Jeitinho Brasileiro Artigo De Opinião?
Opinião: Renan Ferreirinha: A ética do jeitinho brasileiro O Brasil é único. É um país criativo, inventivo e nós, brasileiros, sabemos nos adaptar às adversidades. É o nosso diferencial. O jeitinho brasileiro é idiossincrático e, por isso mesmo, pode ter uma conotação negativa ou positiva, a depender do contexto, conforme esta Folha mostrou recentemente em artigos publicados.
- Por um lado, é associado a desonestidade, quebra de leis e corrupção.
- Por outro, a virtudes, como persistência, criatividade e solidariedade.
- Foquei meus estudos em Harvard para tentar entender esse fenômeno sob orientação do filósofo político Michael Sandel.
- A conclusão é que, numa sociedade bastante desigual e burocratizada, o “jeitinho do bem” pode humanizar relações e encontrar um caminho para melhorar a vida das pessoas, mas o “jeitinho do mal” enraizado em práticas diárias deve ser combatido.
As origens históricas do jeitinho remontam ao início da colonização portuguesa. Até 1808, quando a família real portuguesa chegou ao Rio, pouca atenção foi dada ao desenvolvimento de leis, instituições e normas. Antes disso, 98% da população era analfabeta e quase 40% de seus habitantes eram escravos.
Como afirmou o ministro do STF Luís Roberto Barroso, “nós começamos muito atrás e seguimos um longo caminho para nos tornarmos a democracia relevante e uma das principais economias globais”. O período colonial, como apontou Barroso, deixou o Brasil com idiossincrasias disfuncionais, que, desde então, várias gerações de brasileiros têm tentado superar.
Na visão dele, a qual eu corroboro, o Estado brasileiro tem três disfunções primitivas: o patrimonialismo, o funcionalismo oficial e a cultura da desigualdade. O primeiro surgiu como um legado da tradição ibérica de não distinguir deveres públicos de interesses privados.
- A inclinação para a sobreposição de responsabilidades públicas com agendas particulares tornou-se tão forte que a Constituição brasileira de 1988 teve que proibir explicitamente os funcionários públicos de usar dinheiro público para promoção pessoal.
- A naturalização contraintuitiva do inaceitável é mais bem englobada pela máxima brasileira do “rouba, mas faz”.
Há também uma dependência do Estado em todas as esferas. Os brasileiros se acostumaram a buscar o apoio e o financiamento do governo e isso coloca os benefícios pessoais geralmente acima do dever. Outra máxima popular sintetiza bem essa característica grosseira, que fomenta uma sociedade do favoritismo e da exclusão: “Aos amigos tudo; aos inimigos a lei”.
- Ainda há a forte cultura de desigualdade.
- Uma vez que algumas instituições democráticas ainda são frágeis e o poder da lei nem sempre é aplicável, uma estrutura social lateral baseada na distribuição desigual de privilégios emergiu sustentada por privilégios especiais.
- A máxima do “você sabe com quem está falando?” incorpora esse preceito.
O lado negativo é a violação de normas sociais e das leis do dia a dia, como a corrupção em grande escala que acontece na política e nas empresas. E deve ser combatido integralmente. Do contrário, o “mecanismo” vai se proliferar na sociedade. O “jeitinho” não deveria existir em uma sociedade ideal, na qual eficiência e igualdade são características vitais.
- Contudo, o Brasil está longe de ser uma sociedade ideal.
- O lado bom do jeitinho surge como uma resposta social inteligente para humanizar o sistema, aliviar dificuldades e consertar certas injustiças.
- Portanto, ao contrário do que muitos críticos sugeriram, não deve ser abolido, mas sim reformulado para garantir a preeminência de suas melhores práticas.
: Opinião: Renan Ferreirinha: A ética do jeitinho brasileiro
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O polêmico ‘jeitinho’ brasileiro Os brasileiros possuem uma característica especial que poderia ser mal interpretada no exterior: parecem feitos de borracha. Explico: por exemplo, é difícil ficar bravo com um brasileiro. Nós, espanhóis, ao contrário, ficamos com raiva na primeira oportunidade e soltamos logo um: “E você pior ainda.” O espanhol vai direto ao ponto.
O brasileiro prefere a curva. Custa mais aos brasileiros do que aos argentinos sair às ruas para protestar, por exemplo. Falta de caráter, como dizem alguns, ou antes sabedoria? O jeitinho brasileiro, essa fórmula mágica e criativa para resolver os problemas cotidianos daqueles que não têm acesso ao poder, sempre me pareceu mais próxima a uma criatividade ancestral do que a uma incapacidade de querer encarar as coisas legalmente.
Muito se denegriu esse jeitinho, que na verdade não é nada mais do que, como escreveu alguém, a “saída para uma situação sem saída” e, portanto, com grandes doses de engenho que, segundo Sérgio Buarque de Holanda, é o que cunhou o brasileiro como “o homem cordial”, que procura sempre agradar e que não aceita o impossível.
Talvez quem melhor tenha defendido o tão vilipendiado jeitinho brasileiro tenha sido a filósofa Fernanda Carlos Borges em sua obra A Filosofia do Jeito, Segundo ela, esse modo característico de conduta sobretudo do brasileiro pobre, mas que também contaminou os ricos, “não é a consequência de um atraso”, como sempre foi dito, mas algo que antes revela “um critério ético e uma axiologia sobre um modo de ser no mundo que aceita a participação do imprevisível, da fragilidade, da afetividade e da invenção dentro da organização”.
De fato, apenas quem sofreu durante séculos a força da opressão colonial, a herança maldita de uma escravidão que foi a última a desaparecer do globo (em 1888), cujos escravos foram abandonados à sua sorte, ou o que sofreu sobre seus ombros o peso de uma desigualdade sangrenta que ainda hoje é das maiores do mundo, é capaz de inventar esse jeitinho que de alguma forma o alivia das angústias cotidianas.
