Artigo Cientifico Direito Das Sucessões?
Breve noção histórica e conceitual do direito sucessório O Direito Sucessório remota dos primórdios da civilização e permanece vigente em nossa sociedade. O direito sucessório é aquele que regra as relações causa mortis, ou seja, a transferência de bens, direitos e obrigações decorrentes do falecimento do autor da herança.
- É dentro deste ramo do direito que se pretende fazer um estudo histórico e conceitual.
- O objeto deste artigo científico é o estudo histórico e conceitual do Direito Sucessório.
- Seu objetivo geral é analisar, com base nas doutrinas a evolução histórica, bem como a análise conceitual do Direito Sucessório.
O problema central desta pesquisa repousa na verificação dos contornos, das características gerais do Direito Sucessório, revelando sua conceituação e desenvolvimento histórico. Com relação à metodologia, foi utilizado o método indutivo, operacionalizado pelas técnicas da pesquisa bibliográfica, do fichamento, do referente, das categorias básicas e dos conceitos operacionais.
- Para atender seu objetivo geral, foi analisado o contexto histórico da civilização em Roma, a religião da época, assim como o Código Civil Brasileiro de 1916, chegando ao Código Civil de 2002.
- Com relação à metodologia, foi utilizado o método indutivo, operacionalizado pelas técnicas da pesquisa bibliográfica, do fichamento, do referente, das categorias básicas e dos conceitos operacionais.
- 2. BREVE NOÇÃO HISTÓRICA E CONCEITUAL DO DIREITO SUCESSÓRIO
- A origem do direito sucessório brota das primeiras formações familiares, assim, para compreender o direito sucessório pátrio, remete-se ao estudo da história da legislação romana.3
- Nos primórdios da civilização, “havia uma comunhão familiar, ou seja, os bens ficavam com o grupo familiar, já que persistia a comunidade agrária, sendo as terras de propriedade coletiva da gens.”4
Posteriormente, associou-se a sucessão à religião e ao parentesco5. A família estava intimamente ligada à religião, a relação de parentesco era graduada de acordo com o culto. Logo, pertenciam a mesma família aqueles que adotavam a mesma crença.6 As primeiras normas do direito sucessório romano pairavam sobre o princípio de que a sucessão e o culto eram institutos inseparáveis, crença e propriedade estavam interligadas, o direito sucessório tinha como base fundamental a religião.
Desta forma, não se discutia o destino da propriedade sem falar no culto.7 Nesse sentido, destacam-se as palavras de Sílvio de Salvo Venosa8, “A propriedade e culto familiar caminhavam juntos. A propriedade continuava após a morte, em razão da continuidade do culto.” Fustel de Coulanges9 bem discorre sobre as normas sucessórias da época ao abordar os laços entre a religião e a propriedade: Deste princípio se originaram todas as regras do direito sucessório entre os antigos.
A primeira é que sendo a religião doméstica como já foi visto, hereditária, de varão para varão, a propriedade também o era. Assim, sendo o filho o natural e necessário continuador do culto, herda também os bens. Nisso está o surgimento do princípio da hereditariedade; não era pois o resultado de simples convenção entre homens, apenas; deriva de suas crenças e religião, do que há de mais poderoso sobre as almas.
- A transmissão da religião ocorria na linha masculina não se admitia descendência pela linha feminina.
- Não se julgava ser parente pela linha materna e sim paterna, pois eram os descendentes varões que davam continuidade à religião familiar.
- Assim, se um homem morria sem filhos, deveria herdar quem continuasse o seu culto, porém na linha masculina.10 Sobre o tema, Fustel de Coulanges11 discorre: Um homem morria sem filhos; para saber quem seria o seu herdeiro, bastava procurar aquele que deveria ser o continuador do seu culto.
Ora, a religião doméstica transmitia-se pelo sangue, de varão em varão. Só a descendência em linha masculina estabelecia entre dois homens a ligação religiosa, permitindo a um continuar o culto do outro. Como já vimos, o parentesco era apenas a expressão dessa relação.
- Era-se parente porque se tinha o mesmo culto, o mesmo lar originário, e os mesmos antepassados.
- Mas não se era parente por ter nascido da mesma mãe; a religião não admitia o parentesco pelas mulheres.
- Os filhos de duas irmãs, ou os de uma irmã e de um irmão, não tinham entre si laço algum, pois não pertenciam à mesma religião doméstica nem à mesma família.
Observa-se então que a transmissão da herança caía sobre a linha masculina, quem herdava era o descendente varão. Sucedia dessa forma porque a filha ao se casar, adotaria a religião do marido, deste modo não poderia herdar, eis que a propriedade ficaria dissociada da crença, o que não era admitido.12 Segundo Coulanges no direito romano, a filha poderia herdar.
No entanto apenas de forma provisória, herdaria como usufruto, desde que fosse solteira.13 Ressalta-se que o filho varão, ainda que primogênito, poderia ser excluído da sucessão, uma vez que o vínculo intenso entre a religião e a sucessão estabelecia que o filho excluído do culto, seria, por conseguinte, excluído da sucessão.14 Conseqüentemente, o filho adotado poderia herdar, porém não poderia herdar da sua família de origem, pois não pertencia mais àquela religião.15 Por fim, “firma-se a propriedade individual, com o arrefecimento dos laços políticos, religiosos e de parentesco.
Opera-se a transmissão não aos membros da família, mas aos herdeiros, assim considerados os que estavam submetidos diretamente à potestade do pai, e aos escravos instituídos herdeiros por testamento.” 16 Em Roma, o testamento teve início a partir da Lei das XII Tábuas, podendo o autor da herança, dispor de seus bens livremente.17 Contudo, Fustel de Coulanges18 adverte que esta liberdade era um tanto restrita: Para começar, não era permitido ao testador que, ainda em vida, fizesse segredo de sua última vontade; o homem que deserdasse a família e violasse a lei religiosa deveria fazê-lo publicamente, às claras, e suportar durante sua vida todo o ódio que tal ato suscitava.
- E isso não é tudo; era preciso ainda que a vontade do testador recebesse a aprovação da autoridade soberana, isto é, do povo reunido por cúrias, sob a presidência do pontífice.
- Poderia ainda o autor da herança falecer sem deixar testamento.
- Neste caso, a sucessão seguiria a ordem de preferência da época.19 Carlos Roberto Gonçalves20 assim conceitua as três classes de herdeiros vigentes nessa época: Os heredi sui et necessarii eram os filhos sob o poder do pater e que se tornavam sui iuris com sua morte: os filhos, os netos, incluindo-se também, nessa qualificação, a esposa.
Os agnati eram os parentes mais próximos do falecido. Entende-se por agnado o colateral de origem exclusivamente paterna, como o irmão consangüíneo, o tio que fosse filho do avô paterno, e o sobrinho, filho desse mesmo tio. A herança não era deferida a todos os agnados, mas ao mais próximo no momento da morte (agnatus proximus).
- Nesse ínterim, foi adotado um sistema mais próximo do hoje vigente, porém esse sistema somente ganhou forma no Código de Justiniano, fundando-se no parentesco natural21, “estabelecendo-se a seguinte ordem de vocação hereditária: a) os descendentes; b) os ascendentes, em concurso com os irmãos e irmãs bilaterais; c) os irmãos e irmãs, consangüíneos ou uterinos; e d) outros parentes colaterais.”22
- Mais tarde, em meados do século XIII, o Código Civil Francês de 1804, ou Código de Napoleão, adotou o droit de saisine, estabelecendo que a propriedade e a posse da herança passariam aos herdeiros imediatamente, ou seja, com a morte do hereditando.23
- Da mesma forma estabeleceu o Código Civil alemão afirmando a transmissão ipso jure do patrimônio do autor da herança ao herdeiro, ou seja, por efeito direto da lei.24
Também na França, houve a abolição do direito de primogenitura e o privilégio da linha masculina. Por outro lado, estabeleceu-se a igualdade de herdeiros do mesmo grau, havendo diferenciação entre herdeiros e sucessíveis. “Assim, na França, a linha de vocação hereditária inicia-se com os herdeiros (filhos e descendentes; ascendentes e colaterais priveligiados – pai, mãe, irmãos, irmãs e os descendentes destes -, demais ascendentes e seus colaterais – a princípio até o 12º grau, posteriormente até o 4º grau apenas), e, na falta destes, completa-se a vocação com os sucessíveis (filhos então tidos como naturais, o cônjuge sobrevivo e o Estado).” 25 No Brasil, na Consolidação das Leis Civis em seu art.978 e no Código Civil de 1916, em seu art.1572, por influência do Código Civil Francês, adotou-se o Princípio da Saisine.26 Quando o Código Civil brasileiro de 1916 entrou em vigor, reconhecia-se apenas a família constituída do casamento e conseqüentemente, reconheciam-se apenas os filhos advindos do casamento.
- Maria Berenice Dias27 aborda o tema: Reproduzindo o modelo da sociedade do início do século passado, o Código Civil de 1916 reconhecia como família exclusivamente a constituída através do casamento, que era indissolúvel.
- Para assegurar a integridade da família e do patrimônio familiar, não era admitido o reconhecimento dos filhos havidos fora do casamento.
Chamados de “ilegítimos”, não tinham direitos sucessórios. Essa perversa punição foi se abrandando, até que a Constituição Federal baniu todo e qualquer tratamento discriminatório relativo à filiação (CF 227 §6º). (grifos do autor) Ressalta-se que essa discriminação, em conseqüência do reconhecimento apenas da família constituída pelo casamento, estendeu-se aos filhos adotivos e ao concubinato, eis que na época ainda não havia o reconhecimento da União Estável, só vindo este instituto a ser reconhecido, em 1988 pela Constituição da República Federativa do Brasil.
No entanto, salienta-se ainda, que o direito sucessório do companheiro somente foi assegurado e regulamentado em 1994 pela Lei 8.971.28 Em decorrência das transformações sociais, seja no meio cultural ou ético, o Código Civil vigente, instituído pela Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002, sofreu algumas modificações que serão trabalhadas no decorrer da presente pesquisa.29 Atualmente o Direito Sucessório encontra previsão legal no art.5º, incisos XXX e XXXI da Constituição Federal de 1998; no art.10 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro; nos artigos 982 a 1169 do Código de Processo Civil; nos artigos 1784 a 2027 do Código Civil e na Lei 11.441/2007.
Não obstante, cumpre destacar, da doutrina de Maria Berenice Dias30, a crítica ao atual Código Civil brasileiro: Apesar da tentativa de sistematização, de modo freqüente, se flagra dispositivos, títulos e capítulos completamente embaralhados. Basta lembrar que a sucessão na união estável se encontra entre as disposições gerais.
O capítulo dos excluídos da sucessão antecede os títulos que regem o direito dos herdeiros. A deserdação encontra-se entre as normas que regulam o testamento. Todos estes equívocos só servem para evidenciar o pouco caso com que o codificador tratou o tema do direito sucessório. Superada a análise do contexto histórico, passa-se à tentativa conceitual do direito das sucessões.
Para Maria Berenice Dias31 “Suceder significa substituir, ou seja, tomar o lugar do outro”. Para Carlos Roberto Gonçalves32, há uma diferença entre sucessão em sentido amplo e sucessão em sentido estrito: A palavra “sucessão”, em sentido amplo, significa o ato pelo qual uma pessoa assume o lugar de outra, substituindo-a na titularidade de determinados bens.
- Esse também é o entendimento de Silvio de Salvo Venosa33:
- No direito, costuma-se fazer uma grande linha divisória entre duas formas de sucessão: a que deriva de um ato entre vivos, como um contrato, por exemplo, e a que deriva ou tem como causa a morte (causa mortis), quando os direitos e obrigações da pessoa que morre transferem-se para herdeiros e legatários.
- Conclui-se então que o ato de suceder é o ato pelo qual alguém, herdeiro ou legatário, recebe direitos e obrigações, isso no caso dos herdeiros, em decorrência da morte do autor da herança ou de ato inter vivos.
Contudo, o fato gerador da abertura da sucessão é somente a morte, a abertura da sucessão só se dá com o falecimento.34 Porém cumpre salientar que a nomenclatura utilizada pelo Código Civil de 2002 em seu artigo 1.784, qual seja “abertura da sucessão”, é diferente do termo “abertura do inventário”.
