Gravidez Na Adolescencia Artigo Cientifico?
Nessa perspectiva, a gestação na adolescência é considerada um dos principais fatores de fragilidade que podem afetar seriamente o desenvolvimento do adolescente. Existe uma relação direta de causa e efeito com a pobreza e a baixa escolaridade, sendo consideradas outras importantes vulnerabilidades que impõem limites às oportunidades que os adolescentes têm e terão ao longo de toda a sua vida (COSTA; GUERRA; ARAÚJO, 2016).
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O que acontece com a gravidez na adolescência?
Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no período de 1990 a 2001, mostram que a taxa de fecundidade entre adolescentes de 10 a 14 anos foi duplicada, tendo a taxa de fecundidade, no grupo de mulheres entre 15 e 19 anos, apresentado aumento de 26%, 4
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Por que a prevenção da gravidez na adolescência pode diminuir os índices de mortalidade infantil no Brasil?
Gravidez na adolescência | Artigo Muitos especialistas em saúde pública calculam que os índices de mortalidade infantil poderiam diminuir significativamente, se houvesse prevenção da gravidez na adolescência, no Brasil. Por um capricho da natureza feminina, a idade da primeira menstruação diminuiu progressivamente desde o início do século 20.
Em 1900, as moças menstruavam pela primeira vez ao redor dos 17 anos. Hoje, nem bem completam 11 ou 12 anos e já menstruam. Ninguém sabe ao certo a razão desse fenômeno biológico; é provável que esteja ligado à melhor nutrição das crianças atuais. Até a geração de nossas avós, as mulheres casavam cedo, geralmente antes de entrar na fase reprodutiva.
Mais tarde, menstruavam e vinham os filhos, um atrás do outro, até a menopausa. Viviam em sociedades com taxas altas de mortalidade infantil, nas quais dar à luz dez vezes era a estratégia reprodutiva mais sensata para criar cinco ou seis sobreviventes.
Veja também: Na era da informática, ao contrário, o investimento na educação de uma ou duas crianças consome tanta energia, que os casais responsáveis planejam com extremo cuidado o tamanho de suas famílias. Nas camadas de nível educacional mais alto, as mulheres brasileiras seguem de perto a tendência internacional de completar os estudos, conseguir trabalho e independência financeira antes de pensar em filhos.
Nas maternidades particulares, há muito não causam espanto as primigestas com mais de 40 anos. Paradoxalmente, no entanto, ao lado dessa característica dos novos tempos, convivemos com o antigo problema da gravidez na adolescência, agravado agora pelo início mais precoce da fase fértil das mulheres.
Enquanto as taxas gerais de fecundidade nas décadas de 1970 e 1980 caíram no país inteiro, o número de adolescentes de 15 a 19 anos grávidas aumentou 26%. A Pesquisa Nacional em Demografia e Saúde, realizada em 1996, mostrou que 14% das meninas dessa faixa etária já tinham pelo menos um filho e que as jovens mais pobres apresentavam fecundidade dez vezes maior.
Entre as parturientes atendidas pela rede do SUS no período de 1993 a 1998, houve aumento de 31% dos casos de meninas entre 10 e 14 anos. Nesses cinco anos, 50 mil adolescentes foram parar nos hospitais públicos devido a complicações de abortos clandestinos.
- Quase 3 mil estavam na faixa dos 10 aos 14 anos.
- Como não poderia deixar de ser, a situação é especialmente grave nas regiões mais pobres do país: no Norte e no Nordeste, de cada três partos, uma das mães tem de 10 a 19 anos.
- Mas, mesmo no Sul e no Sudeste, o número de parturientes nessa faixa etária é inaceitável: cerca de 25%.
Muitos especialistas em saúde pública calculam que os índices de mortalidade infantil poderiam diminuir significativamente, se houvesse prevenção da gravidez na adolescência, no Brasil. Grande parte das crianças assim nascidas são filhas de homens que não assumem os deveres inerentes à paternidade.
- Impunes à lei, simplesmente abandonam os filhos aos cuidados da mãe despreparada, com a conivência silenciosa da sociedade machista e discriminatória em relação às mulheres.
- O argumento de que esses homens são irresponsáveis por serem eles também muito jovens nem sempre é verdadeiro, dado o interesse que as adolescentes costumam despertar nos homens mais velhos.