Os que sofreram uma contenda sangrenta sabem muito bem o que significa fazer economia de guerra, conformar-se com o essencial, procurar saídas à necessidade e inclusive à fome que só os que já sofreram são capazes de explicar. E só esses podem sentir melhor a sensação de redenção quando a fome começa a desaparecer.
Eu me lembro que, já adulto, depois de ter sofrido como criança as garras da Guerra Civil espanhola, eu continuava sonhando com um forno do qual saia um pão quente, máximo objeto de desejo nunca totalmente satisfeito em meus dias e noites de fome. Os brasileiros mais pobres, que foram sempre maioria, aos quais não restava outra tábua de salvação senão o jeitinho, não podem hoje ser acusados de resignados por não se rebelar quando o poder ainda continua lhes negando às vezes até mesmo o essencial, como o viver numa sociedade com igualdade de direitos, onde se lhes conceda a todos o que precisam para ser cidadãos com dignidade.
- Poderiam sair às ruas, como em outros lugares, dispostos a derrubar o poder de turno; poderiam aliar-se massivamente à desobediência civil.
- Há quem preconize, de fato, com uma imagem dura, que toda essa massa de pobres que se amontoa nas favelas ou vive na marginalidade, com salários que para Europa seriam ainda de fome, poderiam sair um dia de suas tocas e, como um exército de ratos vindos dos esgotos, ocupar a cidade rica, a dos privilegiados, a daqueles que não precisam de jeitinho para sobreviver porque lhes sobram recursos e apoios políticos e judiciais.
Não o farão porque os brasileiros levam em seu DNA a sabedoria de que é melhor “um pássaro na mão do que muitos voando”. E é esse pássaro na mão o que lhes dá hoje a sensação de estar melhorando, embora ainda submersos na classe do andar de baixo. O salário mínimo, com o qual qualquer político morreria de fome, é pouco, mas hoje, com seus pequenos aumentos anuais, é suficiente para que os que nunca tiveram nada possam começar a sonhar.
- Era o pedaço de pão duro que minha mãe me dava, que em espanhol tem um nome muito sonoro e depreciativo: mendrugo, aquele que se dava aos mendigos.
- Às vezes o mendrugo vinha acompanhado de um pedaço de toicinho, cujo colesterol hoje nos assusta mas que então era uma festa.
- Não sabíamos o que era o pernil que meu pai vendia quando matávamos o porco, para poder comprar remédios.
É possível que os brasileiros, pouco a pouco, como ocorreu nas manifestações de junho passado, comecem a tomar consciência, cada vez com mais força, de que melhor do que o jeitinho seria poder atuar como cidadãos com plenos direitos e deveres numa sociedade em que a lei funcione para todos.
- Será, porém, um longo caminho.
- Hoje, dentro da realidade atual, com uma classe média que transladada à Europa ou aos EUA seria qualificada ainda como pobre, as pesquisas revelam, entretanto, que 68% dos brasileiros acreditam que seus filhos viverão melhor do que eles.
- Isso me lembra o que os meteorologistas dizem sobre a temperatura ambiente, quando distinguem entre a temperatura real e a sensação térmica de frio ou calor, que pode ser muito diferente.
O brasileiro pobre sofreu tantos desencantos, tantas opressões por parte do poder, lhe foram oferecidas tão poucas oportunidades de sair do túnel da pobreza real, que hoje ele se agarra com facilidade e até com alívio a essa “sensação” de que as coisas estão melhorando, mais do que à sua realidade concreta.
- É o que noto cada vez que me encontro e converso com essas pessoas da classe baixa.
- Elas inclinam a cabeça quando são lembradas dos abusos, da corrupção, da falta de decoro e sensibilidade daqueles que os governam desde a prefeitura da cidade até o mais alto poder, com um presidente do Senado, por exemplo, viajando de avião oficial às custas dos contribuintes, para fazer um transplante de cabelo.
E explicam; “Nós sabemos muito bem disso, mas sempre foi assim”. E perguntam: “E outros fariam diferente e melhor?”, lembrando talvez que foram sempre enganados por todos. A história lhes ensinou de fato que os poderosos sempre usaram e abusaram de seu poder em proveito próprio.
Mas logo eles olham em volta e vêm estacionado na porta da sua casa o carrinho que sempre viram como um sonho proibido para eles, ou a sua mulher curtindo a novela numa televisão que puderam comprar a prazo e que é, inclusive, igual à do seu patrão, ou vêm com orgulho a filha frequentando uma faculdade online, embora continue trabalhando como faxineira.
Acham que isso lhes basta? Sabem muito bem que não; e à sua maneira continuarão lutando para que o forno de pão continue aceso e possam continuar comendo cada vez melhor, até iogurte, que era um sonho proibido como o pernil da minha infância. E, por enquanto, na esperança de que essa corrente de melhorias que se inaugurou continue seu curso, põem em jogo a sabedoria de seus antepassados de que o melhor é não pedir ainda o impossível para não cair na armadilha de perder o possível.
É um jeito de agir. Os brasileiros não parecem inclinados a revoluções radicais e violentas talvez porque uma experiência de séculos e de povos vizinhos, lhes tenha ensinado que, no final, os poderosos saem sempre mais fortes delas e eles mais pobres e humilhados. Não por acaso, apareceu numa sondagem nacional uma cifra quase cabalística que traz os políticos na cabeça: 66% dos cidadãos pede mudanças, mas ao mesmo tempo, a pessoa que está no poder dirigindo os destinos da nação, a presidenta Dilma Rousseff, aparece como favorita absoluta para as próximas eleições, enquanto que a oposição, que poderia hipoteticamente mudar a situação e fazer essas mudanças, não cresce nem é, de momento, objeto de grandes ilusões.