- Arnaldo Rizzardo35 diferencia: Como se disse, a morte determina a imediata abertura da sucessão.
- É a mesma um fato natural enquanto rompe o liame da vida, desaparecendo inteiramente a pessoa.
- O inventário representa apenas a formalização da sucessão, a qual, no entanto, se dá com a morte.
- Não passa o mesmo de exteriorização administrativa da transmissão.
Por isso, é evidente que independe da promoção do inventário o exercício de ações que exijam a preservação dos bens. Dessa forma, resta claro o contexto histórico, bem como a análise conceitual do Direito Sucessório.3. CONSIDERAÇÕES FINAIS Após o presente estudo, observou-se que o Direito Sucessório apesar de atual remonta das primeiras civilizações.
- Pode-se ainda ter a conclusão de que muitos artigos vigentes no Código Civil de 2002 encontram-se ultrapassados devido estes terem sido baseados em Códigos Anteriores.
- Portanto, ainda que atual, o Código Civil de 2002 possui muitas peculiaridades de códigos anteriores, sendo necessário o estudo histórico para a compreensão de alguns princípios nele existentes.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS COULANGES, Fustel de. A cidade antiga. São Paulo: Editora Martin Claret Ltda., 2008. DIAS, Maria Berenice. Manual das sucessões. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume VII: direito das sucessões.2 ed.
- Rev. ampl. e atual.
- São Paulo: Saraiva, 2008.
- RIZZARDO, Arnaldo.
- Direito das sucessões: Lei nº 10.406, de 10.01.2002.2ª ed.
- Rio de Janeiro: Forense, 2005.
- VENOSA, Sílvio de Salvo.
- Direito civil: direito das sucessões.11 ed.
- São Paulo: Atlas, 2011.
- NOTAS Acadêmica do 9? período do curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI.
Bolsista do Projeto Pesquisa do art.170 da Constituição do Estado de Santa Catarina 2 Doutoranda pela Universidade de Alicante na Espanha. Mestre em Ciência Jurídica, Especialista em Direito Processual Civil, Graduada em Direito. Atualmente é professora de graduação e de pós graduação em Direito Civil e Direito Processual Civil.
- Coordenadora de pós graduação em Direito Processual Civil da Universidade do Vale do Itajaí.
- Advogada.3 DIAS, Maria Berenice.
- Manual das sucessões.
- São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008.p.25 4 RIZZARDO, Arnaldo.
- Direito das sucessões: Lei nº 10.406, de 10.01.2002.2ª ed.
- Rio de Janeiro: Forense, 2005.p.03 5 _.p.03 6 COULANGES, Fustel de.
A cidade antiga. São Paulo: Editora Martin Claret Ltda., 2008.p.78-79 7 _.p.78 8 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito das sucessões.11 ed. São Paulo: Atlas, 2011.p.03 9 COULANGES, Fustel de. A cidade antiga. São Paulo: Editora Martin Claret Ltda., 2008.p.78-79 10 _.p.85 11 _.p.85 12 GONÇALVES, Carlos Roberto.
- Direito civil brasileiro, volume VII: direito das sucessões.2 ed. rev. ampl. e atual.
- São Paulo: Saraiva, 2008.p.03 13 COULANGES, Fustel de.
- A cidade antiga.
- São Paulo: Editora Martin Claret Ltda., 2008.p.81 14 _.p.86 15 _.p.87 16 RIZZARDO, Arnaldo.
- Direito das sucessões: Lei nº 10.406, de 10.01.2002.2ª ed.
Rio de Janeiro: Forense, 2005.p.03 17 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume VII: direito das sucessões.2 ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008.p.03 18 COULANGES, Fustel de. A cidade antiga. São Paulo: Editora Martin Claret Ltda., 2008.p.89 19 RIZZARDO, Arnaldo.
Direito das sucessões: Lei nº 10.406, de 10.01.2002.2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005.p.04 20 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume VII: direito das sucessões.2 ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008.p.03-04 21 RIZZARDO, Arnaldo. Direito das sucessões: Lei nº 10.406, de 10.01.2002.2ª ed.
Rio de Janeiro: Forense, 2005.p.04 22 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume VII: direito das sucessões.2 ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008.p.04 23 _.p.04 24 _.p.04 25 _.p.05 26 _.p.05 27 DIAS, Maria Berenice. Manual das sucessões.
São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008.p.26 28 _.p.26-27 29 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume VII: direito das sucessões.2 ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008.p.06 30 DIAS, Maria Berenice. Manual das sucessões. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008.p.28 31 _.p.28 32 GONÇALVES, Carlos Roberto.
Direito civil brasileiro, volume VII: direito das sucessões.2 ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008.p.01-02 33 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito das sucessões.11 ed. São Paulo: Atlas, 2011.p.01 34 RIZZARDO, Arnaldo. Direito das sucessões: Lei nº 10.406, de 10.01.2002.2ª ed.
Rio de Janeiro: Forense, 2005.p.22 35 _.p.22-24 Data de elaboração: maio/2011 BENDLIN, Samara Loss.Breve noção histórica e conceitual do direito sucessório. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a.14, nº 752. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-civil-familia-e-sucessoes/2334/breve-nocao-historica-conceitual-direito-sucessorio,
Acesso em 16 out.2011. : Breve noção histórica e conceitual do direito sucessório
Ver resposta completa
Contents
- 1 Quais são as características peculiares do dreito sucessório?
- 2 Por que não podemos ignorar o direito sucessório?
- 3 Quais as consequências da Sucessão?
Quais são as características peculiares do dreito sucessório?
Em matéria de Direito das Sucessões, 2020 foi um ano de novas percepções O ano pandêmico de 2020 colocou o ser humano diante de sua finitude. O reflexo jurídico dessa realidade lançou certo interesse no Direito das Sucessões. Uma visão panorâmica do que se produziu nos campos legislativo, doutrinário e jurisprudencial traz logo à mente duas palavras: novidade e amadurecimento. De um lado, visualiza-se uma mudança dos comportamentos sociais quanto à transmissão c ausa mortis, o que é evidenciado pelas proposições inovadoras de juristas que estudam o fenômeno sucessório, a denotar uma tendência ao rompimento com antigos estigmas e dogmas orientadores do Direito das Sucessões.
- De outro, parece haver a maturidade sintetizada em um movimento, simultâneo, de pessoas engajadas na reconstrução da disciplina sob novas lentes e a partir de fundamentos mais próximos aos princípios e valores que o Direito contemporâneo deve obedecer.
- Quanto às novidades, a primeira delas reflete uma alteração dos comportamentos sociais, que se voltam à ampliação dos espaços de autonomia na sucessão.
Nesse sentido, ganha relevância o que em doutrina se alcunhou como planejamento sucessório e um de seus escopos é proporcionar ao titular de certo patrimônio decida, na medida do possível, o destino dos próprios bens. Esses programas de sucessão tiveram, sem sombra de dúvida, uma maior adesão no ano de 2020.
- Com efeito, segundo dados do Conselho Notarial do Brasil, uma comparação entre os meses de abril e junho demonstra aumento médio, no país, de 134% no número de testamentos realizados em cartório de notas.
- A angustiante convivência diária com a morte e a urgente reflexão sobre a finitude da vida, realidades impostas ao cidadão pela pandemia, aparecem como as razões centrais desta alteração de perfil comportamental.
Inclusive, nesse sentido, observaram os tabeliães brasileiros uma procura maior de informações sobre o ato testamentário por parte dos idosos e dos jovens com comorbidades, além dos profissionais de saúde, ou seja, pessoas mais expostas aos riscos de letalidade da Covid-19,
Em direção semelhante, o momento de exceção trouxe consigo uma lei especial, o Regime Jurídico Emergencial e Transitório das Relações Privadas (Lei 14.010/2020), cujos dispositivos buscaram imprimir um tratamento diferenciado às relações entre particulares ao longo da crise econômico-sanitária, ou, ao menos, por um período temporal fixo de sua duração.
Quanto ao Direito das Sucessões, a única mudança não gerou grandes impactos práticos. Com efeito, o caput do artigo 16 do RJET previu a prorrogação do termo inicial do já desgastado prazo para abertura de inventário, cujos dois meses (artigo 611 do Código de Processo Civil) passaram a ser contados a partir de 30 de outubro de 2020, e não da abertura da sucessão.
O descumprimento de tal norma, com efeito, nunca ocasionou qualquer sanção processual ou civil; diversamente, a consequência do não atendimento do prazo importa na aplicação de multa sobre o ITCM (Imposto de Transmissão Causa Mortis) devido na sucessão, cuja sanção é comumente prevista nas legislações estaduais desta espécie de imposto.
Portanto, sem alteração da regra estadual, que o legislador federal não tem atribuição para modificar, o contribuinte continuou sujeito às penalidades impostas pelo Fisco local. Portanto, o RJET, na realidade, deve ser lido como um incentivo para sensibilizar os Estados à adesão da prorrogação ali disposta.
- A previsão do parágrafo único do mesmo artigo 16 tão pouco se apresentou mais efetiva.
- Nesse dispositivo, o RJET prorrogou o prazo de conclusão do inventário de 12 meses, também previsto no artigo 611, CPC, o qual é impróprio e descumprido cotidianamente pelos interessados (inclusive o Poder Judiciário), mas sem que haja qualquer censura.
Sob essa perspectiva, ressaltam-se características peculiares do Direito Sucessório, quais sejam, o conservadorismo e o engessamento, frutos de uma lei que não corresponde aos anseios sociais e que não tem previsões concretas de mudança. Diante desse cenário, torna-se essencial o magistério da doutrina, o qual também foi palco da propositura de novas soluções, sem descurar da rigidez técnica e dogmática.
Conforme a abertura de caminhos pelos estudiosos do fenômeno sucessório, suscitaram-se possibilidades capazes de auxiliar a concretização dos três objetivos fundamentais de seu planejamento: 1) a já mencionada expansão da autonomia do titular do patrimônio; 2) a rápida passagem dos bens aos herdeiros; e 3) a legítima economia tributária, ainda que sob as amarras legislativas.
Aliás, esse itinerário ocorreu em consonância com a ampla concepção de um sistema brasileiro de sucessões, aqui reiterada, no sentido de que o fenômeno sucessório deve ser compreendido a partir de três disciplinas: 1) o Direito Civil, que trata dos aspectos subjetivo (sucessores) e objetivo (herança) da sucessão; 2) o Direito Processual Civil e o Direito Notarial, ambos concernentes ao procedimento de inventário (obrigatório em nosso país); e o 3) Direito Tributário, o qual estrutura incidência de impostos (não somente o ITCM) na sucessão.
- Nessa perspectiva, no âmbito do Direito Civil, destacam-se dois lançamentos editoriais.
- Primeiro, o livro “Arquitetura do Planejamento Sucessório, Tomo II”, organizado por Daniele Chaves Teixeira, continua o sucesso do já obrigatório Tomo I e traz uma síntese dos mais contemporâneos debates sobre o tema.
Por essa razão, torna-se inegável a conclusão de que o trabalho da autora-organizadora é um dos principais motivos para a disciplina se renovar e consolidar no direito brasileiro. Depois, mas não menos importante, chama atenção o sétimo volume da coleção “Fundamentos de Direito Civil”, escrito por Gustavo Tepedino, Ana Luiza Maia Nevares e Rose Melo Vencelau Meireles.
Isso porque os autores inovaram no tratamento da matéria dentro dos manuais sobre a transmissão causa mortis ao destinar capítulo próprio apenas para o planejamento sucessório. Também o livro “Coronavírus: impactos no Direito de Família e Sucessões”, resultado de uma coordenação cuidadosa e, ao mesmo tempo, rápida, intentada por Ana Luiza Maia Nevares, Marília Pedroso Xavier e Silvia Felipe Marzagão, trouxe importantes colaborações a respeito dos efetivos impactos da Covid-19 no direito sucessório, logo nos primeiros meses da pandemia.
Nesse sentido, Daniela Carvalho de Mucilo e Daniele Chaves Teixeira enfrentaram a urgência da organização patrimonial diante do momento presente em “COVID-19 e Planejamento Sucessório: não há mais momento para postergar”. Já Ana Luiza Maia Nevares discorreu sobre o pragmático tema da atribuição de validade e eficácia aos testamentos particulares feitos durante o isolamento social (“Como testar em momento de pandemia e isolamento social”).