Ficar grávida ainda criança é uma das consequências mais perversas da incompetência de nosso sistema educacional. A menina pobre, sem instrução, que começa a vida com um bebê no colo, dificilmente conseguirá mudar seu destino de miséria e ignorância. No Carandiru, conheci um ladrão conhecido como Latrô, condenado a 47 anos, que começou a assaltar de revólver em punho ao completar 12 anos.
- A idade que minha mãe tinha, quando eu nasci”, contava.
- A coincidência não era motivo de orgulho ou vergonha para ele, apenas constatação de um acontecimento familiar.
- Parece que o Ministério da Saúde está decidido a dedicar mais atenção à prevenção da gravidez na adolescência.
- Entre as medidas adotadas estão a preparação de profissionais para atendimento, divulgação de material educativo, acesso a métodos anticoncepcionais e aos preservativos, além do estímulo à promoção de atividades culturais e esportivas.
Embora essas intervenções sejam fundamentais, a solução do problema não é tarefa exclusiva do governo. A menina que fica grávida aos 12 anos não o faz por decisão prévia, voluntária; engravida por falta de informação, desvantagem econômica ou armadilha da natureza.
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Quais são os desafios para a compreensão e enfrentamento da gravidez na adolescência?
Gravidez na adolescência, iniciação sexual e gênero: perspectivas em disputa PERSPECTIVAS • • O tema da sexualidade adolescente gerou intenso debate na sociedade brasileira em janeiro de 2020, com a proposta de abstinência (ou adiamento da vida sexual) como política pública para o enfrentamento da gravidez na adolescência.
- Discutir gravidez na adolescência em um contexto com profundas desigualdades sociais, raciais/étnicas e de gênero como o do Brasil demanda acuidade, competência teórica e técnica, e principalmente respeito à vida de milhões de adolescentes.
- Esses são sujeitos de direitos, em processo de aprendizado da autonomia, do cuidado e controle de si e da sexualidade, como dimensão inerente às relações sociais.
O tópico entrou em pauta após anúncio do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH) sobre a elaboração de uma Política Nacional de Prevenção ao Risco da Atividade Sexual Precoce. Em 6 de dezembro de 2019, um seminário na Câmara dos Deputados promovido pelo MMFDH abordou o adiamento da iniciação sexual de adolescentes, inspirando-se em iniciativas religiosa (Eu Escolhi Esperar.
- Acessado em Mar/2020) e norte-americana, com a convidada Mary Anne Mosack, presidente da Ascend (, acessado em Fev/2020), uma organização social com atuação na área de programas de educação para evitar riscos sexuais.
- Com a criação da Semana Nacional de Prevenção da Gravidez na Adolescência, pelo Governo Federal, por intermédio da Lei nº 13.798 1 1.
Brasil. Lei nº 13.798, de 3 de janeiro de 2019. Acrescenta art.8º-A à Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), para instituir a Semana Nacional de Prevenção da Gravidez na Adolescência. Diário Oficial da União 2019; 4 jan.
- Em janeiro de 2019, a ser comemorada anualmente na primeira semana de fevereiro, o MMFDH, em parceria com o Ministério da Saúde, iniciou uma campanha nacional de sensibilização de adolescentes sobre os efeitos indesejáveis da “gravidez precoce”.
- Embora o termo “abstinência sexual” não tenha sido adotado, possivelmente pela enorme rejeição e fortes críticas recebidas 2 2.
Sociedade Brasileira de Pediatria. Abstinência sexual na adolescência: o que a ciência evidencia como método de escolha para prevenção de gravidez na adolescência. https://www.sbp.com.br/imprensa/detalhe/nid/abstinencia-sexual-na-adolescencia-o-que-a-ciencia-evidencia-como-metodo-de-escolha-para-prevencao-de-gravidez-na-adolescencia/ (acessado em Mar/2020).
Há o apelo subjacente para a entrada mais tardia na sexualidade no slogan Adolescência Primeiro, Gravidez Depois – Tudo Tem o Seu Tempo 3 3. Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. Campanha visa reduzir altos índices de gravidez precoce no Brasil https://www.mdh.gov.br/todas-as-noticias/2020-2/fevereiro/campanha-visa-reduzir-altos-indices-de-gravidez-precoce-no-brasil (acessado em Mar/2020).