É como se dissessem: queremos mais, queremos melhor, mas preferimos que as coisas não se rompam totalmente, que continuem melhorando com segurança. Que haja mudanças, mas que sejam feitas pelos que já começaram a nos dar pão quente e algumas das outras coisas que sempre invejamos dos ricos.
- Por isso, nem sequer nos inesperados protestos de junho, os brasileiros exigiram uma revolução, nem uma mudança de regime político, nem uma nova Constituição.
- Pediram apenas maior respeito por seus direitos e uma distribuição mais justa dessas riquezas que um país como o Brasil possui de modo privilegiado e que dariam para que todos pudessem viver numa casa digna de seres humanos, sem que as primeiras chuvas a arrastem como um papel de fumar; para poder se locomover em transportes públicos que não pareçam mais adequados para gado do que pessoas; ou que seus filhos possam estudar em escolas que não estejam classificadas entre as piores do mundo, ou poder se tratar em hospitais decentes sem meses de espera, o que hoje é privilégio de uns poucos.
De borracha? Incapazes de se indignar como eu mesmo cheguei a escrever neste jornal? Um dia a história nos revelará que os brasileiros, em sua aparente incapacidade para reagir diante da corrupção e da injustiça, o que mostram é uma grande capacidade de sabedoria e pragmatismo.
- Uma sabedoria, entretanto, que os responsáveis políticos, os que hoje usam e abusam tantas vezes da paciência dos cidadãos, devem tratar com respeito, já que, do contrário, essa sabedoria poderia se revelar um vulcão que eles acreditavam definitivamente extinto, quando na verdade estava em erupção.
- E como alguém escreveu há séculos nada é mais perigoso e revolucionário do que “a ira dos mansos”.
E junho volta a estar ali na esquina. E as ruas poderiam novamente se encher de descontentes. E, desta vez, se ocorresse, talvez já não víssemos o slogan que percorreu o mundo e que dizia: “Éramos infelizes felizes e não sabíamos”. Hoje, os sábios e jeitosos brasileiros sabem que lhes falta muito ainda para serem verdadeiramente felizes e cidadãos de primeira categoria.
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O que é um jeitinho brasileiro?
“Ai palavras, que estranha potência a vossa”, cantou Cecília Meireles no seu Romanceiro da Inconfidência, Ela tinha toda razão: é realmente incrível o poder das palavras. Algumas delas, por exemplo, se incrustam nas identidades nacionais de tal forma que seus significados passam a fazer parte da ação cotidiana de todos os cidadãos.
Esse é o caso do polêmico “jeitinho brasileiro”, cuja referência é dupla (e, por isso mesmo, dúbia): de um lado, refere-se àquilo que eu vou chamar aqui de “a arte dos contornos” para qualificar a capacidade que nos é própria de se adaptar às circunstâncias, usando algum tipo de arcano “charme” que Sérgio Buarque de Holanda chamou de cordialidade – a arte de agir de acordo com preferências afetivas.
E é precisamente aí que o tal “jeitinho” se torna um problema, porque é este mesmo autor que demonstrou que tal coisa pode ser também quase uma ausência de civilidade e, por isso, um risco aos costumes mais imprescindíveis ao ordenamento democrático.
Nesse segundo caso, dar um “jeitinho” equivale não a uma arte ou a uma qualidade, mas a um vício funesto e a um desvio de caráter, na medida em que contorna as leis e as normas, apelando sempre para a flexibilidade, a negociação, a barganha e a famosa lábia, que geralmente são mães da corrupção, que se agrava ainda mais quando envolta pelo manto sagrado da impunidade.
O jeitinho, afinal, é um modo de agir que dispensa os rigores cogentes da vida em sociedade e promove o individualismo que quer tirar vantagem em tudo, sem nenhum compromisso com o bem comum, que é, antes de qualquer coisa, a meta da política, como arte de viver em conjunto.
- O mundo está cheio de oportunidades para o jeitinho e há apenas um jeito de evitarmos que ele contamine nossas vidas até quando não seja mais possível recuar: levarmos uma vida virtuosa.
- O jeitinho, por isso, não sendo apenas uma prática que encobre os pequenos delitos cotidianos e as divertidas pilantragens que pululam aqui e ali, torna-se um risco cuja gravidade coloca em xeque a vida política como um todo: como afirmou o filósofo Ortega y Gasset, sem uma ideia consistente de bem comum, uma nação fica invertebrada e vai ao chão, desintegrada.
Há quem critique esse mal tipicamente brasileiro em tom espumoso, vendo, contudo, quase exclusivamente o que fazem os outros, especialmente os governantes, ao tempo em que fecham os olhos – “tapar o sol com a peneira” pode ser a versão corriqueira do “jeitinho” – para as suas próprias delinquências: o dano da coisa pública, a sonegação dos impostos, o desrespeito às filas e aos sinais de trânsito, as palavras de ódio contra as minorias etc.
- Como escreveu Aristóteles, “o homem tem muitas maneiras de ser mau e apenas uma maneira de ser bom” e esta maneira é a prática das virtudes.
- O mundo está cheio de oportunidades para o jeitinho e há apenas um jeito de evitarmos que ele contamine nossas vidas até quando não seja mais possível recuar: levarmos uma vida virtuosa, que inclui a prática da honestidade e o compromisso com o bem comum.
E, ao contrário do que se pensa, isso não tirará o otimismo e a alegria tropical que trazemos do berço e nem esgotará o afeto que azeita nossas atitudes – ao contrário, seremos mais felizes apenas na medida em que nos realizarmos plenamente junto com os outros, obedecendo as regras que nós formulamos juntos, democraticamente.