- Ainda no mercado editorial, Lívia Teixeira Leal consolidou como indispensável a obra que transmite ao público sua dissertação (“Internet e morte do usuário: propostas para o tratamento jurídico post mortem do conteúdo inserido na rede”) e que se encontra na segunda edição.
- Sobre este tema, aguarda-se a obra coletiva coordenada por Lívia Teixeira Leal e Ana Carolina Brochado Teixeira, que certamente trará mais reflexões sobre a intermitência da morte no mundo virtual.
Por falar em internet, o protagonismo dos livros nesta retrospectiva deve ser compartilhado por eventos online, os quais, impulsionados pela necessidade do afastamento social, aproximou o mundo jurídico por aulas, palestras, debates e lives, com ampla difusão virtual do conhecimento.
Em tal seara, as duas edições do “Congresso de Arquitetura do Planejamento Sucessório”, coordenadas por Daniele Chaves Teixeira e Simone Tassinari Fleischmann, merecem lembrança. Com efeito, a transmissão online do conhecimento também refletiu o amadurecimento e sistematização do conteúdo produzido sobre questões há muito debatidas.
Assim, foram notáveis os esforços de Simone Tassinari Fleischmann na seara das ligações entre o Direito das Sucessões e o Direito Empresarial. Nesse campo, a autora destrinchou as vantagens e as desvantagens da organização do patrimônio familiar através de holdings, conteúdo apresentado ao longo de eventos e palestras.
- Sob esse prisma, embora pareça evidente certa intensidade na produção de artigos e também na realização de palestras sobre o planejamento sucessório, ainda produzem-se poucas teses e dissertações cujo objeto de pesquisa relacione-se ao campo do Direito das Sucessões como um todo.
- Em tal âmbito, com certeza, notou-se maturidade e aprofundamento de estudos de fôlego a respeito do instituto da legítima e da proteção dos herdeiros necessários, temas debatidos há muito tempo em congressos e artigos científicos.
Sob esta perspectiva, dentro do Programa de Direito Civil da USP, houve a publicação dos primeiros resultados do aguardado trabalho de pós-doutorado desenvolvido por Flávio Tartuce, sob a orientação de José Fernando Simão, os quais se encontram no artigo “Fundamentos de Direito das Sucessões em outros sistemas e no Brasil”, publicado na Revista Brasileira de Direito Civil,
O trabalho oferece um rico estudo comparatista, capaz de orientar medidas de alteração legislativa quanto à disciplina brasileira da sucessão necessária. No mesmo programa, também ocorreu a defesa da tese de doutorado de Bruno Marques Ribeiro, sob o título “O Direito Sucessório brasileiro, a Autonomia e a Solidariedade: uma análise sobre a necessidade de revisão do instituto da legítima no Direito Civil”, orientada por José Luiz Gavião de Almeida.
Já no Programa de Pós-Graduação em Direito Civil da UERJ, dois trabalhos referentes à legítima, orientados por Heloísa Helena Barboza, foram defendidos no início do ano. Nesse sentido, a dissertação de Ana Carolina Velmovitsky Stern enfrentou a posição do cônjuge e do companheiro como herdeiro necessário e a possibilidade de derrogá-la mediante pacto sucessório, oferecendo soluções hermenêuticas de relativização da proibição contida no artigo 426, CC.
Enquanto isso, Caio Ribeiro Pires — coautor deste texto — traçou, em sua dissertação, uma releitura do instituto da legítima, abordando tanto uma revisão das escolhas legislativas brasileiras ao longo do tempo, quanto uma proposta de mudança de lei e, ainda, uma sugestão interpretativa de harmonização da sucessão necessária atual aos princípios constitucionais.
Ao que toca o viés processual do fenômeno sucessório, a possibilidade de estipularem-se negócios jurídicos processuais no testamento, além da cláusula compromissória, representa a novidade mais debatida. O tema foi abordado por Daniel Bucar, em coautoria com Yves Lima Nascimento, aqui na ConJur e também se configurou objeto de exposição de Mário Luiz Delgado no II Congresso Arquitetura do Planejamento Sucessório, em palestra nomeada “Soluções extrajudiciais para planejamento sucessório”.
Na mesma seara, celebra-se o sucesso da obra “Inventário e partilha — teoria e prática”, de Conrado Paulino da Rosa e Marco Antônio Rodrigues, demonstrado por ocasião de sua segunda edição. Enquanto isso, na seara tributária do sistema sucessório os autores deste texto aprofundaram-se na pesquisa do tema ao longo do ano, sobre os mais diversos prismas.
Citem-se, de modo breve, três deles. Primeiro, o planejamento sucessório tributário e a autonomia privada do sucessor-contribuinte para inventariar bens móveis em qualquer Estado da federação e, então, escolher pagar tributo economicamente favorável a título de ITCM.
- O assunto veio à tona a partir de uma notícia de julgado do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, também deste ano, referendando tal estratégia de elisão fiscal.
- Depois, pensou-se na análise da incidência tributária sobre a sucessão a partir de uma perspectiva de todo o Sistema Tributário Nacional, não só do ITCM (que inclui o ITBI e o Imposto de Renda sobre ganho de capital).
E, ainda, texto que se encontra no prelo voltado a identificar as peculiaridades da incidência de ITCM sobre a transmissão de bens digitais. Mais uma vez, recorre-se à prospecção para comunicar que todas essas questões, entre outras, serão tratadas dentro de futura obra a ser desenvolvida por estes autores cujo escopo será a reunião da disciplina tributária no direito sucessório.
- Por último, sublinham-se algumas decisões do Poder Judiciário que mostram coerência aos estudos desenvolvidos a respeito das possibilidades e limites do planejamento sucessório, especialmente na esfera tributária da sucessão.
- Dessa maneira, o Supremo Tribunal Federal destaca-se com a conclusão de um importante julgamento e início de outro.
Sob essa perspectiva, definiu-se no tema 796 que o ITBI incide sobre a transmissão de imóveis à pessoa jurídica desde que o valor dos bens exceda o limite do capital social a ser integralizado, não se aplicando completamente a não incidência tributária do artigo 156, inciso I, CR.
Tal decisão apresentará grandes impactos quanto à constituição de holdings para fins de planejamento sucessório. Ainda, iniciou-se o julgamento que discute a constitucionalidade da incidência de ITCM sobre a transmissão de bens, do autor da herança, situados no exterior aos herdeiros residentes no Brasil (Tema 825).
Embora o julgamento esteja suspenso por pedido de vista do ministro Alexandre Moraes, o relator, ministro Dias Toffoli, seguido pelo ministro Luiz Edson Fachin, votou reconhecendo a inconstitucionalidade de os Estados cobrarem tal imposto até que seja promulgada e sancionada Lei Federal Complementar disciplinando a questão.
é advogado do escritório Bucar Marano Advogados, parecerista, professor de Direito Civil da Uerj e do IBMEC-RJ, doutor e mestre em Direito Civil pela Uerj e especialista em Direito Civil pela Universitá degli Studi di Camerino,Caio Ribeiro Pires é advogado do escritório Bucar Marano advogados e mestre em Direito Civil pela Uerj.Revista Consultor Jurídico, 13 de dezembro de 2020, 10h05
: Em matéria de Direito das Sucessões, 2020 foi um ano de novas percepções
Ver resposta completa
Qual o viés processual do fenômeno sucessório?
Ao que toca o viés processual do fenômeno sucessório, a possibilidade de estipularem-se negócios jurídicos processuais no testamento, além da cláusula compromissória, representa a novidade mais debatida.
Ver resposta completa
Quais são as proposições inovadoras de juristas que estudam o fenômeno sucessório?
Em matéria de Direito das Sucessões, 2020 foi um ano de novas percepções O ano pandêmico de 2020 colocou o ser humano diante de sua finitude. O reflexo jurídico dessa realidade lançou certo interesse no Direito das Sucessões. Uma visão panorâmica do que se produziu nos campos legislativo, doutrinário e jurisprudencial traz logo à mente duas palavras: novidade e amadurecimento. De um lado, visualiza-se uma mudança dos comportamentos sociais quanto à transmissão c ausa mortis, o que é evidenciado pelas proposições inovadoras de juristas que estudam o fenômeno sucessório, a denotar uma tendência ao rompimento com antigos estigmas e dogmas orientadores do Direito das Sucessões.
De outro, parece haver a maturidade sintetizada em um movimento, simultâneo, de pessoas engajadas na reconstrução da disciplina sob novas lentes e a partir de fundamentos mais próximos aos princípios e valores que o Direito contemporâneo deve obedecer. Quanto às novidades, a primeira delas reflete uma alteração dos comportamentos sociais, que se voltam à ampliação dos espaços de autonomia na sucessão.
Nesse sentido, ganha relevância o que em doutrina se alcunhou como planejamento sucessório e um de seus escopos é proporcionar ao titular de certo patrimônio decida, na medida do possível, o destino dos próprios bens. Esses programas de sucessão tiveram, sem sombra de dúvida, uma maior adesão no ano de 2020.
Com efeito, segundo dados do Conselho Notarial do Brasil, uma comparação entre os meses de abril e junho demonstra aumento médio, no país, de 134% no número de testamentos realizados em cartório de notas. A angustiante convivência diária com a morte e a urgente reflexão sobre a finitude da vida, realidades impostas ao cidadão pela pandemia, aparecem como as razões centrais desta alteração de perfil comportamental.
Inclusive, nesse sentido, observaram os tabeliães brasileiros uma procura maior de informações sobre o ato testamentário por parte dos idosos e dos jovens com comorbidades, além dos profissionais de saúde, ou seja, pessoas mais expostas aos riscos de letalidade da Covid-19,
Em direção semelhante, o momento de exceção trouxe consigo uma lei especial, o Regime Jurídico Emergencial e Transitório das Relações Privadas (Lei 14.010/2020), cujos dispositivos buscaram imprimir um tratamento diferenciado às relações entre particulares ao longo da crise econômico-sanitária, ou, ao menos, por um período temporal fixo de sua duração.
Quanto ao Direito das Sucessões, a única mudança não gerou grandes impactos práticos. Com efeito, o caput do artigo 16 do RJET previu a prorrogação do termo inicial do já desgastado prazo para abertura de inventário, cujos dois meses (artigo 611 do Código de Processo Civil) passaram a ser contados a partir de 30 de outubro de 2020, e não da abertura da sucessão.
O descumprimento de tal norma, com efeito, nunca ocasionou qualquer sanção processual ou civil; diversamente, a consequência do não atendimento do prazo importa na aplicação de multa sobre o ITCM (Imposto de Transmissão Causa Mortis) devido na sucessão, cuja sanção é comumente prevista nas legislações estaduais desta espécie de imposto.
Portanto, sem alteração da regra estadual, que o legislador federal não tem atribuição para modificar, o contribuinte continuou sujeito às penalidades impostas pelo Fisco local. Portanto, o RJET, na realidade, deve ser lido como um incentivo para sensibilizar os Estados à adesão da prorrogação ali disposta.
A previsão do parágrafo único do mesmo artigo 16 tão pouco se apresentou mais efetiva. Nesse dispositivo, o RJET prorrogou o prazo de conclusão do inventário de 12 meses, também previsto no artigo 611, CPC, o qual é impróprio e descumprido cotidianamente pelos interessados (inclusive o Poder Judiciário), mas sem que haja qualquer censura.
Sob essa perspectiva, ressaltam-se características peculiares do Direito Sucessório, quais sejam, o conservadorismo e o engessamento, frutos de uma lei que não corresponde aos anseios sociais e que não tem previsões concretas de mudança. Diante desse cenário, torna-se essencial o magistério da doutrina, o qual também foi palco da propositura de novas soluções, sem descurar da rigidez técnica e dogmática.
Conforme a abertura de caminhos pelos estudiosos do fenômeno sucessório, suscitaram-se possibilidades capazes de auxiliar a concretização dos três objetivos fundamentais de seu planejamento: 1) a já mencionada expansão da autonomia do titular do patrimônio; 2) a rápida passagem dos bens aos herdeiros; e 3) a legítima economia tributária, ainda que sob as amarras legislativas.