A escolha de não pautar o exercício sexual nessa fase da vida e não enfrentar publicamente a violência sexual que atinge majoritariamente meninas, na infância e adolescência, suprime uma possibilidade importante de diálogo sobre desigualdade de gênero.
A escolha pela abstinência sexual ou adiamento da iniciação sexual pode ser uma opção legítima, de caráter íntimo e pessoal, de qualquer homem ou mulher, em qualquer idade, independentemente de credo religioso. Todavia, a formulação de políticas públicas em um estado democrático precisa estar assentada na perspectiva do respeito aos direitos humanos, ser construída baseando-se nas melhores evidências científicas disponíveis e respeitar a premissa da laicidade do Estado 4 4.
Paiva V. Facing negative reactions to sexuality education through a Multicultural Human Rights framework. Reprod Health Matters 2015; 23:96-106. Ao longo das últimas décadas, pesquisadores de várias áreas disciplinares analisaram exaustivamente as políticas de prevenção à gravidez nos Estados Unidos, não recomendando a estratégia da abstinência sexual como solução única para o aconselhamento de adolescentes e jovens 5 5.
- Luker K. Dubious conceptions: the politics of teenage pregnancy.
- Cambridge: Harvard University Press; 1997., 6 6.
- Schalet AT.
- Beyond abstinence and risk: a new paradigm for adolescent sexual health.
- Womens Health Issues 2011; 21(3 Suppl):S5-7., 7 7.
- Harper C, Henderson JT, Schalet AT, Becker D, Stratton L, Raine TR.
Abstinence and Teenagers: prevention counseling practices of health care providers serving high-risk patients in the United States. Perspect Sex Reprod Health 2010; 42:125-32. Há um posicionamento público da Sociedade de Saúde e Medicina do Adolescente norte-americana 8 8.
- Society for Adolescent Health and Medicine.
- Abstinence-only-until-marriage policies and programs: an updated position paper of the Society for Adolescent Health and Medicine.
- J Adolesc Health 2017; 61:400-3.
- Sobre a necessidade de se adotar uma abordagem compreensiva da sexualidade adolescente, que inclua respeito à diversidade cultural, sexual e de gênero, ao direito de receber informações seguras sobre sexo, sensibilidade de profissionais de saúde e educadores, oportunidades para o conhecimento de métodos de proteção à saúde e prevenção da gravidez 8 8.
Society for Adolescent Health and Medicine. Abstinence-only-until-marriage policies and programs: an updated position paper of the Society for Adolescent Health and Medicine. J Adolesc Health 2017; 61:400-3. Revisões sistemáticas sobre o tema 9 9. Santelli JS, Kantor LM, Grilo SA, Speizer IS, Lindberg LD, Heitel J, et al.
- Abstinence-only-until-marriage: an updated review of US policies and programs and their impact.
- J Adolesc Health 2017; 61:273-80., 10 10.
- Bearman PS, Brückner H.
- Promising the future: virginity pledges and first intercourse.
- Am J Sociol 2001; 106:859-912., 11 11.
- Brückner H, Bearman PS.
- After the promise: the STD consequences of adolescent virginity pledges.
J Adolesc Health 2005; 36:271-8. têm reiterado a ineficácia e o desperdício de recursos públicos aplicados nos programas de educação baseados na premissa da abstinência sexual. Um dos seus efeitos é na verdade um retardo relativo do início da vida sexual (média de dois anos), e maiores chances de que não haja o uso de métodos contraceptivos ao iniciar o exercício da sexualidade 10 10.
- Bearman PS, Brückner H.
- Promising the future: virginity pledges and first intercourse.
- Am J Sociol 2001; 106:859-912., 11 11.
- Brückner H, Bearman PS.
- After the promise: the STD consequences of adolescent virginity pledges.
- J Adolesc Health 2005; 36:271-8.
- Supor uma associação linear ou de causalidade direta entre início da vida sexual e ocorrência de gestação imprevista é outro equívoco.
Ela não apenas desconsidera as mediações e variáveis presentes no contexto de uma relação sexual e de uma possível gravidez, a exemplo, a violência entre pares, os meandros da contracepção, as negociações sexuais, as diferenças hierárquicas no âmbito do par conjugal, o consentimento sexual como dádiva, como também realça a perspectiva do sexo como “perigo”.