- Por essas e outras, não acho a expressão apenas lastimável como, sobretudo, perigosa, na medida em que, pronunciada assim, sem pompa, ela passa à corrente sanguínea da sociedade e passa a definir o caráter e os (des)valores de nossa gente.
- O “brasileiro” que adjetiva o tal “jeitinho” não é mais do que uma suposição estrangeira (lembremos que a expressão, ao que consta, teria sido usada na década de 1940 por um imigrante que driblou a imigração para conseguir um visto de entrada em nosso país) e, nesse caso, fruto de um contexto específico.
Usá-la para caracterizar um povo não faz sentido algum e muito menos que esse povo a use para descrever a si mesmo. Tal é a gravidade: quando nós, como povo, nos referimos a nós mesmos como pessoas sem caráter e sem valores, não apenas tecemos um comentário infeliz, como, com ele, passamos a autorizar os pequenos delitos cotidianos como se fossem inevitáveis e sem remédio.
- Afinal, esse é o nosso “jeito” de ser, o modo como nós organizamos a nossa vida nesse quinhão de terra que nos cabe habitar.
- Sinceramente, nós, brasileiros e brasileiras, merecemos mais do que isso.
- Os cientistas sociais que me perdoem, mas não somos um povo sem ética mais do que é sem ética qualquer outro povo do mundo.
O “jeitinho”, afinal, não é brasileiro, mas é humano, Usar uma expressão desse quilate contra nós mesmos, é só uma prova da baixo autoestima que gostamos de cultivar e, ao mesmo tempo e acima de tudo, uma medida psicológica que autoriza os delinquentes a (quase) tudo.
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Quem é o autor de dando um jeito no jeitinho?
DEFINIÇÕES E CONCEPÇÕES – Todos nós temos noção do que é o jeitinho brasileiro e podemos identificá-lo em diversas situações cotidianas. Mas é importante entender também o que os estudiosos têm a dizer sobre ele. Dois exemplos são os antropólogos Lívia Barbosa e Roberto DaMatta, que definem o jeito como algo relativo, que pode ser visto tanto como algo bom quanto ruim No livro ” O jeitinho brasileiro: a arte de ser mais igual que os outros”, Livia Barbosa mostra a ambiguidade do conceito: ” o jeitinho é sempre uma forma “especial” de se resolver algum problema ou situação difícil ou proibida; ou uma solução criativa para alguma emergência, seja sob a forma de conciliação, esperteza ou habilidade.
- Portanto, para que uma determinada situação seja considerada jeito, necessita-se de um acontecimento imprevisto e adverso aos objetivos do indivíduo,
- Para resolvê-la, é necessária uma maneira especial, isto é, eficiente e rápida, para tratar do ‘problema’.” Neste mesmo livro, Barbosa traz outro ponto interessante.
O jeitinho brasileiro pode ser visto tanto como um favor, quanto como uma forma de corrupção, Segundo a autora, ele estaria localizado entre esses dois polos, onde o primeiro é positivo e o outro é negativo, podendo pender mais para um lado ou para o outro.
- O que caracterizaria o jeito como algo positivo ou negativo depende da situação em que ele ocorre e a relação que existe entre as pessoas envolvidas.
- Digamos, por exemplo, que você pediu para que uma pessoa fizesse um favor para você.
- Até aí não vemos nenhum problema.
- Podemos pensar que essa pessoa é sua amiga, tornando a situação mais comum ainda.
Mas vamos supor que esse seu amigo seja um funcionário do DETRAN e você irá perder sua CNH por dirigir em alta velocidade. Ou seja, o que era um simples favor começa a se caracterizar como algo ilegal, Isso demonstra os dois pontos: como o favor começa a pender para o polo negativo, a depender da situação, e como a relação entre os indivíduos envolvidos é um fator que contribui para o jeitinho.
Barbosa explica: “Um outro aspecto que singulariza o jeito do favor é o grau de conhecimento entre as pessoas envolvidas na situação. Enquanto eu posso pedir um jeito a um desconhecido, favor não se pede a qualquer um. existe a idéia de que determinados assuntos e situações requerem confiança por parte de quem pede e, portanto, é necessário conhecer com quem se está tratando.” Em Dando um jeito no jeitinho, Lourenço Stelio Rega traz uma ampla variedade de visões.
O autor mostra como são extensas as concepções sobre o conceito, que representam o “jeitinho” desde algo positivo – que retrata a flexibilidade e criatividade do brasileiro em resolver situações – até como uma filosofia de “tentar levar vantagem em tudo”, uma forma de corrupção – nesse caso caracterizando-se como algo negativo.
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Qual a importância do jeitinho na política?
“Ai palavras, que estranha potência a vossa”, cantou Cecília Meireles no seu Romanceiro da Inconfidência, Ela tinha toda razão: é realmente incrível o poder das palavras. Algumas delas, por exemplo, se incrustam nas identidades nacionais de tal forma que seus significados passam a fazer parte da ação cotidiana de todos os cidadãos.
Esse é o caso do polêmico “jeitinho brasileiro”, cuja referência é dupla (e, por isso mesmo, dúbia): de um lado, refere-se àquilo que eu vou chamar aqui de “a arte dos contornos” para qualificar a capacidade que nos é própria de se adaptar às circunstâncias, usando algum tipo de arcano “charme” que Sérgio Buarque de Holanda chamou de cordialidade – a arte de agir de acordo com preferências afetivas.
E é precisamente aí que o tal “jeitinho” se torna um problema, porque é este mesmo autor que demonstrou que tal coisa pode ser também quase uma ausência de civilidade e, por isso, um risco aos costumes mais imprescindíveis ao ordenamento democrático.