Aliás, esse itinerário ocorreu em consonância com a ampla concepção de um sistema brasileiro de sucessões, aqui reiterada, no sentido de que o fenômeno sucessório deve ser compreendido a partir de três disciplinas: 1) o Direito Civil, que trata dos aspectos subjetivo (sucessores) e objetivo (herança) da sucessão; 2) o Direito Processual Civil e o Direito Notarial, ambos concernentes ao procedimento de inventário (obrigatório em nosso país); e o 3) Direito Tributário, o qual estrutura incidência de impostos (não somente o ITCM) na sucessão.
Nessa perspectiva, no âmbito do Direito Civil, destacam-se dois lançamentos editoriais. Primeiro, o livro “Arquitetura do Planejamento Sucessório, Tomo II”, organizado por Daniele Chaves Teixeira, continua o sucesso do já obrigatório Tomo I e traz uma síntese dos mais contemporâneos debates sobre o tema.
Por essa razão, torna-se inegável a conclusão de que o trabalho da autora-organizadora é um dos principais motivos para a disciplina se renovar e consolidar no direito brasileiro. Depois, mas não menos importante, chama atenção o sétimo volume da coleção “Fundamentos de Direito Civil”, escrito por Gustavo Tepedino, Ana Luiza Maia Nevares e Rose Melo Vencelau Meireles.
Isso porque os autores inovaram no tratamento da matéria dentro dos manuais sobre a transmissão causa mortis ao destinar capítulo próprio apenas para o planejamento sucessório. Também o livro “Coronavírus: impactos no Direito de Família e Sucessões”, resultado de uma coordenação cuidadosa e, ao mesmo tempo, rápida, intentada por Ana Luiza Maia Nevares, Marília Pedroso Xavier e Silvia Felipe Marzagão, trouxe importantes colaborações a respeito dos efetivos impactos da Covid-19 no direito sucessório, logo nos primeiros meses da pandemia.
Nesse sentido, Daniela Carvalho de Mucilo e Daniele Chaves Teixeira enfrentaram a urgência da organização patrimonial diante do momento presente em “COVID-19 e Planejamento Sucessório: não há mais momento para postergar”. Já Ana Luiza Maia Nevares discorreu sobre o pragmático tema da atribuição de validade e eficácia aos testamentos particulares feitos durante o isolamento social (“Como testar em momento de pandemia e isolamento social”).
Ainda no mercado editorial, Lívia Teixeira Leal consolidou como indispensável a obra que transmite ao público sua dissertação (“Internet e morte do usuário: propostas para o tratamento jurídico post mortem do conteúdo inserido na rede”) e que se encontra na segunda edição. Sobre este tema, aguarda-se a obra coletiva coordenada por Lívia Teixeira Leal e Ana Carolina Brochado Teixeira, que certamente trará mais reflexões sobre a intermitência da morte no mundo virtual.
Por falar em internet, o protagonismo dos livros nesta retrospectiva deve ser compartilhado por eventos online, os quais, impulsionados pela necessidade do afastamento social, aproximou o mundo jurídico por aulas, palestras, debates e lives, com ampla difusão virtual do conhecimento.
Em tal seara, as duas edições do “Congresso de Arquitetura do Planejamento Sucessório”, coordenadas por Daniele Chaves Teixeira e Simone Tassinari Fleischmann, merecem lembrança. Com efeito, a transmissão online do conhecimento também refletiu o amadurecimento e sistematização do conteúdo produzido sobre questões há muito debatidas.
Assim, foram notáveis os esforços de Simone Tassinari Fleischmann na seara das ligações entre o Direito das Sucessões e o Direito Empresarial. Nesse campo, a autora destrinchou as vantagens e as desvantagens da organização do patrimônio familiar através de holdings, conteúdo apresentado ao longo de eventos e palestras.
Sob esse prisma, embora pareça evidente certa intensidade na produção de artigos e também na realização de palestras sobre o planejamento sucessório, ainda produzem-se poucas teses e dissertações cujo objeto de pesquisa relacione-se ao campo do Direito das Sucessões como um todo. Em tal âmbito, com certeza, notou-se maturidade e aprofundamento de estudos de fôlego a respeito do instituto da legítima e da proteção dos herdeiros necessários, temas debatidos há muito tempo em congressos e artigos científicos.
Sob esta perspectiva, dentro do Programa de Direito Civil da USP, houve a publicação dos primeiros resultados do aguardado trabalho de pós-doutorado desenvolvido por Flávio Tartuce, sob a orientação de José Fernando Simão, os quais se encontram no artigo “Fundamentos de Direito das Sucessões em outros sistemas e no Brasil”, publicado na Revista Brasileira de Direito Civil,
- O trabalho oferece um rico estudo comparatista, capaz de orientar medidas de alteração legislativa quanto à disciplina brasileira da sucessão necessária.
- No mesmo programa, também ocorreu a defesa da tese de doutorado de Bruno Marques Ribeiro, sob o título “O Direito Sucessório brasileiro, a Autonomia e a Solidariedade: uma análise sobre a necessidade de revisão do instituto da legítima no Direito Civil”, orientada por José Luiz Gavião de Almeida.
Já no Programa de Pós-Graduação em Direito Civil da UERJ, dois trabalhos referentes à legítima, orientados por Heloísa Helena Barboza, foram defendidos no início do ano. Nesse sentido, a dissertação de Ana Carolina Velmovitsky Stern enfrentou a posição do cônjuge e do companheiro como herdeiro necessário e a possibilidade de derrogá-la mediante pacto sucessório, oferecendo soluções hermenêuticas de relativização da proibição contida no artigo 426, CC.
Enquanto isso, Caio Ribeiro Pires — coautor deste texto — traçou, em sua dissertação, uma releitura do instituto da legítima, abordando tanto uma revisão das escolhas legislativas brasileiras ao longo do tempo, quanto uma proposta de mudança de lei e, ainda, uma sugestão interpretativa de harmonização da sucessão necessária atual aos princípios constitucionais.
Ao que toca o viés processual do fenômeno sucessório, a possibilidade de estipularem-se negócios jurídicos processuais no testamento, além da cláusula compromissória, representa a novidade mais debatida. O tema foi abordado por Daniel Bucar, em coautoria com Yves Lima Nascimento, aqui na ConJur e também se configurou objeto de exposição de Mário Luiz Delgado no II Congresso Arquitetura do Planejamento Sucessório, em palestra nomeada “Soluções extrajudiciais para planejamento sucessório”.
- Na mesma seara, celebra-se o sucesso da obra “Inventário e partilha — teoria e prática”, de Conrado Paulino da Rosa e Marco Antônio Rodrigues, demonstrado por ocasião de sua segunda edição.
- Enquanto isso, na seara tributária do sistema sucessório os autores deste texto aprofundaram-se na pesquisa do tema ao longo do ano, sobre os mais diversos prismas.
Citem-se, de modo breve, três deles. Primeiro, o planejamento sucessório tributário e a autonomia privada do sucessor-contribuinte para inventariar bens móveis em qualquer Estado da federação e, então, escolher pagar tributo economicamente favorável a título de ITCM.
O assunto veio à tona a partir de uma notícia de julgado do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, também deste ano, referendando tal estratégia de elisão fiscal. Depois, pensou-se na análise da incidência tributária sobre a sucessão a partir de uma perspectiva de todo o Sistema Tributário Nacional, não só do ITCM (que inclui o ITBI e o Imposto de Renda sobre ganho de capital).
E, ainda, texto que se encontra no prelo voltado a identificar as peculiaridades da incidência de ITCM sobre a transmissão de bens digitais. Mais uma vez, recorre-se à prospecção para comunicar que todas essas questões, entre outras, serão tratadas dentro de futura obra a ser desenvolvida por estes autores cujo escopo será a reunião da disciplina tributária no direito sucessório.
- Por último, sublinham-se algumas decisões do Poder Judiciário que mostram coerência aos estudos desenvolvidos a respeito das possibilidades e limites do planejamento sucessório, especialmente na esfera tributária da sucessão.
- Dessa maneira, o Supremo Tribunal Federal destaca-se com a conclusão de um importante julgamento e início de outro.
Sob essa perspectiva, definiu-se no tema 796 que o ITBI incide sobre a transmissão de imóveis à pessoa jurídica desde que o valor dos bens exceda o limite do capital social a ser integralizado, não se aplicando completamente a não incidência tributária do artigo 156, inciso I, CR.
- Tal decisão apresentará grandes impactos quanto à constituição de holdings para fins de planejamento sucessório.
- Ainda, iniciou-se o julgamento que discute a constitucionalidade da incidência de ITCM sobre a transmissão de bens, do autor da herança, situados no exterior aos herdeiros residentes no Brasil (Tema 825).
Embora o julgamento esteja suspenso por pedido de vista do ministro Alexandre Moraes, o relator, ministro Dias Toffoli, seguido pelo ministro Luiz Edson Fachin, votou reconhecendo a inconstitucionalidade de os Estados cobrarem tal imposto até que seja promulgada e sancionada Lei Federal Complementar disciplinando a questão.
é advogado do escritório Bucar Marano Advogados, parecerista, professor de Direito Civil da Uerj e do IBMEC-RJ, doutor e mestre em Direito Civil pela Uerj e especialista em Direito Civil pela Universitá degli Studi di Camerino,Caio Ribeiro Pires é advogado do escritório Bucar Marano advogados e mestre em Direito Civil pela Uerj.Revista Consultor Jurídico, 13 de dezembro de 2020, 10h05
: Em matéria de Direito das Sucessões, 2020 foi um ano de novas percepções
Ver resposta completa
Qual é a concorrência sucessória do cônjuge em relação aos bens comuns adquiridos durante?
Como o regime é o da comunhão universal de bens, não haverá concorrência sucessória do cônjuge em relação aos bens comuns adquiridos durante o casamento, ou seja, os R$ 2.500.000,00 restantes serão divididos igualmente entre José e Carlos, que recebem R$ 1.250.000,00 cada um. Trata-se de interpretação do inciso I do art.1.829 do CC/2002.
Ver resposta completa
Quando o direito sucessório foi extirpado da legislação civil?
Na Rússia, o direito sucessório foi extirpado da legislação civil por força de um decreto baixado em abril de 1918, independente de ser sucessão legal ou sucessão testamentária.
Ver resposta completa
Por que não podemos ignorar o direito sucessório?
Oriunda do termo latino successio, a palavra sucessão traz a noção de que alguém assume o lugar de outra pessoa, passando a responder pelos seus bens/direitos/obrigações anteriormente contraídos. Sucessão, portanto, nada mais é do que transmissão de direitos.
Para uma melhor compreensão, podemos dizer que a palavra sucessão deve ser vista sob dois prismas: um subjetivo e outro objetivo. Pelo aspecto subjetivo, trata-se do direito de alguém adquirir bens e obrigações do falecido, ao passo que, sob o aspecto objetivo, refere-se às leis que regem a transferência integral dos bens e das obrigações que compõem o patrimônio do falecido.
A sucessão é uma relação jurídica complexa, com vários elementos ou condições, que são também fases pelas quais deve passar até atingir a sua finalidade: a) morte do autor da herança ou abertura da sucessão; b) devolução da herança ou vocação hereditária; c) sobrevivência e idoneidade do sucessor; d) aquisição ou aceitação da herança.
- CUNHA GONÇALVES, p.590).
- Portanto, quando ocorre a substituição pelos legitimados a tal, a relação jurídica primária não sofre nenhum prejuízo, tendo em vista a permanência do objeto da relação em seu estado inicial, sendo alterado, apenas, um dos pólos da relação.
- A mencionada alteração se procede com a integralidade dos bens/direitos/obrigações (denominada sucessão a título universal) ou de forma restrita, sendo determinados os direitos/obrigações que serão transmitidos a quem de direito (denominada sucessão a título singular).
As referidas sucessões operam-se de duas formas: durante a vida do titular (sucessão inter vivos) ou em decorrência da morte do titular (sucessão causa mortis); abrangendo, esta última, a totalidade do espólio. O Direito das Sucessões é enraizado nas demais áreas de nosso Direito Civil, possuindo vínculo com o Direito das Obrigações, Direito das Coisas e Direito de Família.
