, seja como autor, pelo motivo da pena. Isso demonstra um duplo caráter estatal de garantia a segurança social, um como potencialidade e legitimidade para punir; outro como protetor dos interesses da coletividade contra o delito do criminoso.

Para que este segundo caráter funcione, essencialmente seria necessária uma mudança da política criminal, sendo mais direcionada a proteção e guarda dos direitos. Concluindo o estudo acerca desta função da pena, vale registrar a seguinte posição de Eugênio Rául Zaffaroni e Nilo Batista: “A atual criminalização não cumpre essa função, salvo em casos excepcionais.

  1. A teoria o direito penal mínimo reconhece isso e, portanto, propõe uma radical redução do poder punitivo.
  2. Contudo, deve-se observar que essa proposta é totalmente contrária ao que acontece e implica a realização de um modelo de sociedade bem diverso,
  3. Como, porém, nos modelos atuais de sociedade a pena só por exceção assume a função que o minimalismo penal imagina em uma sociedade futura, é inútil centrar a discussão em torno de um remanescente hipotético.

Na verdade, centrar a discussão nesse tema conduz a um debate sem conseqüências práticas imediatas, voltado para as alternativas de supressão total ou radical redução do poder punitivo, quando as tendências atuais caminham na direção exatamente oposta.

  • O poder punitivo não é legitimado pela tese do minimalismo penal,de vez que ela não pode ser tratada como uma nova teoria da pena, mas sim como uma proposta política digna de ser discutida, voltada para o futuro.
  • Por outro lado, torna-se duvidoso que uma coerção limitada à evitação de conflitos (vingança) ou a sua interrupção (defender a vítima) seja realmente uma pena: quando esses riscos existem, de modo efetivo e iminente, convém pensar em coerção direta atual ou diferida.

Apesar da existência do poder punitivo amplo, sabe-se que existem fatos cruéis de vingança, como também conhecem-se casos gravíssimos de impunidade, que não deram lugar a estas reações (a impunidade dos torturadores da ditadura militar, por exemplo).” Assim, diante desta exposição teórica sobre a função e finalidade da pena, conclui-se que o caráter utilitário da pena faz-se necessário, não apenas como retribuição ao criminoso pelo mal praticado, mas também para ensinar à sociedade as conseqüências de uma conduta reprovável, bem como propiciar ao delinqüente a reeducação e reabilitação ao convívio em sociedade, como forma de redução da violência e criminalidade, gerando, conseqüentemente, segurança social e eficácia na atividade estatal de executar a pena e recuperar o criminoso.

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Como se define a prevenção?

Significado de Prevenção Característica do que é precavido; em que há prudência; precaução.
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