Nesse segundo caso, dar um “jeitinho” equivale não a uma arte ou a uma qualidade, mas a um vício funesto e a um desvio de caráter, na medida em que contorna as leis e as normas, apelando sempre para a flexibilidade, a negociação, a barganha e a famosa lábia, que geralmente são mães da corrupção, que se agrava ainda mais quando envolta pelo manto sagrado da impunidade.
O jeitinho, afinal, é um modo de agir que dispensa os rigores cogentes da vida em sociedade e promove o individualismo que quer tirar vantagem em tudo, sem nenhum compromisso com o bem comum, que é, antes de qualquer coisa, a meta da política, como arte de viver em conjunto.
O mundo está cheio de oportunidades para o jeitinho e há apenas um jeito de evitarmos que ele contamine nossas vidas até quando não seja mais possível recuar: levarmos uma vida virtuosa. O jeitinho, por isso, não sendo apenas uma prática que encobre os pequenos delitos cotidianos e as divertidas pilantragens que pululam aqui e ali, torna-se um risco cuja gravidade coloca em xeque a vida política como um todo: como afirmou o filósofo Ortega y Gasset, sem uma ideia consistente de bem comum, uma nação fica invertebrada e vai ao chão, desintegrada.
Há quem critique esse mal tipicamente brasileiro em tom espumoso, vendo, contudo, quase exclusivamente o que fazem os outros, especialmente os governantes, ao tempo em que fecham os olhos – “tapar o sol com a peneira” pode ser a versão corriqueira do “jeitinho” – para as suas próprias delinquências: o dano da coisa pública, a sonegação dos impostos, o desrespeito às filas e aos sinais de trânsito, as palavras de ódio contra as minorias etc.
Como escreveu Aristóteles, “o homem tem muitas maneiras de ser mau e apenas uma maneira de ser bom” e esta maneira é a prática das virtudes. O mundo está cheio de oportunidades para o jeitinho e há apenas um jeito de evitarmos que ele contamine nossas vidas até quando não seja mais possível recuar: levarmos uma vida virtuosa, que inclui a prática da honestidade e o compromisso com o bem comum.
E, ao contrário do que se pensa, isso não tirará o otimismo e a alegria tropical que trazemos do berço e nem esgotará o afeto que azeita nossas atitudes – ao contrário, seremos mais felizes apenas na medida em que nos realizarmos plenamente junto com os outros, obedecendo as regras que nós formulamos juntos, democraticamente.
Por essas e outras, não acho a expressão apenas lastimável como, sobretudo, perigosa, na medida em que, pronunciada assim, sem pompa, ela passa à corrente sanguínea da sociedade e passa a definir o caráter e os (des)valores de nossa gente. O “brasileiro” que adjetiva o tal “jeitinho” não é mais do que uma suposição estrangeira (lembremos que a expressão, ao que consta, teria sido usada na década de 1940 por um imigrante que driblou a imigração para conseguir um visto de entrada em nosso país) e, nesse caso, fruto de um contexto específico.
Usá-la para caracterizar um povo não faz sentido algum e muito menos que esse povo a use para descrever a si mesmo. Tal é a gravidade: quando nós, como povo, nos referimos a nós mesmos como pessoas sem caráter e sem valores, não apenas tecemos um comentário infeliz, como, com ele, passamos a autorizar os pequenos delitos cotidianos como se fossem inevitáveis e sem remédio.
Afinal, esse é o nosso “jeito” de ser, o modo como nós organizamos a nossa vida nesse quinhão de terra que nos cabe habitar. Sinceramente, nós, brasileiros e brasileiras, merecemos mais do que isso. Os cientistas sociais que me perdoem, mas não somos um povo sem ética mais do que é sem ética qualquer outro povo do mundo.
O “jeitinho”, afinal, não é brasileiro, mas é humano, Usar uma expressão desse quilate contra nós mesmos, é só uma prova da baixo autoestima que gostamos de cultivar e, ao mesmo tempo e acima de tudo, uma medida psicológica que autoriza os delinquentes a (quase) tudo.
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Qual a relação entre o jeitinho brasileiro e a corrupção?
DEFINIÇÕES E CONCEPÇÕES – Todos nós temos noção do que é o jeitinho brasileiro e podemos identificá-lo em diversas situações cotidianas. Mas é importante entender também o que os estudiosos têm a dizer sobre ele. Dois exemplos são os antropólogos Lívia Barbosa e Roberto DaMatta, que definem o jeito como algo relativo, que pode ser visto tanto como algo bom quanto ruim No livro ” O jeitinho brasileiro: a arte de ser mais igual que os outros”, Livia Barbosa mostra a ambiguidade do conceito: ” o jeitinho é sempre uma forma “especial” de se resolver algum problema ou situação difícil ou proibida; ou uma solução criativa para alguma emergência, seja sob a forma de conciliação, esperteza ou habilidade.
- Portanto, para que uma determinada situação seja considerada jeito, necessita-se de um acontecimento imprevisto e adverso aos objetivos do indivíduo,
- Para resolvê-la, é necessária uma maneira especial, isto é, eficiente e rápida, para tratar do ‘problema’.” Neste mesmo livro, Barbosa traz outro ponto interessante.
O jeitinho brasileiro pode ser visto tanto como um favor, quanto como uma forma de corrupção, Segundo a autora, ele estaria localizado entre esses dois polos, onde o primeiro é positivo e o outro é negativo, podendo pender mais para um lado ou para o outro.
O que caracterizaria o jeito como algo positivo ou negativo depende da situação em que ele ocorre e a relação que existe entre as pessoas envolvidas. Digamos, por exemplo, que você pediu para que uma pessoa fizesse um favor para você. Até aí não vemos nenhum problema. Podemos pensar que essa pessoa é sua amiga, tornando a situação mais comum ainda.