Ainda que esteja posto como um direito privado, não pairam dúvidas acerca de sua característica pública, assim como o Direito de Família, vez que dita regras e mecanismos de todo um sistema de determinada nação. Sob nossa ótica, a matéria tem sua abrangência facilmente detectável diante da própria ordem dos Livros do Código Civil (Parte Geral e Parte Especial – Direito das Obrigações, Direito das Coisas, Direito de Família e Direito das Sucessões), haja vista a facilidade de visualizar toda a vida do ser humano dessa maneira: o indivíduo nasce, passa a ser sujeito de direitos e obrigações, adquire bens, constitui família e falece, deixando os bens/direitos/obrigações adquiridos para seus herdeiros.
Espelhado no civilismo francês, nosso ordenamento adotou o denominado direito de saisine, pelo qual, morto o titular dos bens/direitos/obrigações, transmite-se, imediatamente, sua posse aos herdeiros. Ramo integrante da parte especial do Direito Civil, o Direito das Sucessões trata da alocação de todos os bens e obrigações contraídas pelo de cujus, cumprindo-nos ressaltar que tal ramo do Direito abriga apenas as relações entre pessoas físicas, vez que apenas estas podem exprimir suas disposições de última vontade.
Direito hereditário ou das sucessões, como visto, é o complexo dos princípios segundo os quais se realiza a transmissão do patrimônio de alguém que deixou de existir. Essa transmissão constitui a sucessão; o patrimônio transmitido denomina-se herança; e quem a recebe se diz herdeiro. (BEVILAQUA, 1899, p.12) As novas tendências e modificações sofridas pelo Direito de Família exerceram forte influência sobre o Direito das Sucessões, o que pode acarretar mudanças na ordem dos vocacionados, pois o reconhecimento do afeto como criador de vínculo familiar trará uma nova visão no campo da vocação hereditária.
O Direito das Sucessões teve vários fundamentos. Passaremos, então, a discorrer sobre as mais importantes. Fundamento de ordem socialista: No início do Século XX, a teoria socialista de Estado lançou a idéia de que a herança poderia representar um mal, iniciando-se, desta feita, uma verdadeira tentativa de impugná-la.
- Tal impugnação teve início antes mesmo dos ideais socialistas serem tomados como suporte/sustentáculo pelos revolucionários que adotaram o regime comunista em determinados Estados, de onde extraímos que a doutrina da época pregava um verdadeiro repúdio à propriedade.
- Para aqueles que defendiam a legalidade da propriedade privada e, não obstante, sua transmissão pelo evento morte, a sucessão estimulava, de forma acirrada, a desigualdade social e a pobreza, trazendo como conseqüência a injustiça social.
No mesmo sentido, entendiam, ainda, que o direito das sucessões (leia-se transmissão da propriedade mortis causa) era inconveniente, pois estimulava o comodismo dos sucessores daqueles que eram afortunados (aspecto financeiro e patrimonial), gerando diminuição da produção do Estado, vez que sua mão de obra sofreria uma considerável redução, devendo, portanto, ser este o único sucessor dos bens deixados pelo de cujus.
Os programas de Marx e Engels a consideravam como um privilégio protetor da burguesia: é a sociedade a única que tem direito a receber os bens dos indivíduos, como recompensa aos serviços prestados por ela. (LACRUZ, 1961, p.14). a sucessão causa mortis encontra envolventes opositores, destacando-se em uma linha os socialistas, contrários à propriedade privada especialmente sobre os bens de produção, que vêem nela um incentivo às injustiças e desigualdades entre os homens, concentrando riquezas nas mãos de poucos, além de prestigiar a indolência e preguiça, nocivas ao desenvolvimento produtivo e econômico indispensáveis à sociedade,
(CAHALI, 2002, p.26). As escolas socialistas ou comunistas dirigiram vivas críticas à esta concepção. Quando não combatem o próprio princípio direito de propriedade, negam que este direito confere ao seu titular a faculdade de dispor dos seus bens para o tempo que seguirá a sua morte: se a relação que une o assunto e o objeto de um direito, não cessa necessariamente à morte do sujeito, porque cessar com o desaparecimento do objeto? As teses socialistas conduzem, assim, pelo menos no plano teórico, a negar a possibilidade da herança, e, por conseguinte, atribuir ao Estado os bens que compõem o patrimônio do de cujus: o Estado o toma em virtude de um direito real, fundado sobre os interesses da comunidade ao prejuízo da qual estes bens foram adquiridos.(Mazeaud et Mazeaud, 1963, p.534); (TRABUCCHI, 1999, p.826).
- Ausência de bases concretas para sustentar tal posição num passado recente a idéia de Estado perfeito, nada mais era que pura utopia.
- Na Rússia, o direito sucessório foi extirpado da legislação civil por força de um decreto baixado em abril de 1918, independente de ser sucessão legal ou sucessão testamentária.
O governo russo determinou quantias máximas e mínimas para a sucessão, vez que o referido decreto não teve aplicação sistemática, tendo, inclusive, flexibilizado a sucessão aberta no mesmo grupo familiar, que passaria a ser regida por lei anterior à Revolução.
- Com a vitória do bolchevismo, na Rússia, e derrota do menchevismo, com seu cunho acentuadamente socialista um dos primeiros atos do governo revolucionário foi a abolição da herança.
- Talvez tenha sido esta a causa principal do desestímulo da atividade laborativa do povo russo, a par da absorção, pelo Estado, da maior parte da produção agrícola-pastoril que se seguiu ao ano de 1918, quando a Rússia abarrotou o mercado do mundo com víveres de toda a espécie.
Foi uma explosão emocional de liberdade ilusória e privatização de riqueza que durou pouco. No ano seguinte (1919), a produção caiu verticalmente, ante o desestímulo que dominou a classe trabalhadora. (MIRANDA, 1986, p.612). A posição adotada pelo outrora direito soviético nos traz a idéia de que não podemos ignorar o direito sucessório, pois clara é a sua ligação íntima com a propriedade particular, haja vista que esta é complementada por aquele.
- Não há por que ignorar o direito à herança, pois, mesmo na antiga URSS, o comunismo baixou a guarda diante de uma nada animadora vivência.
- Como bem disse Carlos Maximiliano (1942, p.33), “a realidade é a mais implacável arrasadora das utopias”.
- Fundamento de ordem patrimonial e familiar: O segundo fundamento do Direito das Sucessões é o que defende a idéia de mantença do patrimônio no mesmo grupo familiar.
Como visto, a família sofria as influências de elementos morais e religiosos, sendo relevante para configurar e sustentar a idéia de transmissão da propriedade dos pais para os filhos, quando a propriedade passou a ter sua transmissão como verdadeira praxe e a ser vista como costume social, já que as mais remotas civilizações reconheciam o direito de herança dos filhos.
A propriedade corporificou, assim, a idéia de sucessão hereditária como um poderoso fator da perpetuidade da família, pelo cumprimento do culto dos antepassados, traduzido nas cerimônias e nos sacrifícios em honra dos mortos, de modo que se não pudesse adquirir a propriedade sem o culto, nem este sem aquela.
(ITABAIANA DE OLIVEIRA, 1952, p.47). Na origem da propriedade está afinal o trabalho, um esforço maior ou menor, que a legitima e a torna conforme com o direito natural e mesmo uma imposição sua. (TELLES, 1991, p.263). Desta lição nos vem a idéia de que não haveria por que uma determinada família trabalhar para constituir um patrimônio e depois não deixá-los a seus sucessores.
Decerto, a transmissão dos bens pelo evento mortis se manterá como um incentivo à economia e ao labor, não havendo razão para adotar, em algum momento, a teoria defendida pelos soviéticos. O fundamento da sucessão por ordem patrimonial familiar se dá pelo facto de a propriedade continuar a ser, ainda hoje, largamente familiar: usufruída (quando não constituída) pelo conjunto de familiares mais próximos; que têm, assim, uma expectativa de recebê-la por morte do seu titular (formal) (CAMPOS, 1997, p.446).
A herança cumpre de certa forma, uma função familiar, vez que pode ser entendida como uma modalidade de execução de um dever dos pais de garantir, materialmente, sua prole. A idéia mais antiga que explica o direito das sucessões é que a propriedade tem um caráter familiar.
O chefe da família exerce os direitos da comunidade familiar. À sua morte, é substituído por um dos membros da família, que se torna o chefe. O herdeiro toma o lugar do defunto, assegurando o culto privado e manutenção do grupo. (PLANIOL, 1946, p.473) “A matéria da sucessão causa mortis está estritamente aos temas da propriedade e,, da família.
É certo que o problema da continuidade das relações jurídicas, que é o que se põe como o essencial para solucionar quando ocorre o falecimento de uma pessoa, em termos abstratos pode ser solucionado sem a referencia à propriedade ou à família: poderia se dispor a transferência dos bens vacantes à coletividade, que poderia reter-los como tal, ou deferi-los à outros particulares, sem nenhuma relação de parentesco com aquele que determinou a sucessão.
Mas tal solução não corresponde como a tradição histórica, que é bem outra, e com seguranças é amparada por atuais ditames constitucionais,, (LÓPEZ Y LÓPEZ, 1999, pp.28-29) A teoria socialista é utópica e insensata, pois visava, tão somente, acabar com as heranças, o que resultaria numa fonte de inúmeras injustiças, contrárias ao interesse social.
Fundamento de ordem econômica e social: Defendido pela doutrina francesa de Michel Grimaldi (1989, pp.25-26), o fundamento econômico reveste-se de grande interesse social, distinguido-se dos demais por sua natureza patrimonial, vez que a sucessão privada encoraja o espírito de empreendimento e favorece o progresso econômico.
- Certo é que não se pode imprimir a este fundamento outro caráter senão o que tenha fundo econômico.
- O instituto da sucessão é o complemento necessário do direito de propriedade, conjugado, ou não, com o direito de família.
- Este último é invocado pela lei, ora para conter em justos limites o exercício do direito de testar, ora para suprir a ausência de vontade do proprietário, de harmonia com os seus sentimentos e instintos naturais e normais.
Propriedade que se extingue com a morte do seu titular e não se transmite ao seu sucessor, por sua vontade expressa ou presumida pela lei, não é propriedade; é usufruto vitalício. (CUNHA GONÇALVES, p.601). Percebe-se, assim, que a finalidade de se manter na família o valor de determinada propriedade nada mais é do que evitar que um pai deixe seu filho numa condição financeira prejudicada ou insuficiente para manter sua subsistência ou a de sua família.
- A busca pela retenção das riquezas não é novidade.
- Desde o início de sua história, o direito das sucessões teve traços familiares, políticos e, principalmente, econômicos, traços estes que serviram de base para diversas codificações civis ao longo do tempo e em diversas nações.
- A solução adotada pelo legislador civil de manutenção do patrimônio na família do de cujus pode até ser considerada, porém é inegavelmente um meio satisfatório de se permitir aos integrantes da família enlutada de prosseguir com os propósitos para os quais tal patrimônio foi constituído, com a percepção das necessidades dos sucessores.
(LISBOA, 2006, p.426). Há uma forte e consistente tendência à constitucionalização do direito sucessório. Não pairam dúvidas de que, nos termos do artigo 5º, XXX da CF/88, a herança passou a ter proteção constitucional, devendo atingir a sua finalidade: garantir aos legitimados para suceder o direito de perceber aquilo que lhes é justo.
- A ordem social e econômica nos tempos atuais favorece e corrobora tudo aquilo que tratamos até aqui, haja vista que, sem sombra de dúvidas, não se pode negar a existência, ainda que remota, dos fundamentos expostos e de suas influências para chegarmos ao atual contexto.
- Referências bibliográficas: BEVILAQUA, Clovis.
Direito das successões, Bahia: Livraria Magalhães, 1899. CAHALI, Francisco José; HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes, Curso avançado de direito civil : direito das sucessões.2. ed. rev. e atual. de acordo com o novo código civil. Coordenador Everaldo Cambler.
- São Paulo: RT, 2003.
- CAMPOS, Diogo Leite de.
- Lições de direito de família e das sucessões,2. ed. rev. e actual.
- Belo Horizonte: Del Rey, 1997.
- CUNHA GONÇALVES, Luiz da.
- Tratado de direito civil em comentário ao código civil português,2. ed. atual. e aum. e 1. ed.
- Brasileira.
- Adaptação ao direito brasileiro completada sob a supervisão dos Ministros Orozimbo Nonato, Laudo de Camargo e prof.