Se o início da vida sexual fosse, por si só, responsável pela ocorrência da gravidez na adolescência, como explicaríamos taxas tão díspares entre países diversos? Inúmeros estudos mostram a importância de fatores socioeconômicos, políticos e culturais na maior ou menor incidência de infecções sexualmente transmissíveis (IST) e gestações imprevistas, independentemente da idade de iniciação sexual 6 6.
Schalet AT. Beyond abstinence and risk: a new paradigm for adolescent sexual health. Womens Health Issues 2011; 21(3 Suppl):S5-7., 12 12. Schalet A. Must we fear adolescent sexuality? MedGenMed 2004; 6:44., 13 13. Bozon M. A quel âge les femmes et les hommes commencent-ils leur vie sexuelle? Comparaisons et évolutions réecentes.
- Popul Soc (Paris) 2003; (391):1-4., 14 14. Bozon M.
- Novas normas de entrada na sexualidade no Brasil e na América Latina.
- In: Heilborn ML, Duarte LFD, Peixoto C, Barros ML, organizadores.
- Sexualidade, família e ethos religioso.
- Religião e sexualidade: uma relação íntima.
- Rio de Janeiro: Garamond; 2005.p.301-14.
A diferença reside na existência de políticas públicas com incentivo à educação sexual, o que implica falar sobre sexo, ter disponíveis recursos necessários de prevenção, informações qualificadas, profissionais de saúde e educação capacitados na temática e que saibam abordar as dúvidas dos jovens com a abertura ao diálogo sem moralismos (conceituais ou religiosos), ter suporte de pessoas próximas em quem os jovens possam confiar e ter apoio 15 15.
United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization. International technical guidance on sexuality education: an evidence-informed approach. Paris: United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization; 2018. A prevenção de uma gestação depende também do conhecimento e da possibilidade de exercício de formas diversas de sexo seguro.
Esse conceito, forjado inicialmente no enfrentamento da epidemia do HIV/aids pelo movimento homossexual, vem sendo paulatinamente reinventado 16 16. Parker R. O fim da AIDS? Rio de Janeiro: Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS; 2015. e precisa ser incluído nas políticas de prevenção da gravidez.
O sexo seguro não se restringe ao uso de insumos/dispositivos técnicos de prevenção (métodos contraceptivos, como preservativo e contracepção de emergência), mas demanda desenvolvimento de habilidades relacionais e afetivas no processo de construção da autonomia juvenil, dimensões fundamentais que permitem ao jovem reconhecer e articular desejos e limites sexuais, e a aprender a se antecipar e se preparar para os atos sexuais 6 6.
Schalet AT. Beyond abstinence and risk: a new paradigm for adolescent sexual health. Womens Health Issues 2011; 21(3 Suppl):S5-7. Incluir adolescentes homens nas abordagens para a redução da gravidez permanece um desafio se não for convocada a reflexão sobre masculinidade, virilidade, desigualdade e violência de gênero.
O chamamento à “adolescência primeiro, gravidez depois” seguramente pode passar despercebido àqueles que não se sentem responsáveis pela gravidez/reprodução. Altas taxas de gestações imprevistas 17 17. Ministério da Saúde. Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher. PNDS 2006: relatório final.
Brasília: Ministério da Saúde; 2008., 18 18. Theme-Filha MT, Baldisserotto ML, Fraga ACSA, Ayers S, Gama SGN, Leal MC. Factors associated with unintended pregnancy in Brazil: cross-sectional results from the Birth in Brazil National Survey 2011/2012. Reprod Health 2016; 13 Suppl 3:118.
não estão circunscritas à população juvenil no país, atingindo igualmente mulheres e homens adultos. Essas taxas sinalizam outras dimensões que ultrapassam a falta de informação qualificada ou acesso aos métodos contraceptivos. Apontam para a ausência de políticas públicas que enfoquem a complexidade do exercício da contracepção, independentemente do momento no curso da vida.
O início da vida sexual tende a ser, majoritariamente, na adolescência. Intimamente dependente de concepções sobre gênero e sexualidade, há países em que a iniciação sexual feminina precede à masculina (alguns países africanos) e em outros a iniciação dos rapazes antecede a das moças (América Latina).