Mas vamos supor que esse seu amigo seja um funcionário do DETRAN e você irá perder sua CNH por dirigir em alta velocidade. Ou seja, o que era um simples favor começa a se caracterizar como algo ilegal, Isso demonstra os dois pontos: como o favor começa a pender para o polo negativo, a depender da situação, e como a relação entre os indivíduos envolvidos é um fator que contribui para o jeitinho.
Barbosa explica: “Um outro aspecto que singulariza o jeito do favor é o grau de conhecimento entre as pessoas envolvidas na situação. Enquanto eu posso pedir um jeito a um desconhecido, favor não se pede a qualquer um. existe a idéia de que determinados assuntos e situações requerem confiança por parte de quem pede e, portanto, é necessário conhecer com quem se está tratando.” Em Dando um jeito no jeitinho, Lourenço Stelio Rega traz uma ampla variedade de visões.
O autor mostra como são extensas as concepções sobre o conceito, que representam o “jeitinho” desde algo positivo – que retrata a flexibilidade e criatividade do brasileiro em resolver situações – até como uma filosofia de “tentar levar vantagem em tudo”, uma forma de corrupção – nesse caso caracterizando-se como algo negativo.
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O que é um jeitinho brasileiro?
“Ai palavras, que estranha potência a vossa”, cantou Cecília Meireles no seu Romanceiro da Inconfidência, Ela tinha toda razão: é realmente incrível o poder das palavras. Algumas delas, por exemplo, se incrustam nas identidades nacionais de tal forma que seus significados passam a fazer parte da ação cotidiana de todos os cidadãos.
Esse é o caso do polêmico “jeitinho brasileiro”, cuja referência é dupla (e, por isso mesmo, dúbia): de um lado, refere-se àquilo que eu vou chamar aqui de “a arte dos contornos” para qualificar a capacidade que nos é própria de se adaptar às circunstâncias, usando algum tipo de arcano “charme” que Sérgio Buarque de Holanda chamou de cordialidade – a arte de agir de acordo com preferências afetivas.
E é precisamente aí que o tal “jeitinho” se torna um problema, porque é este mesmo autor que demonstrou que tal coisa pode ser também quase uma ausência de civilidade e, por isso, um risco aos costumes mais imprescindíveis ao ordenamento democrático.
Nesse segundo caso, dar um “jeitinho” equivale não a uma arte ou a uma qualidade, mas a um vício funesto e a um desvio de caráter, na medida em que contorna as leis e as normas, apelando sempre para a flexibilidade, a negociação, a barganha e a famosa lábia, que geralmente são mães da corrupção, que se agrava ainda mais quando envolta pelo manto sagrado da impunidade.
O jeitinho, afinal, é um modo de agir que dispensa os rigores cogentes da vida em sociedade e promove o individualismo que quer tirar vantagem em tudo, sem nenhum compromisso com o bem comum, que é, antes de qualquer coisa, a meta da política, como arte de viver em conjunto.
O mundo está cheio de oportunidades para o jeitinho e há apenas um jeito de evitarmos que ele contamine nossas vidas até quando não seja mais possível recuar: levarmos uma vida virtuosa. O jeitinho, por isso, não sendo apenas uma prática que encobre os pequenos delitos cotidianos e as divertidas pilantragens que pululam aqui e ali, torna-se um risco cuja gravidade coloca em xeque a vida política como um todo: como afirmou o filósofo Ortega y Gasset, sem uma ideia consistente de bem comum, uma nação fica invertebrada e vai ao chão, desintegrada.
Há quem critique esse mal tipicamente brasileiro em tom espumoso, vendo, contudo, quase exclusivamente o que fazem os outros, especialmente os governantes, ao tempo em que fecham os olhos – “tapar o sol com a peneira” pode ser a versão corriqueira do “jeitinho” – para as suas próprias delinquências: o dano da coisa pública, a sonegação dos impostos, o desrespeito às filas e aos sinais de trânsito, as palavras de ódio contra as minorias etc.
Como escreveu Aristóteles, “o homem tem muitas maneiras de ser mau e apenas uma maneira de ser bom” e esta maneira é a prática das virtudes. O mundo está cheio de oportunidades para o jeitinho e há apenas um jeito de evitarmos que ele contamine nossas vidas até quando não seja mais possível recuar: levarmos uma vida virtuosa, que inclui a prática da honestidade e o compromisso com o bem comum.
E, ao contrário do que se pensa, isso não tirará o otimismo e a alegria tropical que trazemos do berço e nem esgotará o afeto que azeita nossas atitudes – ao contrário, seremos mais felizes apenas na medida em que nos realizarmos plenamente junto com os outros, obedecendo as regras que nós formulamos juntos, democraticamente.
Por essas e outras, não acho a expressão apenas lastimável como, sobretudo, perigosa, na medida em que, pronunciada assim, sem pompa, ela passa à corrente sanguínea da sociedade e passa a definir o caráter e os (des)valores de nossa gente. O “brasileiro” que adjetiva o tal “jeitinho” não é mais do que uma suposição estrangeira (lembremos que a expressão, ao que consta, teria sido usada na década de 1940 por um imigrante que driblou a imigração para conseguir um visto de entrada em nosso país) e, nesse caso, fruto de um contexto específico.
Usá-la para caracterizar um povo não faz sentido algum e muito menos que esse povo a use para descrever a si mesmo. Tal é a gravidade: quando nós, como povo, nos referimos a nós mesmos como pessoas sem caráter e sem valores, não apenas tecemos um comentário infeliz, como, com ele, passamos a autorizar os pequenos delitos cotidianos como se fossem inevitáveis e sem remédio.