Vicente Ráo. São Paulo: Max Limonad.v.9, tomo 2. DUGUIT, Léon. Les transformations générales du droit privé depuis le code napoleon, Deuxième édition reuve. Paris: Librairie Félix Alcan, 1920. GRIMALDI, Michel. Droit civil: successions. Paris: Éditions Litec, 1989.
- ITABAIANA DE OLIVEIRA, Arthur Vasco.
- Tratado de direito das sucessões,4. ed. rev. e atual.
- Pelo autor com a colaboração de Aires Itabaiana de Oliveira.
- São Paulo: Max Limonad, 1952.v.1.
- LACRUZ, José Luis; ALBALADEJO, Manuel.
- Tratado teórico-práctico de derecho civil: Derecho de sucesiones – parte general.
- Barcelona: Libreria Bosch, 1961.
vol.1, tomo 5. LISBOA, Roberto Senise. Manual de direito civil : direito de família e das sucessões.4. ed. rev. e atual. São Paulo: RT, 2006.v.5. LÓPEZ Y LÓPEZ, A.M. La sucesión em general in Derecho Civil (V) – Derecho de Sucesiones. Coordenador F. Capilla Roncero.
- Valencia: Tirant lo Blanch, 1999.
- MAXIMILIANO, Carlos.
- Direito das sucessões,2. ed.
- Rio de Janeiro: Livraria Freitas Bastos, 1942.v.1.
- MAZEAUD, Henri et Leon; MAZEAUD, Jean.
- Leçons de droit civil : regimes matrimoniaux, successions et libéralités.
- Nouvelle licence.
- Quatrième année.
- Paris: Éditions Montchrestien, 1963.v.4.
MIRANDA, Darcy Arruda. Anotações ao código civil brasileiro, São Paulo: Saraiva, 1986.v.3. PLANIOL, Marcel. Traité élémentaire de droit civil. Édition nouvelle refondue par Georges Ripert et Jean Boulanger. Deuxième Édition. Tome Troisième. Paris: Librairie Générale de Jurisprudence, 1946.
TELLES, Inocêncio Galvão. Direito das sucessões : noções fundamentais.6. ed. rev. e actual. Coimbra: Coimbra Editora, 1991. TRABUCCHI, Alberto. Istituzioni di diritto civile, Trentesima nona edizione aggiornata con le riforme e la giurisprudenza. Padova: CEDAM, 1999. Thiago Felipe Vargas Simões é sócio do IBDFAM, advogado, especialista em Direito Privado pela Univila/ES, mestre em Direito Civil pela PUC/SP e doutorando em Direito Civil pela PUC/SP.
Contato: [email protected] – Home Page: http://www.tfvsimoes.site.adv.br/ Os artigos assinados aqui publicados são inteiramente de responsabilidade de seus autores e não expressam posicionamento institucional do IBDFAM
Ver resposta completa
Qual a diferença entre sucessão e successio?
Oriunda do termo latino successio, a palavra sucessão traz a noção de que alguém assume o lugar de outra pessoa, passando a responder pelos seus bens/direitos/obrigações anteriormente contraídos. Sucessão, portanto, nada mais é do que transmissão de direitos.
- Para uma melhor compreensão, podemos dizer que a palavra sucessão deve ser vista sob dois prismas: um subjetivo e outro objetivo.
- Pelo aspecto subjetivo, trata-se do direito de alguém adquirir bens e obrigações do falecido, ao passo que, sob o aspecto objetivo, refere-se às leis que regem a transferência integral dos bens e das obrigações que compõem o patrimônio do falecido.
A sucessão é uma relação jurídica complexa, com vários elementos ou condições, que são também fases pelas quais deve passar até atingir a sua finalidade: a) morte do autor da herança ou abertura da sucessão; b) devolução da herança ou vocação hereditária; c) sobrevivência e idoneidade do sucessor; d) aquisição ou aceitação da herança.
(CUNHA GONÇALVES, p.590). Portanto, quando ocorre a substituição pelos legitimados a tal, a relação jurídica primária não sofre nenhum prejuízo, tendo em vista a permanência do objeto da relação em seu estado inicial, sendo alterado, apenas, um dos pólos da relação. A mencionada alteração se procede com a integralidade dos bens/direitos/obrigações (denominada sucessão a título universal) ou de forma restrita, sendo determinados os direitos/obrigações que serão transmitidos a quem de direito (denominada sucessão a título singular).
As referidas sucessões operam-se de duas formas: durante a vida do titular (sucessão inter vivos) ou em decorrência da morte do titular (sucessão causa mortis); abrangendo, esta última, a totalidade do espólio. O Direito das Sucessões é enraizado nas demais áreas de nosso Direito Civil, possuindo vínculo com o Direito das Obrigações, Direito das Coisas e Direito de Família.
- Ainda que esteja posto como um direito privado, não pairam dúvidas acerca de sua característica pública, assim como o Direito de Família, vez que dita regras e mecanismos de todo um sistema de determinada nação.
- Sob nossa ótica, a matéria tem sua abrangência facilmente detectável diante da própria ordem dos Livros do Código Civil (Parte Geral e Parte Especial – Direito das Obrigações, Direito das Coisas, Direito de Família e Direito das Sucessões), haja vista a facilidade de visualizar toda a vida do ser humano dessa maneira: o indivíduo nasce, passa a ser sujeito de direitos e obrigações, adquire bens, constitui família e falece, deixando os bens/direitos/obrigações adquiridos para seus herdeiros.
Espelhado no civilismo francês, nosso ordenamento adotou o denominado direito de saisine, pelo qual, morto o titular dos bens/direitos/obrigações, transmite-se, imediatamente, sua posse aos herdeiros. Ramo integrante da parte especial do Direito Civil, o Direito das Sucessões trata da alocação de todos os bens e obrigações contraídas pelo de cujus, cumprindo-nos ressaltar que tal ramo do Direito abriga apenas as relações entre pessoas físicas, vez que apenas estas podem exprimir suas disposições de última vontade.
- Direito hereditário ou das sucessões, como visto, é o complexo dos princípios segundo os quais se realiza a transmissão do patrimônio de alguém que deixou de existir.
- Essa transmissão constitui a sucessão; o patrimônio transmitido denomina-se herança; e quem a recebe se diz herdeiro.
- BEVILAQUA, 1899, p.12) As novas tendências e modificações sofridas pelo Direito de Família exerceram forte influência sobre o Direito das Sucessões, o que pode acarretar mudanças na ordem dos vocacionados, pois o reconhecimento do afeto como criador de vínculo familiar trará uma nova visão no campo da vocação hereditária.
O Direito das Sucessões teve vários fundamentos. Passaremos, então, a discorrer sobre as mais importantes. Fundamento de ordem socialista: No início do Século XX, a teoria socialista de Estado lançou a idéia de que a herança poderia representar um mal, iniciando-se, desta feita, uma verdadeira tentativa de impugná-la.
Tal impugnação teve início antes mesmo dos ideais socialistas serem tomados como suporte/sustentáculo pelos revolucionários que adotaram o regime comunista em determinados Estados, de onde extraímos que a doutrina da época pregava um verdadeiro repúdio à propriedade. Para aqueles que defendiam a legalidade da propriedade privada e, não obstante, sua transmissão pelo evento morte, a sucessão estimulava, de forma acirrada, a desigualdade social e a pobreza, trazendo como conseqüência a injustiça social.
No mesmo sentido, entendiam, ainda, que o direito das sucessões (leia-se transmissão da propriedade mortis causa) era inconveniente, pois estimulava o comodismo dos sucessores daqueles que eram afortunados (aspecto financeiro e patrimonial), gerando diminuição da produção do Estado, vez que sua mão de obra sofreria uma considerável redução, devendo, portanto, ser este o único sucessor dos bens deixados pelo de cujus.
Os programas de Marx e Engels a consideravam como um privilégio protetor da burguesia: é a sociedade a única que tem direito a receber os bens dos indivíduos, como recompensa aos serviços prestados por ela. (LACRUZ, 1961, p.14). a sucessão causa mortis encontra envolventes opositores, destacando-se em uma linha os socialistas, contrários à propriedade privada especialmente sobre os bens de produção, que vêem nela um incentivo às injustiças e desigualdades entre os homens, concentrando riquezas nas mãos de poucos, além de prestigiar a indolência e preguiça, nocivas ao desenvolvimento produtivo e econômico indispensáveis à sociedade,
(CAHALI, 2002, p.26). As escolas socialistas ou comunistas dirigiram vivas críticas à esta concepção. Quando não combatem o próprio princípio direito de propriedade, negam que este direito confere ao seu titular a faculdade de dispor dos seus bens para o tempo que seguirá a sua morte: se a relação que une o assunto e o objeto de um direito, não cessa necessariamente à morte do sujeito, porque cessar com o desaparecimento do objeto? As teses socialistas conduzem, assim, pelo menos no plano teórico, a negar a possibilidade da herança, e, por conseguinte, atribuir ao Estado os bens que compõem o patrimônio do de cujus: o Estado o toma em virtude de um direito real, fundado sobre os interesses da comunidade ao prejuízo da qual estes bens foram adquiridos.(Mazeaud et Mazeaud, 1963, p.534); (TRABUCCHI, 1999, p.826).
- Ausência de bases concretas para sustentar tal posição num passado recente a idéia de Estado perfeito, nada mais era que pura utopia.
- Na Rússia, o direito sucessório foi extirpado da legislação civil por força de um decreto baixado em abril de 1918, independente de ser sucessão legal ou sucessão testamentária.
O governo russo determinou quantias máximas e mínimas para a sucessão, vez que o referido decreto não teve aplicação sistemática, tendo, inclusive, flexibilizado a sucessão aberta no mesmo grupo familiar, que passaria a ser regida por lei anterior à Revolução.
Com a vitória do bolchevismo, na Rússia, e derrota do menchevismo, com seu cunho acentuadamente socialista um dos primeiros atos do governo revolucionário foi a abolição da herança. Talvez tenha sido esta a causa principal do desestímulo da atividade laborativa do povo russo, a par da absorção, pelo Estado, da maior parte da produção agrícola-pastoril que se seguiu ao ano de 1918, quando a Rússia abarrotou o mercado do mundo com víveres de toda a espécie.
Foi uma explosão emocional de liberdade ilusória e privatização de riqueza que durou pouco. No ano seguinte (1919), a produção caiu verticalmente, ante o desestímulo que dominou a classe trabalhadora. (MIRANDA, 1986, p.612). A posição adotada pelo outrora direito soviético nos traz a idéia de que não podemos ignorar o direito sucessório, pois clara é a sua ligação íntima com a propriedade particular, haja vista que esta é complementada por aquele.
- Não há por que ignorar o direito à herança, pois, mesmo na antiga URSS, o comunismo baixou a guarda diante de uma nada animadora vivência.
- Como bem disse Carlos Maximiliano (1942, p.33), “a realidade é a mais implacável arrasadora das utopias”.
- Fundamento de ordem patrimonial e familiar: O segundo fundamento do Direito das Sucessões é o que defende a idéia de mantença do patrimônio no mesmo grupo familiar.
Como visto, a família sofria as influências de elementos morais e religiosos, sendo relevante para configurar e sustentar a idéia de transmissão da propriedade dos pais para os filhos, quando a propriedade passou a ter sua transmissão como verdadeira praxe e a ser vista como costume social, já que as mais remotas civilizações reconheciam o direito de herança dos filhos.
A propriedade corporificou, assim, a idéia de sucessão hereditária como um poderoso fator da perpetuidade da família, pelo cumprimento do culto dos antepassados, traduzido nas cerimônias e nos sacrifícios em honra dos mortos, de modo que se não pudesse adquirir a propriedade sem o culto, nem este sem aquela.
(ITABAIANA DE OLIVEIRA, 1952, p.47). Na origem da propriedade está afinal o trabalho, um esforço maior ou menor, que a legitima e a torna conforme com o direito natural e mesmo uma imposição sua. (TELLES, 1991, p.263). Desta lição nos vem a idéia de que não haveria por que uma determinada família trabalhar para constituir um patrimônio e depois não deixá-los a seus sucessores.
- Decerto, a transmissão dos bens pelo evento mortis se manterá como um incentivo à economia e ao labor, não havendo razão para adotar, em algum momento, a teoria defendida pelos soviéticos.