Em média, esse evento está compreendido entre 15 e 19 anos de idade 19 19. World Health Organization. The changing world of adolescent sexual and reproductive health and rights. https://www.who.int/news-room/detail/03-02-2020-the-changing-world-of-adolescent-sexual-and-reproductive-health-and-rights (acessado em Mar/2020).
No Brasil, um estudo populacional feito com quase cinco mil jovens em três capitais mostrou que a mediana da idade da iniciação sexual era de 16 anos para os rapazes e em torno de 17 anos para as moças 20 20. Heilborn ML, Aquino EML, Bozon M, Kanuth DR.
O aprendizado da sexualidade: reprodução e trajetórias sociais de jovens brasileiros. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz/Garamond Universitária; 2006. Um estudo feito com escolares matriculados no nono ano do Ensino Fundamental, com idades entre 13 e 17 anos, também mostrou comportamento diferencial entre adolescentes dos sexos masculino e feminino: dentre eles, 36% declararam ter se relacionado sexualmente alguma vez, ao passo que, entre elas, o percentual foi 19,5% 21 21.
Felisbino-Mendes MS, Paula TF, Machado IE, Oliveira-Campos M, Malta DC. Análise dos indicadores de saúde sexual e reprodutiva de adolescentes brasileiros, 2009, 2012 e 2015. Rev Bras Epidemiol 2018; 21 Suppl 1:e180013. Outro desafio para a compreensão e enfrentamento da gravidez na adolescência é a heterogeneidade sociocultural desse público.
- Tratar a gestação compreendida entre 10 e 19 anos sob o mesmo estatuto é outro equívoco.
- O segmento de 10 a 14 anos requer uma abordagem diferenciada.
- Por um lado, as taxas de fecundidade entre adolescentes de 10 a 14 anos têm se mantido constantes nos últimos anos no Brasil, ao contrário da diminuição entre adolescentes de 15 a 19 anos de idade.
Por outro lado, há fortes evidências de que uma parte considerável das relações sexuais entre adolescentes de 10 a 14 anos tende a ser não consensual; a relação entre abuso sexual e gravidez nesta faixa etária é um fenômeno de magnitude nada desprezível 22 22.
Finer LB, Philbin JM. Trends in ages at key reproductive transitions in the United States, 1951-2010. Womens Health Issues 2014; 24:e271-9., 23 23. Madigan S, Wade M, Tarabulsy G, Jenkins J, Shouldice M. Association between abuse history and adolescent pregnancy: a meta-analysis. J Adolesc Health 2014; 55:151-9.
, 24 24. Departamento de Vigilância de Doenças e Agravos não Transmissíveis e Promoção da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde. Estupro e gravidez de adolescentes no Brasil: características e implicações na saúde gestacional, parto e nascimento.
In: Departamento de Vigilância de Doenças e Agravos não Transmissíveis e Promoção da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde, organizador. Saúde Brasil 2017: uma análise da situação de saúde e os desafios para o alcance dos objetivos de desenvolvimento sustentável. Brasília: Ministério da Saúde; 2018.p.237-58.
Outro aspecto complexo é que nem toda gravidez na adolescência é indesejada. Tomar tal equivalência significa ignorar múltiplos contextos juvenis e os significados da reprodução entre as classes sociais. O problema reside na impossibilidade de interromper uma gravidez não pretendida no contexto brasileiro, o que torna a maternidade compulsória para grande parte das mulheres, que temem se arriscar em contextos inseguros e ilegais de abortamento 25 25.
Domingues R, Fonseca S, Leal MC, Aquino EML, Menezes GMS. Aborto inseguro no Brasil: revisão sistemática da produção científica 2008-2018. Cad Saúde Pública 2020; 36 Suppl 1:e00190418., 26 26. Heilborn ML, Cabral CS, Brandão ER, Faro L, Cordeiro F, Azize RL. Itinerários abortivos em contextos de clandestinidade na cidade do Rio de Janeiro – Brasil.
Ciênc Saúde Colet 2012; 17:1699-708. Precisamos antes de tudo ofertar, como Estado, alternativas para adolescentes e jovens construírem projetos que contemplem outras dimensões importantes da vida, como as realizações profissional, acadêmica, artística, esportiva.