Afinal, esse é o nosso “jeito” de ser, o modo como nós organizamos a nossa vida nesse quinhão de terra que nos cabe habitar. Sinceramente, nós, brasileiros e brasileiras, merecemos mais do que isso. Os cientistas sociais que me perdoem, mas não somos um povo sem ética mais do que é sem ética qualquer outro povo do mundo.
O “jeitinho”, afinal, não é brasileiro, mas é humano, Usar uma expressão desse quilate contra nós mesmos, é só uma prova da baixo autoestima que gostamos de cultivar e, ao mesmo tempo e acima de tudo, uma medida psicológica que autoriza os delinquentes a (quase) tudo.
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Quais são as dimensões do jeitinho brasileiro?
O que é o jeitinho brasileiro? | SocialMente Zé Carioca, personagem simbolizando a malandragem brasileira O Brasil é o país do “jeitinho.” Somos famosos mundialmente por “dar um jeitinho para tudo” e pela nossa malandragem. O potencial brasileiro para a improvisação e para a criatividade, características centrais do jeitinho, é ao mesmo tempo algo que podemos sentir orgulho e vergonha, pois ao mesmo tempo que o jeitinho se refere a uma habilidade refinada para a resolução criativa de problemas, também se refere à nossa capacidade engenhosa de agir corruptamente para obter benefícios pessoais de maneira criativa.
Nas sociedades chinesas, é comum se observar um construto cultural semelhante ao jeitinho, o guanxi, O guanxi também é uma estratégia usada cotidianamente para a resolução de problemas, mas se diferencia do jeitinho em diversos aspectos, principalmente porque o jeitinho não envolve relações previamente existentes entre as pessoas ou a ação de qualquer mecanismo de reciprocidade, como é o caso do guanxi.
O jeitinho pode ser entendido como um tipo de ação visando obter benefício próprio ou a resolução de um problema prático, fazendo uso de criatividade, cordialidade, engano e outros processos sociais, Tanto na antropologia quanto na sociologia, o fenômeno do jeitinho brasileiro têm sido muito estudado e enfatizado como um aspecto central da identidade cultural brasileira.
O símbolo do malandro, ilustrado pelo personagem de desenho na imagem acima, captura a essência deste modo flexível, porém muitas vezes prejudicial a terceiros, de navegar socialmente. Um problema enfrentado nas áreas que tradicionalmente estudam o jeitinho é no seu próprio significado, pois diversas definições costumaram capturar diferentes aspectos do jeitinho sem fazer referência aos outros aspectos.
Foi visando compreender de maneira mais sistemática o jeitinho brasileiro que um grupo de pesquisadores, incluindo vários brasileiros, publicou este ano um artigo no Personality and Social Psychology Bulletin, O que os pesquisadores encontraram nesta pesquisa foi que o jeitinho brasileiro, embora tenha sido tratado como um conceito unitário e coerente por boa parte da literatura em antropologia, sociologia e ciência política, se caracteriza como um fenômeno mais complexo e multifacetado, possuindo diferentes dimensões.
A partir da aplicação de questionários descrevendo situações típicas de jeitinho brasileiro, eles identificaram três principais dimensões: a criatividade, a corrupção e a quebra de normais sociais. A criatividade está relacionada à resolução criativa e inovadora de problemas sem violar normas sociais.
Representando situações nas quais a resolução de problemas se dá por meios ilícitos, identificou-se a dimensão de corrupção. Por último, a quebra de normas sociais representa o uso do jeitinho para burlar normas sociais que dificultam a resolução de um problema.
- A separação destas três dimensões é útil na medida em que estas dimensões se relacionam de maneira diferenciada com outras variáveis psicológicas, e este foi um aspecto investigado em um dos estudos da pesquisa.
- Este segundo estudo avaliou a relação entre o jeitinho e outras variáveis psicológicas conhecidas, como a orientação de dominância social, as atitudes morais e a percepção subjetiva e intersubjetiva de normais sociais.
A relação entre moralidade e jeitinho é especialmente curiosa, pois alguns autores afirmam que a prática generalizada do jeitinho cria condições para o estabelecimento de um clima de cinismo e delinquência para julgar moralmente as ações dos outros, além de modificar a maneira como atos morais são julgados pelas pessoas.
Nessa linha pensamento, os atos passariam a ser mais julgados comparativamente a outros atos morais severos, e sendo menos julgados por si mesmos. Ou seja, a prática do jeitinho nos encaminharia, ao longo do tempo, a julgar ações como estacionar em local proibido ou furar uma fila como menos erradas ou merecedoras de punição do que as ações de políticos corruptos, por exemplo, obtendo assim uma “justificativa” para ações individuais que seriam muito mais amenas.
Em suma, a partir dos dados desta pesquisa, o conceito de jeitinho brasileiro pode ser compreendido de maneira mais clara e abrangente como uma estratégia geral de resolução de problemas, gerados a partir de hierarquias e instituições ineficientes, que envolve a criatividade, a corrupção ou a quebra de normas sociais, comumente visando um benefício pessoal.
Os dados desta pesquisa apoiam a tese de que o jeitinho é um construto cultural particular e complexo que se diferencia em aspectos cruciais de outros construtos, como o guanxi, por exemplo. Ao mesmo tempo que o jeitinho tem um caráter altamente adaptativo, pois se refere à flexibilidade cognitiva dos indivíduos na resolução de problemas, ele também mostra o lado escuro da nossa criatividade para obter recursos de maneira ilícita – que o digam as cuecas dos políticos envolvidos no mensalão.