- O fundamento da sucessão por ordem patrimonial familiar se dá pelo facto de a propriedade continuar a ser, ainda hoje, largamente familiar: usufruída (quando não constituída) pelo conjunto de familiares mais próximos; que têm, assim, uma expectativa de recebê-la por morte do seu titular (formal) (CAMPOS, 1997, p.446).
A herança cumpre de certa forma, uma função familiar, vez que pode ser entendida como uma modalidade de execução de um dever dos pais de garantir, materialmente, sua prole. A idéia mais antiga que explica o direito das sucessões é que a propriedade tem um caráter familiar.
- O chefe da família exerce os direitos da comunidade familiar.
- À sua morte, é substituído por um dos membros da família, que se torna o chefe.
- O herdeiro toma o lugar do defunto, assegurando o culto privado e manutenção do grupo.
- PLANIOL, 1946, p.473) “A matéria da sucessão causa mortis está estritamente aos temas da propriedade e,, da família.
É certo que o problema da continuidade das relações jurídicas, que é o que se põe como o essencial para solucionar quando ocorre o falecimento de uma pessoa, em termos abstratos pode ser solucionado sem a referencia à propriedade ou à família: poderia se dispor a transferência dos bens vacantes à coletividade, que poderia reter-los como tal, ou deferi-los à outros particulares, sem nenhuma relação de parentesco com aquele que determinou a sucessão.
Mas tal solução não corresponde como a tradição histórica, que é bem outra, e com seguranças é amparada por atuais ditames constitucionais,, (LÓPEZ Y LÓPEZ, 1999, pp.28-29) A teoria socialista é utópica e insensata, pois visava, tão somente, acabar com as heranças, o que resultaria numa fonte de inúmeras injustiças, contrárias ao interesse social.
Fundamento de ordem econômica e social: Defendido pela doutrina francesa de Michel Grimaldi (1989, pp.25-26), o fundamento econômico reveste-se de grande interesse social, distinguido-se dos demais por sua natureza patrimonial, vez que a sucessão privada encoraja o espírito de empreendimento e favorece o progresso econômico.
Certo é que não se pode imprimir a este fundamento outro caráter senão o que tenha fundo econômico. O instituto da sucessão é o complemento necessário do direito de propriedade, conjugado, ou não, com o direito de família. Este último é invocado pela lei, ora para conter em justos limites o exercício do direito de testar, ora para suprir a ausência de vontade do proprietário, de harmonia com os seus sentimentos e instintos naturais e normais.
Propriedade que se extingue com a morte do seu titular e não se transmite ao seu sucessor, por sua vontade expressa ou presumida pela lei, não é propriedade; é usufruto vitalício. (CUNHA GONÇALVES, p.601). Percebe-se, assim, que a finalidade de se manter na família o valor de determinada propriedade nada mais é do que evitar que um pai deixe seu filho numa condição financeira prejudicada ou insuficiente para manter sua subsistência ou a de sua família.
A busca pela retenção das riquezas não é novidade. Desde o início de sua história, o direito das sucessões teve traços familiares, políticos e, principalmente, econômicos, traços estes que serviram de base para diversas codificações civis ao longo do tempo e em diversas nações. a solução adotada pelo legislador civil de manutenção do patrimônio na família do de cujus pode até ser considerada, porém é inegavelmente um meio satisfatório de se permitir aos integrantes da família enlutada de prosseguir com os propósitos para os quais tal patrimônio foi constituído, com a percepção das necessidades dos sucessores.
(LISBOA, 2006, p.426). Há uma forte e consistente tendência à constitucionalização do direito sucessório. Não pairam dúvidas de que, nos termos do artigo 5º, XXX da CF/88, a herança passou a ter proteção constitucional, devendo atingir a sua finalidade: garantir aos legitimados para suceder o direito de perceber aquilo que lhes é justo.
- A ordem social e econômica nos tempos atuais favorece e corrobora tudo aquilo que tratamos até aqui, haja vista que, sem sombra de dúvidas, não se pode negar a existência, ainda que remota, dos fundamentos expostos e de suas influências para chegarmos ao atual contexto.
- Referências bibliográficas: BEVILAQUA, Clovis.
Direito das successões, Bahia: Livraria Magalhães, 1899. CAHALI, Francisco José; HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes, Curso avançado de direito civil : direito das sucessões.2. ed. rev. e atual. de acordo com o novo código civil. Coordenador Everaldo Cambler.
- São Paulo: RT, 2003.
- CAMPOS, Diogo Leite de.
- Lições de direito de família e das sucessões,2. ed. rev. e actual.
- Belo Horizonte: Del Rey, 1997.
- CUNHA GONÇALVES, Luiz da.
- Tratado de direito civil em comentário ao código civil português,2. ed. atual. e aum. e 1. ed.
- Brasileira.
- Adaptação ao direito brasileiro completada sob a supervisão dos Ministros Orozimbo Nonato, Laudo de Camargo e prof.
Vicente Ráo. São Paulo: Max Limonad.v.9, tomo 2. DUGUIT, Léon. Les transformations générales du droit privé depuis le code napoleon, Deuxième édition reuve. Paris: Librairie Félix Alcan, 1920. GRIMALDI, Michel. Droit civil: successions. Paris: Éditions Litec, 1989.
- ITABAIANA DE OLIVEIRA, Arthur Vasco.
- Tratado de direito das sucessões,4. ed. rev. e atual.
- Pelo autor com a colaboração de Aires Itabaiana de Oliveira.
- São Paulo: Max Limonad, 1952.v.1.
- LACRUZ, José Luis; ALBALADEJO, Manuel.
- Tratado teórico-práctico de derecho civil: Derecho de sucesiones – parte general.
- Barcelona: Libreria Bosch, 1961.
vol.1, tomo 5. LISBOA, Roberto Senise. Manual de direito civil : direito de família e das sucessões.4. ed. rev. e atual. São Paulo: RT, 2006.v.5. LÓPEZ Y LÓPEZ, A.M. La sucesión em general in Derecho Civil (V) – Derecho de Sucesiones. Coordenador F. Capilla Roncero.
Valencia: Tirant lo Blanch, 1999. MAXIMILIANO, Carlos. Direito das sucessões,2. ed. Rio de Janeiro: Livraria Freitas Bastos, 1942.v.1. MAZEAUD, Henri et Leon; MAZEAUD, Jean. Leçons de droit civil : regimes matrimoniaux, successions et libéralités. Nouvelle licence. Quatrième année. Paris: Éditions Montchrestien, 1963.v.4.
MIRANDA, Darcy Arruda. Anotações ao código civil brasileiro, São Paulo: Saraiva, 1986.v.3. PLANIOL, Marcel. Traité élémentaire de droit civil. Édition nouvelle refondue par Georges Ripert et Jean Boulanger. Deuxième Édition. Tome Troisième. Paris: Librairie Générale de Jurisprudence, 1946.
- TELLES, Inocêncio Galvão.
- Direito das sucessões : noções fundamentais.6. ed. rev. e actual.
- Coimbra: Coimbra Editora, 1991.
- TRABUCCHI, Alberto.
- Istituzioni di diritto civile,
- Trentesima nona edizione aggiornata con le riforme e la giurisprudenza.
- Padova: CEDAM, 1999.
- Thiago Felipe Vargas Simões é sócio do IBDFAM, advogado, especialista em Direito Privado pela Univila/ES, mestre em Direito Civil pela PUC/SP e doutorando em Direito Civil pela PUC/SP.
Contato: [email protected] – Home Page: http://www.tfvsimoes.site.adv.br/ Os artigos assinados aqui publicados são inteiramente de responsabilidade de seus autores e não expressam posicionamento institucional do IBDFAM
Ver resposta completa
Quais as consequências da Sucessão?
Oriunda do termo latino successio, a palavra sucessão traz a noção de que alguém assume o lugar de outra pessoa, passando a responder pelos seus bens/direitos/obrigações anteriormente contraídos. Sucessão, portanto, nada mais é do que transmissão de direitos.
Para uma melhor compreensão, podemos dizer que a palavra sucessão deve ser vista sob dois prismas: um subjetivo e outro objetivo. Pelo aspecto subjetivo, trata-se do direito de alguém adquirir bens e obrigações do falecido, ao passo que, sob o aspecto objetivo, refere-se às leis que regem a transferência integral dos bens e das obrigações que compõem o patrimônio do falecido.
A sucessão é uma relação jurídica complexa, com vários elementos ou condições, que são também fases pelas quais deve passar até atingir a sua finalidade: a) morte do autor da herança ou abertura da sucessão; b) devolução da herança ou vocação hereditária; c) sobrevivência e idoneidade do sucessor; d) aquisição ou aceitação da herança.
- CUNHA GONÇALVES, p.590).
- Portanto, quando ocorre a substituição pelos legitimados a tal, a relação jurídica primária não sofre nenhum prejuízo, tendo em vista a permanência do objeto da relação em seu estado inicial, sendo alterado, apenas, um dos pólos da relação.
- A mencionada alteração se procede com a integralidade dos bens/direitos/obrigações (denominada sucessão a título universal) ou de forma restrita, sendo determinados os direitos/obrigações que serão transmitidos a quem de direito (denominada sucessão a título singular).
As referidas sucessões operam-se de duas formas: durante a vida do titular (sucessão inter vivos) ou em decorrência da morte do titular (sucessão causa mortis); abrangendo, esta última, a totalidade do espólio. O Direito das Sucessões é enraizado nas demais áreas de nosso Direito Civil, possuindo vínculo com o Direito das Obrigações, Direito das Coisas e Direito de Família.
- Ainda que esteja posto como um direito privado, não pairam dúvidas acerca de sua característica pública, assim como o Direito de Família, vez que dita regras e mecanismos de todo um sistema de determinada nação.
- Sob nossa ótica, a matéria tem sua abrangência facilmente detectável diante da própria ordem dos Livros do Código Civil (Parte Geral e Parte Especial – Direito das Obrigações, Direito das Coisas, Direito de Família e Direito das Sucessões), haja vista a facilidade de visualizar toda a vida do ser humano dessa maneira: o indivíduo nasce, passa a ser sujeito de direitos e obrigações, adquire bens, constitui família e falece, deixando os bens/direitos/obrigações adquiridos para seus herdeiros.
Espelhado no civilismo francês, nosso ordenamento adotou o denominado direito de saisine, pelo qual, morto o titular dos bens/direitos/obrigações, transmite-se, imediatamente, sua posse aos herdeiros. Ramo integrante da parte especial do Direito Civil, o Direito das Sucessões trata da alocação de todos os bens e obrigações contraídas pelo de cujus, cumprindo-nos ressaltar que tal ramo do Direito abriga apenas as relações entre pessoas físicas, vez que apenas estas podem exprimir suas disposições de última vontade.
Direito hereditário ou das sucessões, como visto, é o complexo dos princípios segundo os quais se realiza a transmissão do patrimônio de alguém que deixou de existir. Essa transmissão constitui a sucessão; o patrimônio transmitido denomina-se herança; e quem a recebe se diz herdeiro. (BEVILAQUA, 1899, p.12) As novas tendências e modificações sofridas pelo Direito de Família exerceram forte influência sobre o Direito das Sucessões, o que pode acarretar mudanças na ordem dos vocacionados, pois o reconhecimento do afeto como criador de vínculo familiar trará uma nova visão no campo da vocação hereditária.
O Direito das Sucessões teve vários fundamentos. Passaremos, então, a discorrer sobre as mais importantes. Fundamento de ordem socialista: No início do Século XX, a teoria socialista de Estado lançou a idéia de que a herança poderia representar um mal, iniciando-se, desta feita, uma verdadeira tentativa de impugná-la.
- Tal impugnação teve início antes mesmo dos ideais socialistas serem tomados como suporte/sustentáculo pelos revolucionários que adotaram o regime comunista em determinados Estados, de onde extraímos que a doutrina da época pregava um verdadeiro repúdio à propriedade.
- Para aqueles que defendiam a legalidade da propriedade privada e, não obstante, sua transmissão pelo evento morte, a sucessão estimulava, de forma acirrada, a desigualdade social e a pobreza, trazendo como conseqüência a injustiça social.
No mesmo sentido, entendiam, ainda, que o direito das sucessões (leia-se transmissão da propriedade mortis causa) era inconveniente, pois estimulava o comodismo dos sucessores daqueles que eram afortunados (aspecto financeiro e patrimonial), gerando diminuição da produção do Estado, vez que sua mão de obra sofreria uma considerável redução, devendo, portanto, ser este o único sucessor dos bens deixados pelo de cujus.