Quais as chances de crianças e adolescentes crescerem felizes, realizarem sonhos quando convivem com tamanha pobreza, desigualdade social, violência urbana, de gênero e sexual, desemprego em suas famílias, abandono do poder público no que tange às políticas culturais e de lazer, esportivas, de educação, saneamento, saúde? O infeliz atalho do aconselhamento pela abstinência sexual não ocultará que o problema, de fato, não se restringe às “gravidezes precoces”, mas o que elas nos revelam como sintomas de abandono e indiferença social com segmentos excluídos do país.
Não se pode ignorar a existência de uma política pública e de diretrizes para atenção à saúde de adolescentes e jovens, no âmbito do Ministério da Saúde, que reuniu em sua elaboração pesquisadores, profissionais de saúde, educadores, ativistas, representantes juvenis, gestores públicos, com vasta produção de material técnico, dentro dos marcos internacionais de respeito aos direitos sexuais e reprodutivos 27 27.
Departamento de Ações Programáticas Estratégicas, Secretaria de Atenção em Saúde, Ministério da Saúde. Cuidando de adolescentes: orientações básicas para a saúde sexual e a saúde reprodutiva. Brasília: Ministério da Saúde; 2015., 28 28. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas, Secretaria de Atenção em Saúde, Ministério da Saúde.
Diretrizes nacionais para a atenção integral à saúde de adolescentes e jovens na promoção, proteção e recuperação da saúde. Brasília: Ministério da Saúde; 2010., 29 29. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas, Secretaria de Atenção em Saúde, Ministério da Saúde.
Marco teórico e referencial: saúde sexual e saúde reprodutiva de adolescentes e jovens. Brasília: Ministério da Saúde; 2006. Uma política pública voltada ao exercício responsável da sexualidade na adolescência e ao enfrentamento da desigualdade de gênero, em qualquer pasta ministerial, precisa contemplar o fortalecimento da escolarização, da autonomia pessoal, da capacidade dos adolescentes refletirem sobre suas escolhas afetivas e/ou sexuais, conhecerem e tomarem medidas de proteção à saúde, como uso do preservativo, dos métodos contraceptivos regulares ou de longa duração, da contracepção de emergência, do acesso ao aborto legal, além do combate às discriminações de gênero, ao racismo, ao machismo, à homofobia, à transfobia.
Esses são elementos imprescindíveis para a construção da autonomia juvenil e para o exercício da sexualidade com base na perspectiva do reconhecimento da alteridade e dos direitos humanos. Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq: 431393/2018-4) pelo apoio financeiro.
1 Brasil. Lei nº 13.798, de 3 de janeiro de 2019. Acrescenta art.8º-A à Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), para instituir a Semana Nacional de Prevenção da Gravidez na Adolescência. Diário Oficial da União 2019; 4 jan. 2 3 4 Paiva V. Facing negative reactions to sexuality education through a Multicultural Human Rights framework. Reprod Health Matters 2015; 23:96-106. 5 Luker K. Dubious conceptions: the politics of teenage pregnancy. Cambridge: Harvard University Press; 1997. 6 Schalet AT. Beyond abstinence and risk: a new paradigm for adolescent sexual health. Womens Health Issues 2011; 21(3 Suppl):S5-7. 7 Harper C, Henderson JT, Schalet AT, Becker D, Stratton L, Raine TR. Abstinence and Teenagers: prevention counseling practices of health care providers serving high-risk patients in the United States. Perspect Sex Reprod Health 2010; 42:125-32. 8 Society for Adolescent Health and Medicine. Abstinence-only-until-marriage policies and programs: an updated position paper of the Society for Adolescent Health and Medicine. J Adolesc Health 2017; 61:400-3. 9 Santelli JS, Kantor LM, Grilo SA, Speizer IS, Lindberg LD, Heitel J, et al. Abstinence-only-until-marriage: an updated review of US policies and programs and their impact. J Adolesc Health 2017; 61:273-80. 10 Bearman PS, Brückner H. Promising the future: virginity pledges and first intercourse. Am J Sociol 2001; 106:859-912. 11 Brückner H, Bearman PS. After the promise: the STD consequences of adolescent virginity pledges. J Adolesc Health 2005; 36:271-8. 12 Schalet A. Must we fear adolescent sexuality? MedGenMed 2004; 6:44. 