A propósito, outro trabalho recente investigou este “lado escuro” da criatividade, mas isso é uma história para outro dia! Referências: Ferreira MC, Fischer R, Porto JB, Pilati R, & Milfont TL (2012). Unraveling the mystery of Brazilian jeitinho: A cultural exploration of social norms.
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O que os pesquisadores encontraram no jeitinho brasileiro?
O que é o jeitinho brasileiro? | SocialMente Zé Carioca, personagem simbolizando a malandragem brasileira O Brasil é o país do “jeitinho.” Somos famosos mundialmente por “dar um jeitinho para tudo” e pela nossa malandragem. O potencial brasileiro para a improvisação e para a criatividade, características centrais do jeitinho, é ao mesmo tempo algo que podemos sentir orgulho e vergonha, pois ao mesmo tempo que o jeitinho se refere a uma habilidade refinada para a resolução criativa de problemas, também se refere à nossa capacidade engenhosa de agir corruptamente para obter benefícios pessoais de maneira criativa.
- Nas sociedades chinesas, é comum se observar um construto cultural semelhante ao jeitinho, o guanxi,
- O guanxi também é uma estratégia usada cotidianamente para a resolução de problemas, mas se diferencia do jeitinho em diversos aspectos, principalmente porque o jeitinho não envolve relações previamente existentes entre as pessoas ou a ação de qualquer mecanismo de reciprocidade, como é o caso do guanxi.
O jeitinho pode ser entendido como um tipo de ação visando obter benefício próprio ou a resolução de um problema prático, fazendo uso de criatividade, cordialidade, engano e outros processos sociais, Tanto na antropologia quanto na sociologia, o fenômeno do jeitinho brasileiro têm sido muito estudado e enfatizado como um aspecto central da identidade cultural brasileira.
- O símbolo do malandro, ilustrado pelo personagem de desenho na imagem acima, captura a essência deste modo flexível, porém muitas vezes prejudicial a terceiros, de navegar socialmente.
- Um problema enfrentado nas áreas que tradicionalmente estudam o jeitinho é no seu próprio significado, pois diversas definições costumaram capturar diferentes aspectos do jeitinho sem fazer referência aos outros aspectos.
Foi visando compreender de maneira mais sistemática o jeitinho brasileiro que um grupo de pesquisadores, incluindo vários brasileiros, publicou este ano um artigo no Personality and Social Psychology Bulletin, O que os pesquisadores encontraram nesta pesquisa foi que o jeitinho brasileiro, embora tenha sido tratado como um conceito unitário e coerente por boa parte da literatura em antropologia, sociologia e ciência política, se caracteriza como um fenômeno mais complexo e multifacetado, possuindo diferentes dimensões.
- A partir da aplicação de questionários descrevendo situações típicas de jeitinho brasileiro, eles identificaram três principais dimensões: a criatividade, a corrupção e a quebra de normais sociais.
- A criatividade está relacionada à resolução criativa e inovadora de problemas sem violar normas sociais.
Representando situações nas quais a resolução de problemas se dá por meios ilícitos, identificou-se a dimensão de corrupção. Por último, a quebra de normas sociais representa o uso do jeitinho para burlar normas sociais que dificultam a resolução de um problema.
- A separação destas três dimensões é útil na medida em que estas dimensões se relacionam de maneira diferenciada com outras variáveis psicológicas, e este foi um aspecto investigado em um dos estudos da pesquisa.
- Este segundo estudo avaliou a relação entre o jeitinho e outras variáveis psicológicas conhecidas, como a orientação de dominância social, as atitudes morais e a percepção subjetiva e intersubjetiva de normais sociais.
A relação entre moralidade e jeitinho é especialmente curiosa, pois alguns autores afirmam que a prática generalizada do jeitinho cria condições para o estabelecimento de um clima de cinismo e delinquência para julgar moralmente as ações dos outros, além de modificar a maneira como atos morais são julgados pelas pessoas.
Nessa linha pensamento, os atos passariam a ser mais julgados comparativamente a outros atos morais severos, e sendo menos julgados por si mesmos. Ou seja, a prática do jeitinho nos encaminharia, ao longo do tempo, a julgar ações como estacionar em local proibido ou furar uma fila como menos erradas ou merecedoras de punição do que as ações de políticos corruptos, por exemplo, obtendo assim uma “justificativa” para ações individuais que seriam muito mais amenas.
Em suma, a partir dos dados desta pesquisa, o conceito de jeitinho brasileiro pode ser compreendido de maneira mais clara e abrangente como uma estratégia geral de resolução de problemas, gerados a partir de hierarquias e instituições ineficientes, que envolve a criatividade, a corrupção ou a quebra de normas sociais, comumente visando um benefício pessoal.
- Os dados desta pesquisa apoiam a tese de que o jeitinho é um construto cultural particular e complexo que se diferencia em aspectos cruciais de outros construtos, como o guanxi, por exemplo.
- Ao mesmo tempo que o jeitinho tem um caráter altamente adaptativo, pois se refere à flexibilidade cognitiva dos indivíduos na resolução de problemas, ele também mostra o lado escuro da nossa criatividade para obter recursos de maneira ilícita – que o digam as cuecas dos políticos envolvidos no mensalão.
A propósito, outro trabalho recente investigou este “lado escuro” da criatividade, mas isso é uma história para outro dia! Referências: Ferreira MC, Fischer R, Porto JB, Pilati R, & Milfont TL (2012). Unraveling the mystery of Brazilian jeitinho: A cultural exploration of social norms.
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Por que o jeitinho é tão importante?
Ao mesmo tempo que o jeitinho tem um caráter altamente adaptativo, pois se refere à flexibilidade cognitiva dos indivíduos na resolução de problemas, ele também mostra o lado escuro da nossa criatividade para obter recursos de maneira ilícita – que o digam as cuecas dos políticos envolvidos no mensalão.
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