Os programas de Marx e Engels a consideravam como um privilégio protetor da burguesia: é a sociedade a única que tem direito a receber os bens dos indivíduos, como recompensa aos serviços prestados por ela. (LACRUZ, 1961, p.14). a sucessão causa mortis encontra envolventes opositores, destacando-se em uma linha os socialistas, contrários à propriedade privada especialmente sobre os bens de produção, que vêem nela um incentivo às injustiças e desigualdades entre os homens, concentrando riquezas nas mãos de poucos, além de prestigiar a indolência e preguiça, nocivas ao desenvolvimento produtivo e econômico indispensáveis à sociedade,
(CAHALI, 2002, p.26). As escolas socialistas ou comunistas dirigiram vivas críticas à esta concepção. Quando não combatem o próprio princípio direito de propriedade, negam que este direito confere ao seu titular a faculdade de dispor dos seus bens para o tempo que seguirá a sua morte: se a relação que une o assunto e o objeto de um direito, não cessa necessariamente à morte do sujeito, porque cessar com o desaparecimento do objeto? As teses socialistas conduzem, assim, pelo menos no plano teórico, a negar a possibilidade da herança, e, por conseguinte, atribuir ao Estado os bens que compõem o patrimônio do de cujus: o Estado o toma em virtude de um direito real, fundado sobre os interesses da comunidade ao prejuízo da qual estes bens foram adquiridos.(Mazeaud et Mazeaud, 1963, p.534); (TRABUCCHI, 1999, p.826).
Ausência de bases concretas para sustentar tal posição num passado recente a idéia de Estado perfeito, nada mais era que pura utopia. Na Rússia, o direito sucessório foi extirpado da legislação civil por força de um decreto baixado em abril de 1918, independente de ser sucessão legal ou sucessão testamentária.
O governo russo determinou quantias máximas e mínimas para a sucessão, vez que o referido decreto não teve aplicação sistemática, tendo, inclusive, flexibilizado a sucessão aberta no mesmo grupo familiar, que passaria a ser regida por lei anterior à Revolução.
- Com a vitória do bolchevismo, na Rússia, e derrota do menchevismo, com seu cunho acentuadamente socialista um dos primeiros atos do governo revolucionário foi a abolição da herança.
- Talvez tenha sido esta a causa principal do desestímulo da atividade laborativa do povo russo, a par da absorção, pelo Estado, da maior parte da produção agrícola-pastoril que se seguiu ao ano de 1918, quando a Rússia abarrotou o mercado do mundo com víveres de toda a espécie.
Foi uma explosão emocional de liberdade ilusória e privatização de riqueza que durou pouco. No ano seguinte (1919), a produção caiu verticalmente, ante o desestímulo que dominou a classe trabalhadora. (MIRANDA, 1986, p.612). A posição adotada pelo outrora direito soviético nos traz a idéia de que não podemos ignorar o direito sucessório, pois clara é a sua ligação íntima com a propriedade particular, haja vista que esta é complementada por aquele.
- Não há por que ignorar o direito à herança, pois, mesmo na antiga URSS, o comunismo baixou a guarda diante de uma nada animadora vivência.
- Como bem disse Carlos Maximiliano (1942, p.33), “a realidade é a mais implacável arrasadora das utopias”.
- Fundamento de ordem patrimonial e familiar: O segundo fundamento do Direito das Sucessões é o que defende a idéia de mantença do patrimônio no mesmo grupo familiar.
Como visto, a família sofria as influências de elementos morais e religiosos, sendo relevante para configurar e sustentar a idéia de transmissão da propriedade dos pais para os filhos, quando a propriedade passou a ter sua transmissão como verdadeira praxe e a ser vista como costume social, já que as mais remotas civilizações reconheciam o direito de herança dos filhos.
A propriedade corporificou, assim, a idéia de sucessão hereditária como um poderoso fator da perpetuidade da família, pelo cumprimento do culto dos antepassados, traduzido nas cerimônias e nos sacrifícios em honra dos mortos, de modo que se não pudesse adquirir a propriedade sem o culto, nem este sem aquela.
(ITABAIANA DE OLIVEIRA, 1952, p.47). Na origem da propriedade está afinal o trabalho, um esforço maior ou menor, que a legitima e a torna conforme com o direito natural e mesmo uma imposição sua. (TELLES, 1991, p.263). Desta lição nos vem a idéia de que não haveria por que uma determinada família trabalhar para constituir um patrimônio e depois não deixá-los a seus sucessores.
- Decerto, a transmissão dos bens pelo evento mortis se manterá como um incentivo à economia e ao labor, não havendo razão para adotar, em algum momento, a teoria defendida pelos soviéticos.
- O fundamento da sucessão por ordem patrimonial familiar se dá pelo facto de a propriedade continuar a ser, ainda hoje, largamente familiar: usufruída (quando não constituída) pelo conjunto de familiares mais próximos; que têm, assim, uma expectativa de recebê-la por morte do seu titular (formal) (CAMPOS, 1997, p.446).
A herança cumpre de certa forma, uma função familiar, vez que pode ser entendida como uma modalidade de execução de um dever dos pais de garantir, materialmente, sua prole. A idéia mais antiga que explica o direito das sucessões é que a propriedade tem um caráter familiar.
- O chefe da família exerce os direitos da comunidade familiar.
- À sua morte, é substituído por um dos membros da família, que se torna o chefe.
- O herdeiro toma o lugar do defunto, assegurando o culto privado e manutenção do grupo.
- PLANIOL, 1946, p.473) “A matéria da sucessão causa mortis está estritamente aos temas da propriedade e,, da família.
É certo que o problema da continuidade das relações jurídicas, que é o que se põe como o essencial para solucionar quando ocorre o falecimento de uma pessoa, em termos abstratos pode ser solucionado sem a referencia à propriedade ou à família: poderia se dispor a transferência dos bens vacantes à coletividade, que poderia reter-los como tal, ou deferi-los à outros particulares, sem nenhuma relação de parentesco com aquele que determinou a sucessão.
- Mas tal solução não corresponde como a tradição histórica, que é bem outra, e com seguranças é amparada por atuais ditames constitucionais,,
- LÓPEZ Y LÓPEZ, 1999, pp.28-29) A teoria socialista é utópica e insensata, pois visava, tão somente, acabar com as heranças, o que resultaria numa fonte de inúmeras injustiças, contrárias ao interesse social.
Fundamento de ordem econômica e social: Defendido pela doutrina francesa de Michel Grimaldi (1989, pp.25-26), o fundamento econômico reveste-se de grande interesse social, distinguido-se dos demais por sua natureza patrimonial, vez que a sucessão privada encoraja o espírito de empreendimento e favorece o progresso econômico.
Certo é que não se pode imprimir a este fundamento outro caráter senão o que tenha fundo econômico. O instituto da sucessão é o complemento necessário do direito de propriedade, conjugado, ou não, com o direito de família. Este último é invocado pela lei, ora para conter em justos limites o exercício do direito de testar, ora para suprir a ausência de vontade do proprietário, de harmonia com os seus sentimentos e instintos naturais e normais.
Propriedade que se extingue com a morte do seu titular e não se transmite ao seu sucessor, por sua vontade expressa ou presumida pela lei, não é propriedade; é usufruto vitalício. (CUNHA GONÇALVES, p.601). Percebe-se, assim, que a finalidade de se manter na família o valor de determinada propriedade nada mais é do que evitar que um pai deixe seu filho numa condição financeira prejudicada ou insuficiente para manter sua subsistência ou a de sua família.
A busca pela retenção das riquezas não é novidade. Desde o início de sua história, o direito das sucessões teve traços familiares, políticos e, principalmente, econômicos, traços estes que serviram de base para diversas codificações civis ao longo do tempo e em diversas nações. a solução adotada pelo legislador civil de manutenção do patrimônio na família do de cujus pode até ser considerada, porém é inegavelmente um meio satisfatório de se permitir aos integrantes da família enlutada de prosseguir com os propósitos para os quais tal patrimônio foi constituído, com a percepção das necessidades dos sucessores.
(LISBOA, 2006, p.426). Há uma forte e consistente tendência à constitucionalização do direito sucessório. Não pairam dúvidas de que, nos termos do artigo 5º, XXX da CF/88, a herança passou a ter proteção constitucional, devendo atingir a sua finalidade: garantir aos legitimados para suceder o direito de perceber aquilo que lhes é justo.
- A ordem social e econômica nos tempos atuais favorece e corrobora tudo aquilo que tratamos até aqui, haja vista que, sem sombra de dúvidas, não se pode negar a existência, ainda que remota, dos fundamentos expostos e de suas influências para chegarmos ao atual contexto.
- Referências bibliográficas: BEVILAQUA, Clovis.
Direito das successões, Bahia: Livraria Magalhães, 1899. CAHALI, Francisco José; HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes, Curso avançado de direito civil : direito das sucessões.2. ed. rev. e atual. de acordo com o novo código civil. Coordenador Everaldo Cambler.
São Paulo: RT, 2003. CAMPOS, Diogo Leite de. Lições de direito de família e das sucessões,2. ed. rev. e actual. Belo Horizonte: Del Rey, 1997. CUNHA GONÇALVES, Luiz da. Tratado de direito civil em comentário ao código civil português,2. ed. atual. e aum. e 1. ed. brasileira. Adaptação ao direito brasileiro completada sob a supervisão dos Ministros Orozimbo Nonato, Laudo de Camargo e prof.
Vicente Ráo. São Paulo: Max Limonad.v.9, tomo 2. DUGUIT, Léon. Les transformations générales du droit privé depuis le code napoleon, Deuxième édition reuve. Paris: Librairie Félix Alcan, 1920. GRIMALDI, Michel. Droit civil: successions. Paris: Éditions Litec, 1989.
- ITABAIANA DE OLIVEIRA, Arthur Vasco.
- Tratado de direito das sucessões,4. ed. rev. e atual.
- Pelo autor com a colaboração de Aires Itabaiana de Oliveira.
- São Paulo: Max Limonad, 1952.v.1.
- LACRUZ, José Luis; ALBALADEJO, Manuel.
- Tratado teórico-práctico de derecho civil: Derecho de sucesiones – parte general.
- Barcelona: Libreria Bosch, 1961.
vol.1, tomo 5. LISBOA, Roberto Senise. Manual de direito civil : direito de família e das sucessões.4. ed. rev. e atual. São Paulo: RT, 2006.v.5. LÓPEZ Y LÓPEZ, A.M. La sucesión em general in Derecho Civil (V) – Derecho de Sucesiones. Coordenador F. Capilla Roncero.
- Valencia: Tirant lo Blanch, 1999.
- MAXIMILIANO, Carlos.
- Direito das sucessões,2. ed.
- Rio de Janeiro: Livraria Freitas Bastos, 1942.v.1.
- MAZEAUD, Henri et Leon; MAZEAUD, Jean.
- Leçons de droit civil : regimes matrimoniaux, successions et libéralités.
- Nouvelle licence.
- Quatrième année.
- Paris: Éditions Montchrestien, 1963.v.4.
MIRANDA, Darcy Arruda. Anotações ao código civil brasileiro, São Paulo: Saraiva, 1986.v.3. PLANIOL, Marcel. Traité élémentaire de droit civil. Édition nouvelle refondue par Georges Ripert et Jean Boulanger. Deuxième Édition. Tome Troisième. Paris: Librairie Générale de Jurisprudence, 1946.
TELLES, Inocêncio Galvão. Direito das sucessões : noções fundamentais.6. ed. rev. e actual. Coimbra: Coimbra Editora, 1991. TRABUCCHI, Alberto. Istituzioni di diritto civile, Trentesima nona edizione aggiornata con le riforme e la giurisprudenza. Padova: CEDAM, 1999. Thiago Felipe Vargas Simões é sócio do IBDFAM, advogado, especialista em Direito Privado pela Univila/ES, mestre em Direito Civil pela PUC/SP e doutorando em Direito Civil pela PUC/SP.
Contato: [email protected] – Home Page: http://www.tfvsimoes.site.adv.br/ Os artigos assinados aqui publicados são inteiramente de responsabilidade de seus autores e não expressam posicionamento institucional do IBDFAM
Ver resposta completa