13 Bozon M. A quel âge les femmes et les hommes commencent-ils leur vie sexuelle? Comparaisons et évolutions réecentes. Popul Soc (Paris) 2003; (391):1-4. 14 Bozon M. Novas normas de entrada na sexualidade no Brasil e na América Latina. In: Heilborn ML, Duarte LFD, Peixoto C, Barros ML, organizadores. Sexualidade, família e ethos religioso. Religião e sexualidade: uma relação íntima. Rio de Janeiro: Garamond; 2005.p.301-14. 15 United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization. International technical guidance on sexuality education: an evidence-informed approach. Paris: United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization; 2018. 16 Parker R. O fim da AIDS? Rio de Janeiro: Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS; 2015. 17 Ministério da Saúde. Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher. PNDS 2006: relatório final. Brasília: Ministério da Saúde; 2008. 18 Theme-Filha MT, Baldisserotto ML, Fraga ACSA, Ayers S, Gama SGN, Leal MC. Factors associated with unintended pregnancy in Brazil: cross-sectional results from the Birth in Brazil National Survey 2011/2012. Reprod Health 2016; 13 Suppl 3:118. 19 20 Heilborn ML, Aquino EML, Bozon M, Kanuth DR. O aprendizado da sexualidade: reprodução e trajetórias sociais de jovens brasileiros. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz/Garamond Universitária; 2006. 21 Felisbino-Mendes MS, Paula TF, Machado IE, Oliveira-Campos M, Malta DC. Análise dos indicadores de saúde sexual e reprodutiva de adolescentes brasileiros, 2009, 2012 e 2015. Rev Bras Epidemiol 2018; 21 Suppl 1:e180013. 22 Finer LB, Philbin JM. Trends in ages at key reproductive transitions in the United States, 1951-2010. Womens Health Issues 2014; 24:e271-9. 23 Madigan S, Wade M, Tarabulsy G, Jenkins J, Shouldice M. Association between abuse history and adolescent pregnancy: a meta-analysis. J Adolesc Health 2014; 55:151-9. 24 Departamento de Vigilância de Doenças e Agravos não Transmissíveis e Promoção da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde. Estupro e gravidez de adolescentes no Brasil: características e implicações na saúde gestacional, parto e nascimento. In: Departamento de Vigilância de Doenças e Agravos não Transmissíveis e Promoção da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde, organizador. Saúde Brasil 2017: uma análise da situação de saúde e os desafios para o alcance dos objetivos de desenvolvimento sustentável. Brasília: Ministério da Saúde; 2018.p.237-58. 25 Domingues R, Fonseca S, Leal MC, Aquino EML, Menezes GMS. Aborto inseguro no Brasil: revisão sistemática da produção científica 2008-2018. Cad Saúde Pública 2020; 36 Suppl 1:e00190418. 26 Heilborn ML, Cabral CS, Brandão ER, Faro L, Cordeiro F, Azize RL. Itinerários abortivos em contextos de clandestinidade na cidade do Rio de Janeiro – Brasil. Ciênc Saúde Colet 2012; 17:1699-708. 27 Departamento de Ações Programáticas Estratégicas, Secretaria de Atenção em Saúde, Ministério da Saúde. Cuidando de adolescentes: orientações básicas para a saúde sexual e a saúde reprodutiva. Brasília: Ministério da Saúde; 2015. 28 Departamento de Ações Programáticas Estratégicas, Secretaria de Atenção em Saúde, Ministério da Saúde. Diretrizes nacionais para a atenção integral à saúde de adolescentes e jovens na promoção, proteção e recuperação da saúde. Brasília: Ministério da Saúde; 2010. 29 Departamento de Ações Programáticas Estratégicas, Secretaria de Atenção em Saúde, Ministério da Saúde. Marco teórico e referencial: saúde sexual e saúde reprodutiva de adolescentes e jovens. Brasília: Ministério da Saúde; 2006.
Publicação nesta coleção 03 Ago 2020 Data do Fascículo 2020
Recebido 16 Fev 2020 Revisado 13 Mar 2020 Aceito 25 Mar 2020
: Gravidez na adolescência, iniciação sexual e gênero: perspectivas em disputa
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Quais são os fatores determinantes para a gravidez na adolescência?
Como fatores determinantes para a gravidez na adolescência foram citados o início precoce da vida sexual, influência da mídia, família, falta de informações nas escolas e equipe de saúde, violência sexual, uso de preservativo, aspectos socioeconômicos e
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